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26 DE OUTUBRO DE 1990

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tidamente; isto é, fugindo à tributação as médias e grandes fortunas, o pequeno volume arrecadado provém de estratos da muito baixa burguesia portuguesa, consolidando, também por esta via, uma indesejável fractura da nossa sociedade proveniente da inadequada posse da riqueza. Redistribui-se do meio em favor do topo, num imposto concebido para funcionar ao invés.

Uma expressão do que se afirma: o imposto sobre as sucessões e doações representava, em 1980, 4,157o das arrecadações dos impostos directos progressivos portugueses (ele próprio, o imposto profissional e o imposto complementar); em 1982 já representava apenas 3,227o. Na parte cada vez mais insignificante que se arrecada rareiam valores com algum significado.

5 — Nem como fontes de receitas nem como instrumentos de solidariedade e de justiça social estes impostos podem permanecer como se acham. À alternativa da sua suspensão, que não deveria excluir-se — até estarem reunidas condições mínimas —, parece oportuno sugerir a da sua reforma. Ao lado de todas as demais exigências de reformulação dos tributos directos nacionais, a sisa e o imposto sobre as sucessões e doações reclamam, outrossim, modificações urgentes e profundas em alguns pontos.

Apesar do aumento absoluto do número de transmissões mortis causa (200 000 em 1966 e 233 000 em 1980), o número das transmissões tributadas baixa (27 000 em 1966 e 20 000 em 1980). A percentagem das transmissões tributadas cai de 13,47o para 8,47o em 15 anos. Exprimindo o sentido da defesa pela fuga, só 3 7o a 47o do número das transmissões tributadas o são para descendentes (cerca de 7000 apenas, em 1980).

A estrutura das heranças é absurdamente distorcida: os prédios rústicos, de valor matricial sem significado, pesam em vários anos 37 7o a 387o (1972 a 1978); as partes sociais e quotas, que tanto valor relativo revestem na economia actual, representavam 14,57o em 1966 e 7,97o em 1980; nos anos 70 o dinheiro correspondia a 67o-77o. Os prédios, rústicos e urbanos, já atingiam globalmente 737o, valor impressionante quando se tenha presente a insignificância do valor oficial da propriedade rústica e a desvalorização da urbana, pela estabilidade dos valores matriciais e a política de congelamento de rendas; os imóveis valiosos são transferidos para sociedades anónimas familiares ou de simples administração de bens e, por isso, nem entram naquelas estatísticas.

A observação destes valores mostra uma evidentíssima fuga em tudo o que pode escapar com significativo valor económico, o dinheiro e as partes sociais.

6 — Em jeito de síntese poderá dizer-se que cinco grandes problemas afligem a prática relacionada com estes impostos: a simulação generalizada e escandalosa dos preços para efeitos de sisa; as sociedades, muitas vezes constituídas apenas como mecanismos destinados a evitar ou atenuar os custos de sisa e ou do imposto sobre as sucessões e doações; a fuga incontrolada do imposto sobre dinheiro e depósitos bancários; as demoras excessivas nas liquidações, em boa parte devidas à necessidade de apuramento dos valores das partes sociais.

Ninguém fica surpreendido, porque todos a conhecem, com a generalizada simulação de preços de venda de imóveis: as taxas muito exageradas da sisa (já atingiram 11,57o), incidentes sobre imóveis de valor muito alto, gerariam custos fiscais insuportáveis em muitos casos se fosse declarada a verdade. Procura-se, neste

projecto, eliminar as consequências da fraude por duas vias: taxas significativamente mais baixas e progressivas por escalões (37o, 5 7o e 77o) e abandono, para os prédios urbanos e os mistos, do preço declarado como base de incidência, bem como das matrizes e das avaliações: trata-se de uma mentira generalizada que desprestigia o Estado. A sua passividade pode ser interpretada como uma consciente e deplorável cumplicidade. Em substituição, adopta-se o valor padrão fixado anualmente, com natural prudência e realismo, pelo Governo, de acordo com autorização constante da Lei do Orçamento. Este valor sofre acomodações circunstanciais relacionadas com a qualidade, a antiguidade do imóvel e a sua localização. Para este último efeito, seria desejável que o Governo delimitasse por decreto-lei as áreas cujos parâmetros sócio-económicos justificassem a consideração de escalões de valor diferenciado. A fixação das áreas acima ditas deveria ter em conta a política do ordenamento do território, consubstanciada em planos devidamente aprovados. Deste modo, a sisa ganharia coerência global como instrumento quer de justiça tributária quer de política de ordenamento do território. A experiência que viesse a ser adquirida e a natural progressão dos planos de ordenamento do território possibilitariam acompanhar esta reforma de mecanismos administrativos que garantissem a sua revisão, aperfeiçoamento e adequação.

Sendo esta a via que se consideraria mais aperfeiçoada e, por isso, desejável, não a adoptamos, por agora. A situação prática do regime da sisa é de fraude cada vez mais acentuada, e mal ficaria ao Estado, em nome das óptimas soluções, que tardam, naturalmente, em chegar, que nada fizesse para melhorar já o regime aplicável. Nem se considera adequado esperar pelo valor patrimonial, que sairá (quando?) do Código das Avaliações, mas cuja capacidade de adaptação conjuntural é uma enorme incógnita; nem enveredar pela espera de planos de ordenamento do território. O que se propõe é de execução imediata e melhora profundamente a situação. Chama-se ainda a atenção para a possibilidade que o contribuinte terá, em circunstâncias excepcionais e fundamentadas, de reclamar, através do disposto no artigo 56.°, contra eventuais valores excessivos resultantes da aplicação do mecanismo exposto. É mais uma importante salvaguarda da justiça tributária visada pelo presente projecto.

A progressividade das taxas procura aproveitar a inequívoca revelação da capacidade contributiva por parte de quem pode comprar prédios urbanos de elevado valor e nunca se excede, repete-se, os 77o, e para todos os casos. Da maior relevância ainda o regime especial para os imóveis exclusiva e estavelmente afectos a actividades produtivas; é sempre aplicável a taxa reduzida de 27o, tendo em conta a função económica e social em causa.

7 — É bem conhecido o problema da tributação das partes sociais nas transmissões a título gratuito.

Se se trata de sociedades não por acções, ou por acções sem cotação, suscita-se a determinação do seu valor. Se há tarefa ingrata, de resultados sempre discutíveis e aleatórios, esta é uma.

Por outro lado, o imposto sobre as sucessões e doações por avença praticamente desapareceu por falta de dividendos, e, mesmo que se deslocasse para uma percentagem dos lucros, distribuídos ou não, estes não são ainda dignos de suficiente fiabilidade em numerosíssimas sociedades (não omitir que 400 empresas pagavam