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II SÉRIE-A — NÚMERO 53

ANEXO N.° 10

Parecer da Prof.° Teresa Beleza

Projecto de revisão do Código de Processo Penal

(sessão do Conselho Superior do Ministério Público de 7 e 8 de Julho de 1997)

Declarações de voto da vogal Maria Teresa C. Pizarro Beleza

Artigo 57." («Constituição de arguido») — À semelhança do que acontece em alguns países e na esteira do que tem sido projectado e discutido em fora internacionais com competências neste campo, julgo que será de consagrar a necessidade da entrega ao detido de um documento escrito de que constem, pelo menos, os direitos e deveres processuais dos arguidos. Creio que esse facto toma mais tangível e efectivo o conhecimento, por parte do detido, do que «lhe está a acontecen> e daquilo que pode fazer para se defender ou para minorar os efeitos pessoais de insegurança e desconforto inevitáveis em tais situações.

A comunicação e ou explicação orais dos motivos da detenção e dos inerentes direitos e deveres — como agora o Código de Processo Penal impõe (artigo 58.°, n.° 2) — podem ser altamente voláteis e insistentes para alguém que provavelmente se encontrará numa situação difícil, de alguma perturbação. Os acontecimentos (infelizmente reais) de pouco respeito pela integridade física e moral das pessoas em alguns encontros com a polícia ou em situações de permanência nas esquadras policiais .em Portugal (referidos nos relatórios da Amnistia Internacional) tomam porventura esta exigência mais premente.

Para o cidadão comum, não jurista (e mesmo para este, em certos casos), pode não ser nada evidente, mesmo depois de uma explicação oral, o que pode ou não fazer em seguida a uma detenção.

A efectivação dos princípios do Estado de direito democrático só teria e ganhar com essa prática.

As situações de impossibilidade real, fáctica, do cumprimento dessa obrigação — «agentes da polícia [...] em situações de emergência[...] fora de serviço» (parecer da Procuradoria-Geral da República) ou, por exemplo, a detenção por parte de cidadãos comuns [nos termos do artigo 255.°, n.° 1, alínea b), do Código de Processo Penal) — estarão cobertas por princípios gerais de direito: a obrigação de cumprir um dever pressupõe a efectiva possibilidade de cumprimento desse dever (independentemente de se discuür se essa obrigação existiria ab initio para os cidadãos comuns, o que pode parecer um contra-senso). Situações de emergência, de necessidade, estão, como se pode exemplificar com disposições dos actuais Código Penal e Código de Processo Penal, sujeitas a princípios de excepção.

Artigo 61.° («Direitos e deveres processuais») — É minha convicção de que os antecedentes criminais do arguido só deveriam ser conhecidos do julgador no momento posterior à condenação, para efeitos de sentencing. Por isso, e independentemente da aceitação de um modelo que implique uma verdadeira cesure na audiência de julgamento, acompanharia os avanços no texto do Código —r bem sei que nem o projecto irá tão longe— que signifiquem uma progressiva aproximação desse «ideal».

Assim sendo, parece-me de saudar a redacção proposta para a alínea c) do n.°4 do artigo 61.°

Artigo 68.° («Assistente») — Independentemente da razão histórica da atribuição ao juiz da competência para decidir

sobre a constituição de assistente, julgo que esta regra deve ser mantida, ao contrário do entendimenio que fez vencimento no Conselho.

Por um lado, entendo que a descrição do estatuto processual do assistente como mero «colaborador do Ministério Público» peca por defeito, pese embora a redacção (a manter, segundo o projecto) do artigo 69." do Código de

Processo Penal. Basta pensar nos importantíssimos poderes

que este sujeito processual detém no nosso sistema —— nomeadamente o poder de requerer abertura de instrução como forma de «impugnar» uma decisão de arquivamento ou de acusação «parcial» (no sentido de «incompleta», na perspectiva do assistente) por parte do Ministério Público.

Por outro, é para mim evidente que a constituição de assistente num processo crime toca inevitavelmente a posição processual do arguido. Se assim não fosse, aliás, a sua existência seria espúria ... Por esta mesma razão, julgo que é ao juiz que deve caber o poder da sua constituição.

Seja qual for a redacção adoptada para o artigo 268.", n.° 1, alínea e) (no projecto: «[...] reconhecimento efectivo de direitos processuais do arguido ou do assistente», penso que o juiz deve continuar a ser a autoridade judiciária com poderes de decisão em matérias fundamentais para assegurar ao máximo as suas possibilidades reais de defesa.

Admitir ou recusar que alguém se constitua assistente num processo é certamente uma dessas decisões.

Artigo 88." («Meios de comunicação social») — O projecto prevê a possibilidade de «oposição de qualquer dos sujeitos processuais interessados» ao registo de imagem ou som e sua transmissão.

0 Conselho entendeu por maioria que deveria sugerir a eliminação desta possibilidade, deixando nas mãos da autoridade judiciária a decisão, precedendo consulta aos sujeitos processuais.

Os principais argumentos parecem ser:

1) O carácter público dos actos processuais (constitucionalmente exigido quanto à audiência de julgamento, enquanto garante da democraticidade e legitimação da justiça penal);

2) A inexistência de um direito à imagem a preservar nessas circunstâncias (como consequência da publicidade do acto);

3) A desigualdade político-social que adviria necessariamente da possibilidade de oposição (os arguidos «poderosos» tenderiam a opor-se à exposição mediática, os arguidos humildes teriam mais dificuldade em fazê-lo, por ignorância, falta de iniciativa ou de à-vontade, etc).

Sobre estes argumentos, oferece-se-me dizer o seguinte:

1 — Não creio que o carácter público de quaisquer actos implique necessariamente o seu carácter mediatizável (passe o neologismo ...). Também a celebração de casamento e a prestação de provas académicas são por lei públicas e certamente ninguém defenderá que essa característica implique, necessariamente, a obrigação de suportas a exponenciação da publicidade que uma transmissão televisiva implica. Além disso, a consciência de que se é filmado, gravado ou simplesmente fotografado constitui, para a generalidade das pessoas — ainda que habituadas, por ofício ou notoriedade, a tal exposição — um impotvavNXe. condicionamento psicológico do seu comportamento. Não creio que a justiça ganhe com esse acréscimo de pressão sobre os actores envolvidos. Porventura, a humaníssima tentação de vedetismo por parte de alguns magistrados