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II SÉRIE — NÚMERO 70

Prcocupa-mc o facto dc estarmos no cruzamento dc várias reformas c ao mesmo tempo no cruzamento dc várias curvas dc crise, crise dc penúria dc equipamento, dc funcionários, crise processual, crise dc acumulações, etc.

Será que esta reforma vai ajudar ou, pelo contrário, vai desajudar? Quanto a mim só pode c deve ajudar, porque — como alguém dizia — para pior já basta assim.

Em suma, a minha pergunta é a seguinte: por que é que os juízes dizem que estes preceitos, que os senhores propõem, tendem a criar, mesmo a nível dc 1.* instância, juízes de 1.* categoria, dc elite, dc coturnos c juízes menores do quadro geral? Por que é que dizem que há preceitos atentatórios da inamovibilidade dos juízes? Este aspecto ainda percebo, se pensarmos na comissão dc serviço, nos termos cm que vem proposta — aliás, ao que parece, já sofreu várias correcções; o próprio Sr. Vicc-Prcsidcntc do Conselho Superior da Magistratura alvitrou-nos ontem uma correcção que parece reunir consenso dc outros sectores, incluindo o dos proponentes. Quer dizer, a proposta já nüo é estática, pois já nos surge aqui glosada c alterada.

Pergunto, pois, como vê o impacte disto na magistratura. Será que sente alguma apreensão cm rclaçüo à maneira como os juízes portugueses sc dividirão face aos mecanismos que aqui csião previstos? É que nüo tenho qualquer dúvida dc que haverá logo di visüo entre aqueles que cstüo no continente c os que estâo nas regiões autónomas. E nüo mc parece que essa divisão seja boa, porque daí resultará a aplicação dc regimes jurídicos diferentes, visto que estarão sujeitos a orgânicas diferentes, o que também não mc parece bom, para além das especificidades que as regiões exigem.

Dc facto, tinha grande empenhamento cm ser esclarecido neste aspecto.

O Sr. Dr. Gonçalves da Costa: — Vou começar pelo fim, falando da divisão que resultaria da aplicação desta reforma c confrontando as reacções dos juízes que estão nas regiões autónomas com as dos juízes que estão no continente.

O modelo adoptado, que seria a tal ossatura válida para lodo o País, seria impraticável, por exemplo, nos Açores, mas acontece que o modelo aí praticável, que é o modelo actual do País, já não serve. Só servia nos Açores, porque não era possível outra solução.

O tribunal colectivo que temos hoje, sobretudo a nível dc província, funciona mal c está condenado. O juiz dc círculo já muilo dificilmente responde às exigências do cargo que tem dc desempenhar. Está assoberbado dc trabalho c perde imenso tempo nas deslocações.

O juiz da comarca vizinha ou do oulro juízo vê lambem muito prejudicado o rendimento do seu trabalho pela permanência durante longo tempo cm colectivos. Portanto, este sistema não dá resultado.

Sc nos deslocarmos aos grandes centros — c o caso dc Lisboa — c sc pensarmos nos juízes dos tribunais criminais, temos dc concluir que o sistema já falhou. É certo que sc podia pensar num alargamento dc quadros, mas um juízo criminal já não dá vazão a mais dc um terço dos processos que recebe. Depois, implica o sacrifício, durante, num mínimo, duas tardes por semana, dc dois juízes que csülo vocacionados para o julgamento cm singular c que nem sequer vêem classificado o trabalho que desenvolvem no colectivo. Por tudo islo, linha dc sc pensar num oulro modelo dc colectivo c esse modelo, para os dias dc hoje, c que fosse capaz dc dar uma resposta rápida c cabal a questões mais difíceis, só podia ser um colectivo constituído por juízes «rodados» —pcrmilam-mc o termo—, que já deram provas. Daí que, por este ângulo, considere

csic modelo defensável. O único inconveniente que lhe vejo — aliás, à partida tive alguma resistência justamente por ponderar este aspecto— é o da incomodidade para as populações. Mas, sc virmos bem, veremos que há comarcas onde sc tem dc percorrer distâncias bem maiores do que as que, cm geral, terão dc ser percorridas para as pessoas sc deslocarem à sede do tribunal dc círculo.

Quanto à reacção da classe, não sei sc essa reacção, a que o Sr. Deputado José Magalhães sc referiu, pode ser considerada como reacção da magistratura judicial.

Tem havido certa movimentação e algumas reuniões no Norte, no Sul, por vezes dc grupos bem pequenos — ainda há dias houve uma rcuniüo cm Santiago do Cacém que terá reunido no máximo um dúzia dc juízes. Apresentam um texto que, para quem o ler, fica a sensação dc que houve ali uma grande concentração dc magistrados c que sc formaram grupos dc trabalho. Não estou aqui a fazer um processo dc intenção, mas esse texto traduz fundamentalmente a preocupação dc dois ou três juízes que foram os anfitriões. Acontece que tenho discutido com muitos colegas — aliás, como sou membro do Conselho, vem ler comigo c, dc algum modo, vào-mc responsabilizando por saberem que fiz paric deste grupo — c, pelo menos, dc entre aqueles que mc parecem melhor ler ponderado a questão, colho a ideia dc que progressivamente sc foram predispondo a aceitar este modelo que o grupo dc trabalho acabou dc desenhar no projecto da proposta. Ouvi alvitrar muitas vezes uma outra solução — é curioso que já ninguém aceita, pelo menos, convictamente o modelo actual — que seria a dupla corregedoria, mas esse tem o enorme dcfciio dc, quando os dois juízes dc círculo sc emendem, impor a lodo um círculo uma dada jurisprudência, já que os outros juízes estão vencidos à partida.

Tem não só este grande inconveniente, como tem também o inconveniente dos custos da deslocação permanente dc dois juízes com ajudas dc custo, despesas dc transporte, etc, c o da subalternização sistemática do juiz do processo, que será normalmente um juiz mais novo, que estará numa comarca cm que funcionará como juiz singular.

Por conseguinte, parece-me que o modelo aclual não serve, a dupla corregedoria tem o gravíssimo defeito que aponlci c, progressivamente, vejo as pessoas que mais sc têm debruçado sobre o problema a mostrarem preferência por csic outro modelo do tribunal dc círculo com juízes privativos.

Claro que há aqui na proposta dc lei certas normas redigidas dc forma menos feliz, que poderão dar lugar a dúvidas como aquela que o Sr. Deputado Andrade Pereira colocou. No entanto, devo dizer que no projecto do grupo dc trabalho quem preside é o juiz do processo, ou seja, o juiz que melhor conhece o processo, tal como hoje acontece no juízo cível ou no juízo criminal.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Dcpuuido Armando Lopes.

O sr. Armando Lopes (PS): — Sr. Presidente, cu iaml)cm quero exprimir as minhas preocupações pelo estado dc espírito cm que ficarão os juízes desic país quando sc aperceberem — c com certeza já sc aperceberam — da situação cm que vão ficar com a entrada cm vigor deste diploma. Digo isto porque os juízes que sc encontram nos acluais tribunais dc comarca julgavam até agora ludo o que aparecia, mas agora vão ter que julgar causas que entram, digamos, por baixo c por cima, ou seja, entram por baixo as causas que vão ser atribuídas aos tribunais dc pequenas causas c entram por cima as qucrcJas c as acções ordinárias.