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II SÉRIE-A — NÚMERO 23

A lei fez depender da «existência de participação criminai da violação» a «verificação da circunstância referida na alínea d) do n.° 1. Esta última exigência, extremamente polémica, subsistiu, apesar de terem sido apresentadas em comissão propostas em sentido contrário no decurso da discussão na especialidade. Igualmente rejeitadas foram as sugestões tendentes a contemplar situações de conflito ético decorrentes de graves formas de agressão à liberdade sexual da mulher não susceptíveis de serem tecnicamente consideradas «violação» (Diário da Assembleia da República, 2° série, n.° 83, suplemento, de 4 de Fevereiro de-1984) — cf. especialmente o debate transcrito a p. 454 da antologia publicada sob o título Questões de Bioética/Interrupção Voluntária da Gravidez, vol. 2, DILP, 1997).

O texto decorrente da reforma penal de 1994-1995:

Assegura que, verificados as demais condições da lei, a interrupção voluntária da gravidez não seja punível quando «houver sérios indícios de que a gravidez resultou de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual e for realizada nas primeiras 12 semanas de gravidez»;

Elimina .qualquer exigência de queixa policial como requisito de invocabilidade tanto da violação como de qualquer dos demais crimes contra a liberdade e autodeterminação social.

Assinalando o alcance da primeira alteração, pôde escrever-se com razão:

Se no caso de gravidez resultante de inseminação artificial não consentido (já) era legítimo identificar, antes de 1995, uma causa de justificação supralegal (através de um argumento de analogia com a violação), na hipótese de estupro o alargamento é mais significativo. Pode entender-se que, nesta última solução, estará em causa materialmente uma indicação social, assente no reconhecimento da imaturidade da mulher grávida (nesses casos de estupro)» — Rui Pereira, «Aborto», in «Código Penal — Revisão de 1995», revista Sub Júdice, n.° 11, 1996, p. 175.

A segunda alteração corresponde à supressão de uma das soluções restritivas mais polémicas emergentes do processo legislativo de 1984 — cf. Diário da Assembleia da República, 2.° série, n.° 83, suplemento, de 4 de Fevereiro de 1984. As críticas foram feitas tanto pelo ângulo da dúbia operatividade no sentido restritivo (dado o facto de os opositores da alteração da proibição recearem escassa eficácia dos médicos na verificação de requisitos policiais), quer, na óptica oposta, pela previsão de que o requisito poderia exercer uma função burocrático-punitiva, desincentivando a invocação em caso em que esta se justificaria ou agravando a pressão social sobre a mulher violada, sujeita à via crucis de esquadras especialmente impreparadas para o acolhimento de vítimas desse tipo de crimes.

D) O regime do consentimento da interrupção voluntária da gravidez foi simplificado (artigo 142.°, n.™ 3 e 4).

E) Foi eliminado o tipo criminal aborto «para ocultar a desonra» ou «para evitar a reprovação social» previsto no anterior artigo 139.°, n.° 4, Eduardo Maia Costa refere:

Finalmente, na vertente criminalizadora, há ainda a referir a eliminação da circunstância para ocultar a desonra» ou «para evitar a reprovação social» presente em alguns tipos de crimes cometidos por mulheres, na versão originária do Código Penal: infanticídio (artigo 137.°); exposição ou abandono (artigo 138.°, n.°4); aborto (artigo 139.°, n.°4).

E comenta:

Se a eliminação da referência à «honra» é de saudar, por razões obvias, já no que se refere à «reprovação social» é de questionar se essa previsão não correspondia (ou não corresponde ainda) a situações de efectiva e «insustentável» pressão social de forma a diminuir sensivelmente a culpa do agente em termos atendíveis.

Os factores de tratamento mais favorável da mulher decorrentes da anterior redacção continuam, no entanto, a relevar como circunstâncias exculpadoras nos termos previstos na parte geral do Código.

F) A tentativa de aborto consentido deixou de ser punível.

A reforma definiu-se também por ter mantido soluções cuja alteração chegou a ser aventada:

Não revogou a norma da Lei n.° 6/84 (artigo 2.°), que sanciona o médico que não se premunir ou não obtiver posteriormente os documentos comprovativos da impunibilidade da interrupção voluntária da gravidez;

Não introduziu qualquer norma similar ao n.° 1 do § 218 do Código Penal alemão (que define qual o momento que deve ter-se como o início da gravidez);

Manteve o prazo de 16 semanas como limite legal para a realização da interrupção da gravidez por razões eugénicas.

É este e não outro o quadro legal agora sujeito a reexame. Os projectos apresentados são de distinta natureza e aventam essa reavaliação em termos distintos. Cumpre agora analisá-los.

V — As questões em apreciação

1 — Enquadramento

No debate público em curso é frequentemente mencionado o contraste entre a situação portuguesa e a de outros países.

É o que sublinham também proponentes das iniciativas em apreço:

Em termos de direito comparado das legislações existentes nos países da União Europeia, a legislação portuguesa é das legislações menos abrangentes quer em relação aos prazos para a PVG quer em relação aos motivos/causas de exclusão da ilicitude. (Projecto de lei n.°235/VII.:]

O direito comparado das legislações existentes ria União Europeia situa a legislação portuguesa nas \e-gislações menos abrangentes, quer no referente aos motivos, quer em relação aos prazos para a IVG. Em particular, os prazos para uma IVG nos casos de malformação do feto são muitas vezes impraticáveis face ao tempo de gravidez exigido legalmente, o quai tão permite claramente a comprovação daquele facto.

Assim, em termos de legislação comparada, podemos constatar que na Dinamarca, França e Grécia é permitida a IVG a simples pedido da mulher, sem invocação de motivos, até às 12 semanas.

Por outro lado, assiste-se desde a década de 70 à despenalização da IVG por indicações sociais na Dinamarca, Alemanha, Itália, Luxemburgo e Inglaterra, oscilando os prazos entre as 12 e 28 semanas.

A Holanda e a Bélgica incluem, ainda, no seu ordenamento jurídico a possibilidade de prática de IVG por situação intolerável ou por angústia até às 12 e 24 semanas, respectivamente. (Projecto de lei n.° 236/VI.]