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1 DE AGOSTO DE 1997

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Foi neste contexto que se iniciou a revisão do-quadro normativo a que actualmente se subordina a dívida pública principal, interna e externa.

Essa revisão assentou nos seguintes princípios orientadores:

Sistematização da legislação vigente e sua adaptação aos novos contextos e práticas de funcionamento dos mercados financeiros, nacionais e internacionais, e ao funcionamento do Estado como tomador de fundos sem privilégios e em concorrência com os demais agentes económicos;

Compatibilização entre os instrumentos de controlo do crédito público e a necessária flexibilização da gestão da dívida pública e do financiamento do Estado, por forma a ficar sempre assegurado o aproveitamento pelo Estado das melhores condições vigentes nos mercados financeiros;

Adequação da legislação vigente aos poderes e funções do Instituto de Gestão do Crédito Público, recentemente criado;

Adequação do enquadramento jurídico de emissão e gestão da dívida pública ao actual quadro constitucional e comunitário e à forma como tem evoluído, na prática, o recurso pelo Estado ao endividamento público.

2— Com efeito, a Lei n.° 1933, de 13 de Fevereiro de 1936, e demais legislação complementar, concebidas dentro da ortodoxia financeira do Estado Novo, eram sobretudo marcadas por uma grande preocupação com o limite do recurso ao crédito e com uma disciplina jurídica muito rigorosa, pensada em função de um quadro limitado de instrumentos, previstos para mercados e investidores pouco dinâmicos. A maior parte da Lei n.° 1933 encontra-se revogada ou a sua aplicação caiu em desuso, podendo mesmo dizer-se que, mais do que uma legislação antiquada sobre o processo de endividamento público, existia um quadro insuficiente, lacunar e, por vezes, contraditório.

Consequência da situação descrita foi a de as sucessivas leis de orçamento inserirem normas que permitiram a emissão e gestão da dívida pública, sobrepondo-se, por vezes, à legislação reguladora, que, no entanto, não era expressamente reyogada.

3 — A outra grande fonte reguladora da matéria da emissão e gestão da dívida pública têm sido os próprios diplomas específicos que criaram as diferentes modalidades de empréstimo de que o Estado tem lançado mão, sobretudo no mercado interno.

4 — Sem ignorar a importância das leis orçamentais para a adequação anual da política de endividamento público, não parece que se possa dispensar, no entanto, uma legislação de base que fixe os grandes princípios nesta matéria.

É esse o principal objectivo da presente proposta de lei.

Na sua preparação foram levadas em linha de conta as disposições que já tinham sido consagradas nas leis orçamentais e que se tinham revelado adequadas aos novos moldes de funcionamento do mercado da dívida pública, ao mesmo tempo que consubstanciavam soluções que foram recolhendo consenso parlamentar.

No que respeita às leis reguladoras de cada tipo de empréstimo, afastou-se a ideia de as integrar neste diploma, quer por se considerar que ele apenas deve conter princípios de ordem geral, quer por se admitir que haja vantagem em rever, caso a caso, essa legislação.

A opção privilegiada na presente proposta de lei é, pois, a de criar um quadro aberto de instrumentos de dívida pública, contrariamente àquilo que sucedia na vigência da Lei n.° 1933, por parecer que essa é a única solução que se coaduna com as actuais condições de funcionamento dos mercados financeiros.

Nesse sentido, embora mantendo a técnica tradicional de individualizar formas de representação da dívida pública, a proposta de lei consagra alguma maleabilidade na criação de novos instrumentos financeiros.

Não obstante, deverá assinalar-se que o diploma se reporta apenas à dívida directa do Estado, isto é, àquela que respeita à obtenção de recursos financeiros para fazer face às necessidades de financiamento decorrentes da execução das tarefas prioritárias do Estado, constitucionalmente consagradas. Nessa medida, não cabem no seu objecto as demais situações de passivo patrimonial, quer quando o Estado é garante de obrigações alheias, quer quando é devedor de importâncias pela aquisição de bens ou serviços.

5 — A elaboração de uma proposta de lei como a presente envolve opções de fundo da maior importância, de entre as quais é de destacar a possibilidade de inclusão de limites ao endividamento público.

Como é sabido, a Constituição de 1933 fixava esses limites, em termos que, no entanto, estiveram longe de ser plenamente respeitados, enquanto a Constituição" de 1976, coerentemente com a concepção de finanças intervencionistas plasmada de forma especialmente nítida na versão originária, não fixou quaisquer limites expressos, embora se possa tentar deduzir a existência de limites implícitos, que se reconduzem, em última análise, ao dever de boa administração.

No plano do direito comparado, são muito raros os textos constitucionais em que se estabelecem limites ao endividamento, muito provavelmente pela dificuldade em encontrar fórmulas totalmente ajustadas aos efeitos pretendidos.

Todavia, pode considerar-se que foram já introduzidos, em resultado do Tratado da União Europeia, alguns limites indirectos ao endividamento público, quer pela interdição de financiamento do Estado e demais entidades públicas junto do Banco de Portugal, quer pela proibição de utilização de instrumentos que privilegiem o financiamento das entidades públicas em detrimento das privadas.

Mais directos e categóricos são, porém, os limites que resultarão do pacto de estabilidade e crescimento e dos regulamentos a adoptar em sua execução.

Não obstante, parece legítimo extrair do rico debate que sobre esta matéria se tem vindo a desenrolar, particularmente nos Estados Unidos e na União Europeia, a conclusão da desejabilidade da existência de limites ao endividamento em simultâneo com a verificação da dificuldade do seu estabelecimento em concreto. A polémica em torno da transferência de ónus entre gerações não pode, pois, ser ignorada e coloca questões éticas importantes aos decisores políticos e aos gestores financeiros.

Consciente desta problemática, o Governo assume através da presente proposta de lei que se deve visar o equilíbrio, no médio prazo, das contas públicas, ou seja, tender para o equilíbrio, em linha, de resto, com o pacto de estabilidade e crescimento, mas não se ignora que, muito provavelmente, será necessário continuar a recorrer à dívida pública.