O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1160-(44)

II SÉRIE-A — NÚMERO 53

atrevo a repetir só porque o argumento corresponde à minha mais funda e segura convicção: julgar e condenar um ausente é coisa que pode apaziguar a consciência dos magistrados à

responsabilidade de quem se encontra um processo, mas que em nada satisfaz a necessidade de estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma infringida; e é esta estabilização, não o apaziguamento da consciência individual dos juízes (e ainda menos, é claro, a conveniência

em maquilhar o rosto da estatística relativa a processos pendentes), que constitui um propósito básico de toda a política criminal, não só substantiva, como processual. Por isso penso há muito — depois da experiência, que tenho de considerar em larga medida falhada, do Código vigente em tema de contumácia — que nesta matéria a solução estaria em tomar efectivos mecanismos que a lei prevê já para desincentivar a ausência do arguido, para garantir a presença deste em acto processual e para assegurar produções antecipadas de prova; não em cair na solução tão fácil, quanto ineficaz, de julgar o arguido na ausência.

7.1 — A opção no sentido de eliminar a regra da presença do arguido na audiência de julgamento acarreta, na proposta da Comissão, a eliminação da declaração de contumácia, nesta fase do processo e com os objectivos que aí lhe são assinalados; tendo sido uma tal declaração colocada entre o inquérito e o julgamento para os casos residuais a que se destina. Trata-se, em meu juízo, de solução geradora de atrasos processuais inevitáveis, entre outras razões porque permite, depois daquela declaração, o requerimento para abertura de instrução. Um tal regime apresenta-se-me ainda mais criticável por as hipóteses abrangidas nem sempre serem casos em que deveria ter lugar a declaração de contumácia: esta pressupõe necessariamente uma subtracção dolosa ao exercício da justiça penal, não a mera circunstância de o arguido não ter sido notificado da acusação. Outra coisa só poderia pretender quem supusesse — erradamente, como é evidente — que à não notificação do arguido corresponde obrigatoriamente uma subtracção dolosa ao exercício da justiça penal.

7.2 — Para além das referidas alterações relativas à revelia ' e à contumácia, a proposta da Comissão introduz algumas

modificações em matéria de justificação de faltas a actos processuais, nomeadamente quanto à justificação com alegação de doença. Em rigor, nada tenho contra estas alterações, singularmente consideradas; mas receio bem que elas não possibilitem uma inversão da situação que presentemente se vive nesta matéria e, assim, que elas acabem por não contribuir para uma justiça mais célere, eficiente e eficaz. E escoro este meu receio, desde logo e além do mais, na circunstância de as magistraturas, para o efeito, não terem lançado mão, ao menos de forma sistemática, de muitas das possibilidades que, na matéria, lhes são oferecidas já pela lei vigente.

8 — A propósito ainda de celeridade, de eficiência e de eficácia na aplicação da justiça penal, outras soluções da Comissão não devem passar sem referência.

8.1 — Não compreendo, desde logo, o que possa justificar alterações introduzidas em matéria de nulidades, nomeadamente a regra de que todas as nulidades passam a ser de conhecimento oficioso. Doutrina esta que, para além de fazer tábua rasa da possibilidade de consenso processual, acarretará inevitáveis delongas no processamento.

8.2 — Quanto ao processo sumaríssimo, se por um lado foi alargado o seu âmbito de aplicação — e devo dizer abertamente que soluções como a do seu alargamento aos crimes puníveis com pena de prisão até 3 anos, a da possibilidade de aplicação nele de outras penas não privativas

da liberdade além da pena de multa e a da sua extensão aos crimes particulares em sentido estrito, me merecem irrestrito aplauso —, por outro restringiu-se a possibilidade prática da sua verificação, com a introdução de requisitos adicionais como o da concordância do assistente e do lesado e a da representação do arguido por defensor constituído. No que toca às restrições devo confessar com igual abertura que discordo delas, que me parecem injustificáveis e que provavelmente virão a determinar que as finalidades que se propôs esta forma de processo não venham minimamente a ser alcançadas.

9 — O exemplo mais flagrante de obstáculo ao encurtamento da duração dos processos — e uma das soluções estruturais que me merece mais claro repúdio — vejo-o eu, porém, nas alterações (na verdadeira revolutio, que significa o percorrer de toda a circunferência para se regressar ao ponto de partida) que se pretendem introduzir em matéria de recursos. A minha objecção, como sugeri já, funda-se não apenas na questão relacionada com a duração dos processos— celeridade que, por exemplo, eu creio necessariamente prejudicada com o disposto no artigo 364.°, n.° 2, se lembrarmos as condições reais de trabalho dos nossos tribunais—, mas também com a questão de fundo; numa palavra, com os méritos da criação de uma 2.a instância de facto, através do registo da prova produzida em 1.' instância perante o tribunal do júri, o tribunal colectivo ou o singular. A solução proposta representa, a meus olhos, um níüdo retrocesso do nosso direito processual penal; e para jusüficar esta afirmação peço vénia para recorrer ao essencial do que já há muito escrevi a propósito e continuo a julgar válido, a saber: que a apelação penal está hoje sob o fogo cerrado da crítica, é considerada uma espécie «má» de recurso, uma vez que, qualquer que 'possa ser a perfeição e a fidelidade técnicas do registo da prova, o tribunal de recurso não dispõe nunca das mesmas possibilidades de descoberta da verdade material de que gozou o tribunal de 1.* instância. Com efeito, os princípios da oralidade e da imediação dão os seus melhores frutos somente no decurso de uma audiência, pe\o que se corre o risco de a apelação contribuir para a diminuição da qualidade da justiça prestada em 1.a instância: ela representará sempre um convite implícito tanto a um menor cuidado na apreciação dos factos a troco de um ganho de tempo, como a uma injustificável atitude sistemática àe favor reum com que o tribunal de 1." instância procurará antecipar a situação, sem dúvida mais favorável, em que o arguido se apresentará perante o tribunal de apelação.

10 — Eis, Sr. Ministro, o que de mais essencial me pareceu merecer consideração na minuciosa proposta que V. Ex." entendeu por bem submeter à minha apreciação. De muitas outras soluções poderia falar: desde, por exemplo, o acordo que me merece a possibilidade de voto de vencido em 1 .* instância restrito às questões de direito (artigo 372.°, n.° 2); às reservas que me suscitam a «fuga para a frente» que representa a eliminação da doutrina hoje constante do artigo 209.° ou o alargamento dos casos em que o recurso é julgado em conferência [artigo 419.°, n.° 4, alínea d)]; até à discordância absoluta com soluções como a de equiparar o ofendido com o assistente, acabando com a figura ds> assistente-testemunha (artigos 133.°, 346.°. 353.° e 356.°) ou como a de restringir a intervenção dos jurados à matéria de facto (artigo 363.°, n.° 6). Mas tenho funda consciência de que não devo ir mais longe e que esgotei já, se não ultrapassei, o droit de regará que a amabilidade de V. Ex." me concedeu. Impõe-se-me, por isso, que fique por aqui. Só me atrevendo a solicitar que, não podendo porventura ser atribuída procedência às minhas considerações, em todo o