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29 DE MAIO DE 1985

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Nota1 Justificativa

1 — É firme intencionalidade do actual governo, logo declarada no Programa que apresentou à Assembleia da República, promover acções de combate ao crime e de reforço da segurança dos cidadãos. Entre essas acções contár-se-ão as que dizem respeito à revisão da legislação penal. Na verdade, e como logo se reconheceu no Programa do Governo, «a recente publicação do novo Código Penal vem exigir que se sigam atentamente estes primeiros momentos da sua aplicação, de modo a introduzir-lhe modificações e fazer as correcções que a experiência revelar aconselháveis, para além das que já de facto aconselhou».

2 — O grupo de trabalho constituído por despacho ministerial de 21 de Fevereiro de 1984 para proceder, em sede de preparação legislativa, à revisão do Código concluiu já o projecto respeitante à parte geral, estando em curso os trabalhos de revisão da parte especial.

Afigura-se, no entanto, de bom aviso que o Governo apresente, desde já, uma proposta de lei de autorização legislativa para revisão do Código Penal e legislação penal secundária.

Com efeito, mesmo numa estimativa prudencial, é de supor que até fins de Junho estará concluída, em sede de preparação legislativa, a revisão da parte especial. Ao admitir-se este prazo, aparentemente excessivo, está-se a pensar que tal revisão não pressupõe apenas meras correcções técnicas, mas, nalguns casos, a tomada de significativas opções de política legislativa.

3 — Importa considerar, não obstante, a conveniência da entrada em vigor, simultânea, do Código Penal revisto e do futuro Código de Processo Penal. Para além de se eliminarem os inconvenientes verificados quando da entrada em vigor do Código, desacompanhado de uma profunda revisão da lei do processo criminal, inconvenientes que só o Decreto-Lei n.° 402/ 82, de 23 de Setembro, logrou, em parte, atenuar, haveria a inestimável vantagem de uma concordância o mais perfeita possível entre as disposições de direito material e de direito adjectivo, em muitos casos difíceis de delimitar com rigor.

Aliás, várias soluções que se propõem, em sede de revisão da parte geral, implicam a necessidade de uma perfeita coordenação com o Código de Processo Penal em preparação, dada a interpenetração daquelas da disciplina que vier a ser consagrada neste.

Por isso se afigura que, sem prejuízo de os 2 diplomas serem publicados até 1 de Outubro de 1985, deverá prever-se uma vacatio legis que aponte para a sua entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1986, com o que se proporcionaria um prazo razoável de estudo aos interessados na sua interpretação e aplicação.

4 — A proposta de lei de autorização legislativa poderá ser acompanhada do projecto de revisão da parte geral e fundamentada, no tocante à parte especial, com a indicação dos critérios e orientações que vão presidir à revisão desta.

Na fase actual dos trabalhos já é possível explicitar as orientações e critérios que devem presidir à reforma da parte especial.

5 — O Código, não obstante as profundas inovações que introduziu no sistema jurídico-penal poruguês, foi recebido com benévola expectativa e a leitura da já muito abundante jurisprudência publicada não motiva

convicção no sentido da existência de deficiências insolúveis. Por outro lado, não parece lícito imputar, sem mais, às soluções nele consagradas (v. g. o seu alinhamento pelos movimentos desoriminalizadoresc além do abrandamento da dureza das penas privativas de Uberdade e da consagração de várias medidas não detentivas numa linha de política criminal de luta contra a pena de prisão) uma influência directa na expansão da criminalidade, nomeadamente de certas formas de criminalidade violenta e organizada.

Faltam, aliás, bases científicas para o estabelecimento de uma relação causal entre a publicação do Código (em 1982) e a criminalidade registada, como faltam até dados seguros para avaliar, quantitativa e qualitativamente, a expressão desta mesma criminalidade.

A ideia de um aumento sensível do número de crimes e de uma multiplicação alarmante de crimes violentos ou praticados por bandos organizados é frequentemente inculcada pelos meios de comunicação social, para quem o fenómeno crime constitui tema favorito da notícia.

Mas está por provar que o eventual aumento da criminalidade e ou o agravamento das suas formas estejam relacionadas com pretensa debilidade da lei punitiva.

Países onde o sistema punitivo é bem diferente do nosso (Espanha, França, Itália, por exemplo) preocupam-se igualmente com a criminalidade violenta e não é vulgar ver aí defender a ideia de que o combate à mesma passe especificamente pelo agravamento do arsenal repressivo.

Aliás, entre nós, notícias recentemente publicadas sobre a população prisional, se alguma ilação permitem é precisamente no sentido de que o sistema funcionou e funciona numa área em que o legislador talvez tivesse desejado que funcionasse menos: a do recurso à pena de prisão.

A universalidade do fenómeno mostra, enfim, que o sistema penal, só por si, não tem virtualidades para contrariar definitivamente o surto de criminalidade que coincide com épocas de regressão económica.

Agir sobre as causas gerais da criminalidade é tarefa que só em parte cabe ao direito penal. E mesmo naquele campo específico em que actuam as suas possibilidades de prevenção é, no fundo, o medo de ser descoberto e rapidamente julgado e sancionado (la peur du gendarme) que contém o delinquente potencial no momento da passagem ao acto.

Nesta ordem de ideias, não se afigura adequado nem racional propor um agravamento sensível e generalizado das penas.

O que não quer dizer que não possam e devam ser corrigidas certas assimetrias da parte especial, nomeadamente quanto a alguns casos em que se sobrevalorizou a punição de crimes contra o património em confronto com a de alguns crimes graves contra as pessoas. Bem como devem ser corrigidas certas penas excessivamente brandas — e, por conseguinte, desproporcionadas— relativamente a comportamentos graves e perigosos, capazes de produzirem danos incomensuráveis.

Por fim, além de injustificado, o retorno à severidade e ao correccionalismo, com pretexto em necessidades fundadas na realidade criminológica, prejudicaria naturalmente a «imagem» do Código Penal de 1982 nos meios cultos e científicos estrangeiros, onde