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II SÉRIE-A — NÚMERO 23

do filho, designadamente as relativas à saúde, educação,

residência, mudança de área geográfica de residência, educação, religião e administração dos bens, serão objecto do acordo de ambos.

2 — Antes da reforma que incidiu sobre o Código Civil em 1977, a lei colocava nas mãos do pai o exercício do poder paternal, embora não vedando à mãe o direito de ser ouvida sobre questões que aos filhos diziam respeito. Era uma decorrência da assunção masculina da autoridade familiar, a que a Constituição de 1976, através da consagração do princípio da igualdade perante a lei, da não discriminação em função do sexo e da plena equiparação dos cônjuges .viria a pôr cobro. Para trás, como eco da nova filosofia legal, ficava um lastro poderoso de doutrina jurídica perorando contra as normas do Código Civil de 1966 e, antes mesmo disso, contra a tibieza dos direitos concedidos à mulher casada e à mãe durante a 1 República e na vigência do Código de Seabra.

E a fisionomia das novas regras do direito da família tornou-se, a partir daí, das mais progressivas no plano internacional.

3 — Não passou em 1977 à margem da ponderação legiferante o sistema de guarda conjunta em casos de patologia das sociedades conjugais. E bem se compreende que a ideia tenha marcado presença. De facto, o discurso feminista que a reforma assumidamente ponderara vinha já naqueles finais da década de 70 insistindo na demonstração de que é fundamental implicar os dois progenitores na vida e educação dos filhos, facto que o tradicional cometimento à mãe, e só a ela, da guarda do menor quando a vida conjugal termina, desvirtua, com implicações nocivas tanto no desenvolvimento da criança, como no de uma oneração psicológica e socialmente perversa de um único progenitor, o feminino.

Apesar disto, entendeu na altura o legislador que melindres pontuais poderiam emergir de uma tal opção, e acabou por não ir por aí.

Ou melhor: de não ir claramente por aí, e não estabeleceu a guarda conjunta como regra inequívoca.

4 — É que, apesar de estabelecido o sistema da guarda única, nem por isso a doutrina deixou de reconhecer a flexibilidade do pensamento legislativo, a sua primordial atenção àquele que é, nos termos da lei, o interesse decisivo a tutelar: o do menor, perante a conflitualidade gerada entre os pais e face à qual importa ser preservado (obviamente que também pelo direito) tanto quanto possível.

Não será, pois, de estranhar que interpretações tenham surgido da lei vigente, sufragadoras da admissibilidade por ela de uma abertura ao regime jurídico da guarda conjunta.

Têm sido estes os principais argumentos de uma tal doutrina'

A fundamentação do sistema de guarda única é acima de tudo a defesa do interesse do menor, ou seja, o objectivo de o não expor, na medida do possível, às mais nocivas consequências da instabilidade provocada pelo desentendimento conjugal dos pais. Isto compreende-se bem sendo o pano de fundo as relações familiares tradicionais, mas torna-se questionável a partir do momento em que a disseminação do divórcio ou dos outros casos de separação dos pais impõem, a bem dos filhos, a sua desdramatização, a qual tem como importante vertente o fortalecimento dos laços com o pai e a mãe;

A jurisdição voluntária não vincula o juiz a observar estritamente o direito aplicável e dá-lhe, ao invés, a possibilidade de proferir a decisão mais justa, oportuna e adequada ao caso concreto, desde que ditada por razões de equidade;

No instituto da guarda do menor, o critério determinante da decisão a proferir é o do interesse deste último. Se este ditar um regime de guarda conjunta, a sua aplicação não deverá considerar-se contrária à ordem pública.

5 — Em matéria de tanta sensibilidade, a clarificação legislativa impõe-se mesmo quando a doutrina aceita adequação das normas a soluções mais justas e adaptadas a outros tempos e costumes. O ponto não estará, pois, em questionar a bondade de uma alteração legislativa assumidamente favorável ao regime de guarda conjunta, mas sim em determinar a configuração que esta venha a assumir.

6 — Vários países europeus a consagram já como regra. Fora da Europa marca, pelo apuro normativo, a lei canadiana relativa a esta matéria. Entre nós vem sendo afirmado pelos mais convictos defensores do sistema de guarda conjunta a evidente maior preparação para a sua adopção pelos estratos sociais mais diferenciados. Esta circunstância — a existência de clivagem entre a atitude das elites e a da restante população face ao problema — impõe cuidados na ponderação do recorte técnico do sistema de guarda conjunta (designadamente da margem de intervenção do Tribunal no processo) a que, decerto, não será alheio o objectivo dos subscritores do projecto de lei n.° 475/VI — mas que requerem uma grande atenção e igual apuro na redacção final do texto que a Assembleia da República venha a aprovar.

Conclusão

1 — O projecto de lei n.° 475/VI pretende instituir um sistema de guarda conjunta dos menores, acordado pelos pais em caso de separação e com incidências sobre questões de particular importância para a vida do filho.

2 — Tem presente a insubstituível função judicial na determinação dos pressupostos da aplicação desse regime, oú seja, na detecção daquelas situações em que esta se afigure a melhor solução para o desenvolvimento integral (psicológico e afectivo) do menor.

Parecer

0 projecto de lei n.c 475/VI reúne todos os requisitos legais e regimentais para subir a Plenário.

Palácio de São Bento, 22 de Fevereiro de 1995.— A Deputada Relatora, Margarida Silva Pereira. — O Deputado Presidente da Comissão, Guilherme Siiva.

Nota. — A conclusão foi aprovada por unanimidade (PSD, PS e PCP).

Anexo

1 — Argumentos favoráveis ao regime da guarda conjunta, aduzidos em regra:

Vantagem na presença dos dois pais, como forma, superior de incutir o sentimento de auto-esvima no menor;

Não é a circunstância de uma pluralidade de lares que desestabiliza emocionalmente uma criança;

A observação de uma relação dialogante, contínua, entre os pais, é positiva;

A pluralidade de pessoas no círculo mais estreito não perturba a capacidade de intimidade das crianças.

(Cf. Myriam Golper, O Guia das Crianças Separadas ou Divorciadas.)