23 DE MAIO DE 1998
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à autoridade judiciária no n.° 9, em coerência com as redacções dos n.º 7 e 8 do mesmo preceito que tratam de restrições menos relevantes ao princípio do segredo de justiça no inquérito.
Artigo 109.°, n."2 — Devia-se aproveitar o presente processo de revisão para uma correcta técnica da redacção originária do Código de Processo Penal, substituindo-se a referência ao Ministério Público por magistrado do Ministério Público, pois a Procuradoria-Geral da República é o órgão superior do Ministério Público, e não um elemento estranho ao Ministério Público (tal como o Conselho Superior da Magistratura é o órgão superior da magistratura judicial).
Artigo 113.°— Não se vislumbra utilidade à nova norma constante da alínea c) do n.° 4 do artigo 113.°
Artigo 114.° — O artigo 114.°, n.°2, introduz um regime inútil, porque a requisição ali prevista não tem efeito cominatório, e incorrecto, pois a obrigação de comparecer é da pessoa convocada, e não do serviço onde a mesma se encontre inserida. Acresce que não se compreende a redacção da parte final, que contém um mero preceito regulamentar, mais próprio da orgânica onde se insere o notificando e decorrente das obrigações deste último enquanto subordinado hierarquicamente a outrem.
Artigo 194.° — No que concerne à aplicação de medidas de coacção entendemos que se deveria consagrar expressamente o princípio, defendido pela generalidade da doutrina e reconhecido em direito comparado, de que durante o inquérito do juiz de instrução criminal não pode aplicar medida de coacção ao arguido mais gravosa do que a proposta pelo Ministério Público.
Refira-se que esse princípio, na nossa perspectiva, já decorre do preceituado pelo artigo 194.°, n." 1, mas é necessária a aludida clarificação, em virtude da existência de jurisprudência contraditória, que aliás põe em causa de forma grave direitos, liberdades e garantias e o próprio princípio constitucional do acusatório [trata-se, pois, de uma proposta que se insere nos objectivos constantes da alínea h) do n.° 3.2 do despacho n.° 54/MJ796 e a que a proposta de lei deu grande atenção, cf. os artigos 214.°, n.°4, 303.°, n.°4, 307.°, n.°5, 311.°, n.°3, e 362.°, n.° 1, alínea d)). Pois não se compreende que sem a existência de culpa formada (o que, de acordo com a doutrina do Tribunal Constitucional, só acontece com a dedução de acusação), possam ser impostas por um órgão incompetente para o exercício ex oficio da acção penal medidas mais graves do que as promovidas pelo titular da acção penal. A entender-se que o juiz de instrução criminal tem competência para, no inquérito, impor medida mais grave que a requerida pelo Ministério Público, pode-se dar origem a situações em que o juiz de instrução criminal imponha medidas de coacção extremamente gravosas para o arguido (máxime a prisão preventiva) em casos em que o Ministério Público entende que nem sequer existem indícios suficientes da prática de crime que torne, abstractamente, admissível essas medidas, vindo a arquivar posteriormente o inquérito (o que não seria caso original), ou aplicação de medidas mais graves que as requeridas em situações em que o titular do inquérito as considere prejudiciais para a investigação e, inclusive, para a manutenção ou obtenção da prova.
Artigo 215.°, n.°3 — Pensamos que a alteração aqui proposta (determinada pela eliminação, que se aplaude, do n.° 2 do artigo 209.°) devia ser melhor ponderada, sob pena de se pôr em causa alguns dos objectivos do projecto do Governo. Com efeito, impedir o prolongamento de prazos previstos no artigo 215.°, n.° 3, designadamente nos processos por crimes de associação criminosa, contra a soberania
nacional (por exemplo, artigos312.°, 315.°, n.°2, e 333.° do Código Penal), de furto ou falsificação de veículos, de falsificação de moeda ou de títulos de crédito, de burla qualificada (designadamente através do sistema bancário ou informático) de excepcional complexidade devido, nomeadamente, ao número de arguidos ou de ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime, pode pôr em causa o sucesso da repressão criminal de alguma da criminalidade mais grave. Acresce que esta norma quase fica esvaziada de sentido, pois, além dos crimes relativos ao tráfico de estupefacientes, são poucos os crimes com penas superiores a 8 anos de prisão subsumíveis aos requisitos do n.°3 do artigo 215." (em que, existindo presos preventivos, o procedimento se revele de excepcional complexidade). Pelo exposto, sugere-se que:
1) Se reproduz o elenco do actual artigo 209.°, n.°2 (acrescido da referência às burlas qualificadas através do sistema financeiro), ou se substitua a proposta pela referência a crimes com pena de prisão de máximo igual ou superior a 8 anos;
2) Estabeleça-se a regra de que o prolongamento dos prazos ali referidos apenas deve ocorrer após despacho fundamentado do juiz nesse sentido.
Artigo 264.° — Entendemos que se deve fazer coincidir a regra de competência territorial constante do artigo 274.° com a que resulta da do artigo 19.°, a fim de evitar uma inútil querela conceptual sobre a distinção entre o lugar do cometimento e o lugar da consumação do crime (v. ainda o comentário supra ao artigo 27.°).
Artigo 268.°, n.°l, alínea c) — Entende-se que se deve aproveitar a presente revisão para resolver a incongruência sistemática da conjugação do artigo 181.°, n.° 1 (onde se refere que a competência é da autoridade judiciária, Ministério Público ou juiz, conforme a fase), com a alínea c) do n.° 1 do artigo 268.°, que apenas devia referir-se ao n.° 2 do artigo 181." [embora, à luz do texto vigente, seja defensável, e na nossa perspectiva a mais correcta, a interpretação que limita a necessidade de intervenção do juiz de instrução criminal aos casos do n.°2 do artigo 181.°, a actual redacção da alínea c) do n.° 1 do artigo 281.° pode colocar dúvidas a muitos aplicadores].
Artigo 270.°, n.° 3 — Entende-se que, tendo em atenção o valor probatório das perícias (muito diferente dos exames, por exemplo), a possibilidade de delegação em autoridades de polícia criminal da «faculdade de ordenar a efectivação da perícia relativamente a determinados tipos de crime», é incompatível com as garantias de defesa adequadas a um Estado de direito. Aliás, essa intervenção policial, que, frise-se, põe em causa direitos de defesa do arguido ou suspeito, não tem fundamento na protecção de quaisquer valores de ordem constitucional, pois vai além das (justificadas constitucionalmente) competências policiais em matéria de medidas cautelares. Acresce que se se estiver a pensar na efectivação de perícias por organismos inseridos nas orgânicas de determinados órgãos de polícia criminal, não se justifica a delegação (que aliás não pode ser genérica) da faculdade de ordenar a efectivação da perícia, pois a decisão da realização desse acto deverá competir sempre à autoridade judiciária competente. Em face do exposto, entende-se que apenas deve ser admitida a possibilidade (que já resulta do n.° 1) de delegar as diligências necessárias para a efectivação da perícia em órgãos de polícia criminal, mas nunca a de a ordenar.
Artigo 278.°—Entende-se que, salvo o devido respeito, não tem fundamento a alteração proposta para este preceito.