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II SÉRIE-A — NÚMERO 23

Mais tarde, o PSD apresentou também um projecto (o projecto de lei n.° 374/11) sobre direito ao planeamento familiar. Entre 9 e 11 de Novembro de 1982 {Diário da Assembleia da República, 1." série, n.™ 10 a 12) foram discutidos os diplomas, tendo sido aprovados na generalidade e descendo à Comissão de Saúde, Segurança Social e Família somente os projectos n.05 307/11 e 374/0, sobre defesa da maternidade e planeamento familiar, respectivamente. O projecto de lei n.° 308/TI foi rejeitado. Rejeitado também foi o projecto de lei n.° 309/n, sobre interrupção voluntária da gravidez, depois de discutido na sessão parlamentar de 11 de Novembro.

Aquando da apresentação e discussão da proposta de autorização legislativa relativa ao novo Código Penal, diversas intervenções tiveram lugar sobre o crime de aborto nele previsto (Diário, 1.a série, n.re 114, 121 e 122, de 7, 17 e 20 de Julho de 1982). Sem eco, porém, dado o ciclo político em curso.

Na sessão legislativa subsequente, o processo legislativo foi reaberto, mas num quadro político distinto: renovação das iniciativas do PCP (Diário, 2.a série, n.° 1, de 1 de Julho de 1983) e, do lado do Partido Socialista, claro empenhamento político na aprovação da. sua solução própria nos domínios em causa (projecto de lei n.° 265/UI, Diário, 2." série, n.° 73, dé 14 de Janeiro de 1984).

A discussão em Plenário (Diário, n.06 67 e 68, de 26 e 27 de Janeiro de 1984) conduziu à aprovação, na generalidade, do projecto de lei n.° 256/m e de mais dois projectos do PS e do PSD sobre educação sexual e planeamento familiar e protecção da maternidade e paternidade (projectos de lei n.<* 267/ni e 272/m, respectivamente), com rejeição dos projectos n.08 5/UI, 6/JJI e 7/TU, que o PCP apresentara também sobre as matérias referidas em último lugar.

A matéria relativa à interrupção voluntária da gravidez foi discutida, na especialidade, pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e foi aí aprovada com alterações. O debate, de grande extensão e qualidade, mas pouco conhecido, foi registado integralmente. Está publicado no Diário da Assembleia da República, 2.a série ( n.05 81,82, 83, suplemento, 84, suplemento, 85 e 86, de 2 a 8 de Fevereiro de 1984).

O debate fornece preciosos elementos para a interpretação da lei, tanto pelo que foi aprovado como pelas soluções limitativas e penalizações que foram rejeitadas. A título de exemplo, a lei:

Consagra a irrelevância penal dos actos impeditivos da gravidez depois da fecundação mas antes da nidação, bem como a irrelevância dos actos abortivos em . caso de gravidez condenada (v. g. ectópica, extra--uterina ou cancro no útero) ou de feto inviável, sem prazo;

Não definiu, premeditadamente, o sistema de contagem dos prazos da gravidez, remetendo para as leges artis da medicina essa tarefa;

Consagrou em termos latos o aborto ao abrigo da indicação psíquica;

Não criminaliza os actos respeitantes a fetos inviáveis, nem lhes fixa prazos, por, por definição, não poderem tê-los;

Não penaliza — deixando ao critério do médico— os actos que em qualquer estádio da gravidez sejam o único meio de salvar a vida da mãe (o que posiciona claramente o legislador português perante a problemática, hoje muito discutida em outros países, em torno da late term abortion ou pardal birth).

Por outro lado, foram rejeitadas, entre outras alterações propostas, soluções legais tendentes a.

Limitar o aborto terapêutico;

Aditar exigências de reconhecimento notarial para validade do consentimento da mulher;

Circunscrever os actos de IVG a médicos especialmente credenciados;

Permitir a quebra do sigilo profissional para apurar o cumprimento pelos médicos dos limites legais;

Tomar mais difícil o regime de prova participação criminal como requisito para aborto por violação. Na sequência desta rejeição o CDS viria a abandonar os trabalhos da Comissão (suplemento ao Diário da Assembleia da República, Ia série, n.° 83).

O diploma obteve aprovação final global (Diário, 1 .* série, n.°75, de 15 de Fevereiro de 1984) por maioria simples. O mesmo se diga dos projectos relativos à educação sexual e planeamento familiar e à defesa da maternidade e da paternidade, também objecto de aprovação final global na mesma sessão, depois de prévia discussão e votação na especialidade na respectiva comissão parlamentar.

Sujeito a fiscalização preventiva, o diploma não foi declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional — Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 25/84, de 19 de Março — e veio a ser promulgado e publicado como lei. Posteriormente, o Provedor de Justiça requereu a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade dos artigos 140." e 141.° do Código Penal, na redacção que lhes foi dada pelo artigo 1.° da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, bem como dos artigos 2.° e 3.° dessa mesma lei, que excluem a ilicitude em certos casos de interrupção voluntária da gravidez.

O Tribunal Constitucional, mais uma vez, não se pronunciou pela inconstitucionalidade dessas normas — cf. Maria da Conceição Ferreira da Cunha, Constituição e Crime, UCP ed., Porto, 1995, p.391.

As soluções aprovadas serão ainda examinadas — não apenas por razões de brevidade mas de perspectiva, claramente enunciadas na parte i deste relatório. De facto, em 1984, o quadro constitucional não fora «testado» e tratava--se de fazer ex novo um regime que rompia com a solução tradicional. Agora é conhecida a jurisprudência constitucional. As alterações propostas não viram impugnada a sua admissão com fundamento em inconstitucionalidade — quando se apreciarem as alterações agora aventadas pelos proponentes.

2 — Reforma penal de 1994: a discreta ampliação da lei do aborto

2.1 — A questão da interrupção voluntária da gravidez não esteve no centro do processo de debate da reforma penal de 1994 nem foi objecto de relevante discussão pública, quer suscitada por partidos políticos quer por qualquer das entidades que sobre a matéria foram chamadas a tomar posição durante o processo legislativo.

Não esteve, porém, dele ausente.

O quadro legal respeitante ao aborto foi significativamente flexibilizado em diversos pontos, de forma tão discreta que não ocasionou controvérsia, pór défice de visibilidade, nem parece ter tido impacte social relevante, pela mesma exacta razão.

Não deixa, porém, de suscitar alguma perplexidade o facto de as alterações legais geradas nesse contexto serem praticamente desconhecidas, tendo merecido escassa atenção a nível científico e nenhuma em termos de apreciação pública