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II SÉRIE — NÚMERO 82

O artigo 2.0, alínea s), ao admitir como princípio que a entidade empregadora possa suspender a prestação de trabalho do trabalhador despedido, apesar de haver decisão judicial de suspensão do despedimento, proferida em providência cautelar, além de parecer violar a salvaguarda do direito ao trabalho previsto no artigo 59.° da Constituição, afigura-se que contende com o disposto no artigo 210.°, n.° 2, segundo o qual «as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades».

2 — Em obediência ao disposto no artigo 54.° da Lei n.° 28/82, foi o Presidente da Assembleia da República notificado para os efeitos ali consignados, havendo, na sequência de tal comunicação, oferecido o merecimento dos autos e juntado, simultaneamente, um parecer da Auditoria Jurídica da Assembleia da República, no qual se conclui no sentido de as normas contestadas no pedido não ofenderem qualquer princípio ou norma constitucional.

3 — Antes de partir ao encontro das diversas questões postas no requerimento do Presidente da República ou de outras que, porventura, por força do mesmo requerimento, o T. Const. possa ou deva vir a conhecer, importa deixar traçadas as grandes linhas que pautaram nos últimos anos, em especial no quadro normativo posterior ao 25 de Abril, a evolução do regime jurídico relativo à cessação do contrato individual de trabalho, em ordem a poder alcançar-se um mais fácil visionamento das matérias sob sindicância.

Vejamos então.

A Lei n.° 1952, de 10 de Março de 1937, pode considerar-se como o primeiro diploma que, de modo sistemático, procedeu à regulamentação jurídica do contrato individual de trabalho.

Em conformidade com as suas prescrições, para além da caducidade e do acordo mútuo, podia o contrato terminar por denúncia unilateral de qualquer das contratantes, independentemente da alegação de justa causa e com aviso prévio (artigo 10.°), ou por denúncia ou rescisão com justa causa a apreciar pelo juiz, considerando-se como tal «qualquer facto ou circunstância grave que torne prática e imediatamente impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe» (artigo 11.° e § único).

Os factos ou circunstâncias enumerados por este diploma como constitutivos de justa causa respeitavam a: 1) motivos pessoais da esfera do trabalhador, com ou sem natureza disciplinar; e a 2) causas objectivas alheias à pessoa do trabalhador.

O artigo 11.°, § único, n.° 3), reportando-se a esta última categoria, contemplava como tais a «falência ou insolvência civil, judicialmente verificadas, da entidade patronal ou a sua manifesta falta de recursos para promover a exploração comercial ou industrial».

Manteve-se esta lei em vigor até ao dia 23 de Setembro de 1966, data em que se iniciou a produção de efeitos do Decreto-Lei n.° 47 032, de 27 de Maio de 1966, que, na quase globalidade, aquela revogou.

O artigo 132.° deste diploma impunha a sua revisão obrigatória a efectuar até 31 de Dezembro de 1968, razão pela qual veio a ser publicado o Decreto-Lei n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969 (lei do contrato de trabalho), cuja disciplina muito se aproxima do texto legal que o antecedeu.

No domínio da cessação do contrato por iniciativa da entidade patronal, a lei do contrato de trabalho previa a rescisão, ocorrendo justa causa [artigos 98.°, alínea c), 101.°, 102.°, 104.°, 105.° e 106.°], denúncia com pré-aviso [artigos 98.°, alínea a), 107.° e 108.°] e decisão unilateral sem justa causa nem pré-aviso (artigos 98.°, n.° 2, e 109.°).

Na definição do artigo 101.°, n.° 2, constituía, em geral, justa causa «qualquer facto ou circunstância grave que torne praticamente impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe, nomeadamente a falta de cumprimento de deveres», podendo qualquer das partes, quando aquela se verificava, pôr imediatamente termo ao contrato (artigo 101.°, n.° 1).

Simplesmente, e apesar de a noção de justa causa da Lei n.° 1952 haver sido mantida, o certo é que se excluíram do seu âmbito as causas objectivas, reduzindo-se assim a justa causa de despedimento a factos ou circunstâncias graves da esfera do trabalhador (cf. artigos 102.°, 111.° e 114.°), e de entre estas apenas restando uma como susceptível de se considerar sem natureza disciplinar [a manifesta inaptidão do trabalhador para as funções ajustadas, referida na alínea cr) do artigo 102.°].

Entretando, o Decreto-Lei n.° 372-A/75, de 16 de Julho, «considerando a necessidade de rever o regime legal dos despedimentos, pondo-o de acordo com os mais legítimos anseios das organizações sindicais e da generalidade do povo trabalhador e considerando que esse regime deve ter em atenção o direito ao trabalho e ao emprego, rodeando o despedimento das cautelas necessárias para que ele não seja possível senão em condições muito especiais» (cf. o respectivo preâmbulo), veio trazer, na sequência aliás da nova ordem jurídico--política entretanto estabelecida, significativas alterações no domínio desta disciplina.

Em conformidade com o disposto no seu artigo 4.°, ficaram proibidos os despedimentos sem justa causa nem motivo atendível, definindo-se justa causa como «o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, constitua infracção disciplinar que não comporte a aplicação de outra sanção admitida por lei ou instrumento de regulamentação colectiva» (artigo 10.°, n.° 1) e motivo atendível como «o facto, situação ou circunstância objectiva, ligado à pessoa do trabalhador ou à empresa, que, dentro dos condicionalismos da empresa, torne contrária aos interesses desta e aos interesses globais da economia a manutenção da relação de trabalho» (artigo 14.°).

Este mesmo preceito, depois de estatuir que na apreciação da existência de motivo atendível deve ser sempre tida em conta a gravidade das consequências que para o trabalhador representa a perda do emprego, nomeadamente face às condições do mercado de trabalho e às características pessoais do trabalhador, elen-cava entre os motivos atendíveis «a necessidade de extinção do posto de trabalho e a manifesta inaptidão e impossibilidade de preparação do trabalhador para as modificações tecnológicas que afectem o posto de trabalho» [cf. artigo 14.°, n.° 3, alíneas a) e b)].

O diploma dedicava um capítulo à cessação do contrato individual de trabalho por despedimento com justa causa (capítulo iv) e um outro à cessação do con-