O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3042

II SÉRIE — NÚMERO 93

e o pleno desenvolvimento cultural da pessoa. Esta é o sujeito e o beneficiário do processo educativo.

A esta perspectiva, consagrada, aliás, na Declaração Universal dos Direitos do Homem, na Convenção Europeia dos Direitos do Homem e na Constituição Portuguesa de 1976, é essencial o papel da liberdade de ensino, pois que só em liberdade se educa verdadeiramente e só em liberdade é possível preparar os cidadãos para as escolhas conscientes que se lhes irão deparando à medida que for avançando a sua integração social.

O objectivo do processo educativo, neste nosso entendimento personalista, é o de preparar cada homem para, de acordo com as suas aptidões e vocações, assumir na sociedade o lugar em que mais realizado se sinta e, portanto, em que mais útil possa ser. Por outras palavras, pretende-se potenciar nos indivíduos um desenvolvimento educacional bastante ao cumprimento cabal das responsabilidades perante a sociedade em que se insere.

Um sistema de ensino válido e livre não pode reduzir-se a uma definição em função das unidades produzidas anualmente. Não se trata de um mero investimento reprodutivo do Estado, mas de um investimento humano de toda a comunidade nacional que, deste modo, está a assegurar a sua própria sobrevivência e afirmação como sociedade poltíica independente. A educação não pode ser vista como uma função administrativa do Estado, um objectivo macroeconómico do plano, como a concebe o colectivismo marxista. Antes significa um pólo fundamental de formação e exigência, uma via insubstituível da realização do indivíduo.

A «Educação como estratégia de desenvolvimento» é a outra dimensão em que se concebe o fenómeno educativo.

O sector da educação é, em qualquer sociedade que aspire aos mínimos de civilização, uma preocupação fundamental. Essa preocupação, porém, deve ser posterior à definição de objectivos mais vastos de realização nacional. No fundo é do projecto de desenvolvimento que se trata. Este projecto enuncia as notas sociais, aponta os caminhos, fornece uma imagem do tipo de homem que há-de vir a resultar da organização da vida em sociedade.

Existirá em Portugal, ao nível dos centros de decisão, uma noção clara do modelo de desenvolvimento que o sistema educativo há-de servir? Alguém se preocupou já em definir e pôr em prática um tipo de ensino que prepare os jovens para serem sujeitos aptos, na sua criatividade individual e na sua formação cultural, cívica e técnica, das transformações estruturais de que a sociedade portuguesa carece? A resposta é óbvia e triste.

£, pois, natural que a educação seja presentemente um sector secundarizado, perigosamente secundarizado, e desprezado em Portugal. Só assim se explica que um modesto capitão com formação de caserna tenha sido Ministro da Educação após o 25 de Abril! Pobre educação! E por falar em Abril, não deixa de ser igualmente sintomático que a Revolução, não obstante os abundantes deleites teóricos realizados, não tenha ainda rido sequer um assomo de projecto educativo global. Acontece até que o que se tem passado é que o nosso sistema educativo tem vivido no estado patológico das experiências pedagógicas, numa interpretação delirante de um decreto-lei do regime anterior, o Decreto-Lei n.° 47 587, de 10 de Março de 1967.

Seja qual for a perspectiva que se tome da educação, das duas que expusemos, a conclusão a que chegamos é a de que o nosso sistema educativo está em estado de falência pedagógica, exaurido das medidas sectoriais que retalharam e irracionalizaram um sistema que, ainda que defeituoso e limitado, existia à data da Revolução de Abril.

Ocorre inclusivamente que a escola é hoje pasto dos vícios genericamente apontados à sociedade e ao actual homem português. A vida nas escolas coarcta a criatividade, favorece o parasitismo, encoraja o desleixo, alimenta o expediente, dá alento ao desinteresse, quando não constitui um amplo e lamentável mostruário de originalidades e habilidades que, quando adultas, vão explicar pela origem a corrupção e a marginalidade.

£ nossa convicção de que a causa profunda do atraso do nosso país se encontra na educação. E que enquanto não se resolver o problema educativo não será possível responder ao desafio do desenvolvimento que temos de cumprir.

Não é difícil comprovar o que acabamos de afirmar, com alguns esclarecedores números. Se registarmos a evolução do analfabetismo no nosso pais, veremos que em 1900 ele era de 75 %, em 1960, de 32 % e hoje estamos nos 20 %. Na CEE, para onde formalmente entraremos no próximo ano, não existe analfabetismo.

Vejamos agora o que se gasta em Portugal com a educação. Em 1985, as despesas orçamentais com a educação representam 4,5 % do PNB, isto é, a terça--parte do que gasta a França, a metade do que gasta a Holanda e exactamente o mesmo que gastam a Nicarágua e o Omã.

Por outro lado, está-se a dar um preocupante recrudescimento da fuga à escolarização. Só no ano lectivo de 1982-1983, dos 170 000 alunos inscritos no ensino primário, 20 000 não se inscreveram no ciclo preparatório, não cumprindo sequer a escolaridade obrigatória de 6 anos. Esta fuga e outras, noutras fases do sistema, além de pronunciarem o agravamento das condições económicas das famílias, demonstram a descrença no sistema educativo e a inutilidade para que conduz os jovens, sejam os que ficam à porta da universidade — e o ano passado foram 12 000— sejam os que entram e não encontram forma posterior de aplicarem e valerem-se da formação superior recebida.

Muitos números poderíamos fornecer para ilustrar o caos. A situação é de tal modo que medidas isoladas que porventura se tomem, e em si úteis, trarão consigo o agravamento do sistema, pois que serão absorvidas pelas suas deformações e vícios, ao invés de os dominarem e extirparem.

Em nossa opinião, a resolução estrutural da crise, o rasgar de horizontes de futuro ao País e à sua juventude, não pode assentar senão numa reforma educativa global, assente num projecto coerente, que parta da realidade nacional e das necessidades que se perfilam. Mais do que uma simples estratégia de desenvolvimento, a educação é a garantia do futuro. Não podemos nós continuar a viver da última reforma global ensaiada e cuja aplicação o 25 de Abril de 1974 veio interromper.

Da análise que fazemos da situação actual afigu-ram-se-nos fundamentais algumas medidas, que quanto mais demorarem mais difícil tomarão a recuperação nacional.

A primeira é para nós óbvia de há muito tempo a esta parte: qualquer projecto nacional de mudançe e