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II SÉRIE-A — NÚMERO 3

construção da «ponte romana» aos Mouros numa só noite; o segundo é o «penedo da Moura», onde a prisioneira árabe estendia ao sol as suas arrecadas de ouro, que ninguém se atrevia a tocar.

No domínio do real é evidente o reflexo da passagem dos Árabes nas seguintes expressões da linguagem popular: «trabalhar como um mouro» e fulano «é um mouro de trabalho». Ao falar assim o povo faz uma comparação; mas, para fazer uma comparação com os Mouros, o povo precisou de os conhecer antes.

VI — O aparecimento de Caldelas e suas termas

Nos tempos da reconquista e das lutas da independência existiam na região de Caldelas aglomerados rurais pequenos e dispersos com nomes comuns de origem romana (villas e quintas). É curioso observar que ainda hoje, passados oito séculos, subsistem aqueles nomes em dois lugares de Caldelas: o lugar da Vila e o lugar da Quinta.

A divisão eclesiástica do território fez-se em bispados e estes em arcediagos e arquidiaconatos, que, por sua vez, se dividiam em paróquias ou freguesias.

Em documento eclesiástico de 1145 há notícia de uma divisão de arcediagos de Braga entre o arcebispo e o seu cabido. Tratou-se de direitos de igrejas, herdades e rendimentos. Naquela divisão referem-se os nomes de freguesias vizinhas de Caldelas (como a Torre e São Vicente) e o arquidiaconato de Entre Homem e Cávado. Como é óbvio, Caldelas estava na área daquele arquidiaconato, mas o seu nome não consta expressamente no documento.

Cabe aqui uma observação que poderá fazer alguma luz sobre a omissão do nome de Caldelas no documento anterior e, simultaneamente, sobre a sua inclusão no documento que se refere mais abaixo. Apesar da sua inserção na diocese de Braga, Caldelas foi terra da Comenda de Cristo, e por isso deteve até 1918 o título de reitoria; só pelas constituições bracarenses daquele ano Caldelas se converteu em abadia.

No começo do século xm abriu-se um litígio entre o arcebispo de Braga e os reitores de várias igrejas, que se recusavam a pagar direitos à cúria diocesana. O papa Inocêncio III, por bula de 1208, encarregou o deão de Zamora de decidir o pleito entre o arcebispo de Braga D. Martinho e os reitores daquelas igrejas. Entre as freguesias referidas no documento consta expressamente o nome de Sant'Iago de Caldelas.

A referência de Caldelas naquele documento não é lisonjeira, mas demonstra que a freguesia de Caldelas já tinha existência canónica em 1208. Esta informação é muito importante.

As Inquirições de 1220 mencionam-na em «Terra» de Bouro, dizendo que o «rex non est patronus». Foram anexas de Caldelas as paróquias de Lanha e Vilarinho. Administrativamente, foi da «Terra de Bouro» já desde antes da nacionalidade.

O nome «Caldellas» (grafia antiga) é todo de origem latina e o seu significado relaciona-se directamente com as nascentes mineromedicinais.

De facto, etimologicamente, o vocábulo «caldellas» é uma palavra derivada do étimo latino «calda» (que significa água quente) com o sufixo diminuitivo «ella» também latino (que junta a ideia de pequenez). Os dois elementos formaram o nome «Caldellas», que se adoptou no plural por se referir a duas nascentes.

O significado do nome é evidente, e a ideia de pequenez derivou do facto de se aplicar a duas nascentes espremidas entre rochas e, por isso, pequenas ou com um débito inicialmente bastante reduzido.

Assim, o nome «Caldellas», literalmente, significa pequenas nascentes de água quente.

A análise etimológica do nome «Caldellas» sugere algumas observações de especial interesse.

Antes de mais, observa-se que o nome (de origem latina) estará naturalmente ligado à época da romanização, e, sendo assim, constitui mais um argumento a juntar ao das lápides romanas, para demonstrar o contacto da população primitiva com os Romanos.

Em segundo lugar, verifica-se que o nome «Caldellas», inicialmente, foi dado às duas nascentes de água quente e não à povoação onde elas brotavam. Daqui pode concluir-se logicamente que a povoação ainda não tinha nome próprio, e, consequentemente, o interesse dos Romanos pelo local fixava-se naquelas nascentes ou nas «caldellas».

Fica assim explicada a origem do nome «Caldellas».

Poder-se-á perguntar se o nome terá sido formado e imposto às nascentes pelos Romanos que as procuravam e as utilizavam ou pelos habitantes do lugar que aprenderam o latim com os soldados e mercadores romanos. A resposta não é fácil e será duvidosa.

Não se ignora que havia duas espécies de latim: o latim clássico (das escolas e dos mestres) e o latim vulgar, falado pelo povo. Esta distinção não ajuda a resolver o problema porque os elementos latinos do nome («calda» e «ella») não são exclusivos de uma daquelas espécies de latim. Contudo, a perfeição da forma literal do nome parece fora do alcance do povo, que só conhecia o latim de ouvido. Ainda que a dúvida persista, a questão de saber quem formou e impôs o nome não interessa demasiado. O importante é saber que o nome «Caldellas» é de origem latina e significa pequenas águas quentes.

Depois operou-se a transferência do nome das nascentes para a povoação, que não tinha nome próprio. Isto quer dizer que as nascentes («caldellas») deram o nome à povoação onde brotavam.

Aquela transferência do nome resultou, decerto, de um processo espontâneo. Muito naturalmente os habitantes do lugar, como a povoação não tinha nome próprio e o nome das nascentes era bem conhecido, começaram a indicar a sua naturalidade com o nome de Caldellas.

Fosse quando e como fosse, o certo é que em documentos do começo do século xm, já referidos atrás, a povoação aparece identificada com o nome de Sant'Iago de Caldellas.

Caldelas (só com um «1») é grafia moderna do primeiro quartel do nosso século.

A propósito e a título de curiosidade refere-se aqui uma pequena «história» acerca da origem do nome de Caldelas.

A «história» deve ter sido provocada por um documento de 1528 relativo aos direitos devidos ao arcebispo de Braga, onde o nome da povoação aparece com a grafia «Qualdellas» (Sant'Iago de Qualdellas).

Perante aquela grafia alguém deduziu que se tratava de um vocábulo composto por justaposição de «Qual — delias». Esta dedução teoricamente estava certa, pois a composição por justaposição é um dos processos da formação das palavras em português.