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25 DE MAIO DE 1985

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levantar suspeitas sobre a vontade e a coerência das pessoas quando trabalham para uma nação e para uma sociedade. Há sempre vontades diferentes e maneiras diferentes de se fazerem as coisas. Contudo, antes ou depois do 25 dc Abril, a verdade é que nós transmitimos uma cultura diferente, mais aberta e mais modema, que de certa forma foi feita sobre aquela espada pendente, que ao fim e ao cabo pode representar o fim da própria cultura ocidental.

Julgo que não nos devemos esquecer disto e que não nos podemos esquecer de muito da nossa cultura, seja ela a que suporta todo o sistema económico, seja qualquer outra. Toda essa cultura pode estar a ruir e hoje só nós, mesmo em Portugal, com ou sem «terceira vaga», podemos edificar ou dar expressão a uma cultura que potencialmente já cabe em nós próprios.

Aplausos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. António E!oy, representante dos Amigos da Terra.

O Sr. António EIoy (Amigos da Terra — Associação Portuguesa de Ecologistas): — Eu estava distraído e, como me parece que os painéis seguintes propiciam um pouco ultrapassar um certo vício que se voltará a gerar a partir da última intervenção, gostaria apenas de contar uma pequena história que li ontem. Pergunta um estudante ao sábio: «Onde está a verdade?» O sábio responde: «Nas sementes de bambu!»

De facto, a verdade não é aquilo que pode resultar aqui dos nossos discursos e da memoração da realidade. A verdade temos nós que encontrar em respostas concretas aos nossos problemas concretos.

Se esta Conferência é mais uma conferência para que a Assembleia da República desfaça o seu ego e participe no Ano Internacional da Juventude —que por grande amabilidade as Nações Unidas instituíram este ano — e se vai continuar a ser uma forma de os futuros deputados começarem a treinar-se para a sua futura representação, é evidente que vai continuar a haver muito pouco sumo. Eles estarão lá daqui a uns anos e, nessa altura, a sociedade portuguesa não terá mudado nada, porque se continuou a evitar a realidade e as respostas aos problemas.

Como, segundo suponho, há poucas mais inscrições sobre este painel — que, aliás, é aquele que favorece estes discursos sem nenhum substracto, é uma expressão agora na moda—, não diria perfeitamente nada, esperando que, ao entrarmos nos temas concretos possamos começar a equacionar um pouco a nossa realidade, a dar um pouco a nossa participação e a nossa resposta aos problemas e a sair de um certo beco a que, ao fim e ao cabo, esta Conferência se arrisca a chegar, se for mais uma conferência não «para inglês ver», mas sim para o público, que depois lerá os relatos desta Conferência através da informação que a Assembleia da República lhe vier a dar. Parece-me que há que discutir problemas concretos e evitar discursos abstractos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Carlos José, da Juventude Comunista Portuguesa.

O Sr. Carlos José (Juventude Comunista Portuguesa):— Vou aproveitar esta oportunidade para di-

zer algumas coisas sobre este painel que penso serem importantes.

De certeza que discutir os problemas da juventude e a sua actual situação em Portugal não é um tema agradável, porque os problemas são muitos e a vontade dos responsáveis em os resolver pouca ou nenhuma. Discutir os problemas e as situações é analisadas e estudá-las, o que implica necessariamente a definição das suas causas. Certamente que a juventude e os jovens pouco retirarão de um conjunto de intervenções em que se fazem grandes discursos, muito intelectuais e com muitas citações de gente muito ilustre — às tantas, as citações começam a contradizer-se com as próprias intervenções (mas isso é outra história) —, mas que, de facto, nada têm que ver com o concreto.

Ora, o concreto e o real é efectivamente a situação actual da juventude e o que é que as pessoas pensam sobre os milhares de jovens que têm salários em atraso, os milhares de jovens que estão numa situação dificílima por não terem emprego e os milhares de jovens que são obrigados a abandonar os seus estudos, quando lá chegam, por não terem condições para estudar. Estes é que são, de facto, os problemas concretos, aos quais não podemos fugir.

Quando se discute a situação da juventude, convém não mandar frases para o ar e dizer que é o choque do passado com o futuro, que vem aí a «terceira vaga» e que nos temos de preparar, porque isso não resolve nada, não adianta nada para o assunto. Das duas uma: ou bem queremos debater a situação da juventude — e estranha-me imenso que duas ou três intervenções já tenham dito que este ponto da situação da juventude é uma coisa sem interesse, que não é muito concreto, que devíamos passar para o próximo, que é mais concreto.

Ora, dizer que a situação da juventude de hoje e os seus problemas não é um assunto concreto, não é algo para se discutir, é algo complicado. £ já qrs muita gente acha que aqui está reunida a elite, a nata da juventude portuguesa, eu diria que é complicado que essa mesma elite e essa mesma nata tenham esses pensamentos.

Ainda ligado com isto queria só dizer mais uma coisa: foi aqui dito que a grande aposta da juventude é a participação e que a juventude deve particip?.? mais, mas que o poder repele os jovens. E nós perguntamos: mas que poder e que jovens? É que o poder não repele ao que parece alguns jovens que trabalham junto dos ministros que temos a fabricar as medidas contra as quais os jovens lutam lá fora. O poder não repele muitos jovens como os dirigentes de algumas organizações políticas que aqui estão representadas e que trabalham no Ministério da Educação, por exemplo, a fabricar os aumentos de preços das cantinas e a continuar a deixar que se mantenha a situação das bolsas de estudo tal como ela está. O poder não repele esses jovens. O poder — que, note-se, não é nada abstracto, não é uma entidade metafísica, mas sim um governo muito concreto, com uma política muito clara e muito bem definida — repele, isso sim, muitos jovens que no seu dia-a-dia, nas asscc':£-ções de estudantes, nas comissões de trabalhadores, nos sindicatos, apresentam propostas concretas para resolver os problemas e avançam com medidas reais para a sua solução.