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23 DE MAIO DE 1998

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caso me seja creditada a mais límpida intenção de corresponder, pela melhor forma de que fui capaz, à gentileza e ao honroso interesse de V. Ex."

Peço-lhe, Sr. Ministro, queira aceitar a expressão da minha maior e mais respeitosa consideração.

30 de Maio de 1997. — Figueiredo Dias.

Sr. Ministro da Justiça:

Quis V. Ex." conceder-me o honroso encargo de submeter de novo à minha apreciação a proposta de alteração ao Código de Processo Penal. Dessa opinião me permito aqui dar conta sumária; e se o não fiz mais cedo foi apenas porque só na terça-feira regressei de Itália, onde participei numa reunião internacional com vista à preparação do próximo Congresso da ONU sobre a prevenção do crime e da delinquência.

Numa primeira apreciação do documento que V. Ex." houve por bem submeter à minha análise, o que revela de imediato é que,' em bom rigor, o texto de que agora tomei conhecimento em muito pouco (se é que em alguma coisa) tem a ver com o primeiro apreciado, bem se podendo afirmar que esta é uma nova proposta de alteração do Código de Processo Penal. É uma nova proposta que, ao contrário da anterior, deixa praticamente intocada a estrutura fundamental do processo penal português vigente. Saliente-se assim, como exemplos significativos, e para manifestar desta vez a minha total concordância:

A redacção proposta para o artigo 43.°, n.os 2 e 4;

A eliminação da alínea que propunha que o juiz de instrução decidisse as questões relativas ao reconhecimento efectivo de direitos processuais dó arguido ou do assistente que se suscitassem no decurso do inquérito (artigo 268.°);

A regulamentação do segredo de justiça, especialmente no que diz respeito aos artigos 86.°, n.** 1, 2 e 4, e que vem em certa medida ao encontro da posição que eu logo defendi na Comissão que elaborou o Projecto donde resultou o Código de 1987, segundo a qual o segredo de justiça poderia terminar logo que o Ministério Público deduzisse acusação;

A recuperação do artigo 209.°;

A estruturação do processo sumário, ao voltar a assentar na detenção em flagrante delito efectuada por uma autoridade judiciária ou entidade policial e ao permitir o adiamento da audiência apenas até ao 30.° dia, à semelhança das regras sobre a continuidade da audiência;

A manutenção do actual regime das nulidades;

A redacção proposta para o n.° 3 do artigo 311.°, que, ao contrariar a jurisprudência já fixada a propósito, acentua os desejáveis traços acusatórios do processo penal português;

As modificações introduzidas em matéria de processos especiais, ao procurarem dar maior efectividade ao mandamento politico-criminal do tratamento processual distinto da pequena e média criminalidade, mandamento que claramente enforma o Código vigente.

Quanto a este último ponto permito-me apenas anotar que o campo de incidência do processo sumaríssimo continua a aparecer, a meus olhos, demasiado restritivo — até por

referência a soluções semelhantes .do direito comparado, nomeadamente do direito processual penal alemão—, ao permitir somente a aplicação de penas de multa (por que não todas as sanções não privativas da liberdade?) e ao excluir do seu âmbito os crimes particulares em sentido estrito. Por outro lado, a opção deveria ser claramente a da notificação ao arguido da sanção proposta, com a necessária possibilidade de oposição e de exercício efectivo do direito de defesa — solução próxima do Strafbefehlsverfahren —, ou a da aceitação ou não da sanção proposta em audiência informal de julgamento (a opção vigente entre nós). E não a

solução contida nos artigos 395°-A e 396°, que prevêem a

audiência na hipótese de o arguido se opor, com a possibilidade de o juiz aplicar uma sanção menos grave do que a proposta pelo Ministério Público; o que para além do mais, me levanta as objecções habitualmente feitas às soluções de «negociação da pena».

Se acima afirmei que a proposta deixa praticamente (e não, em todo o caso, completamente) intocada a actual estrutura fundamental do processo penal português, foi porque ela admite o julgamento na ausência do arguido e o duplo grau de recurso, opções relativamente às quais não valerá a pena certamente que eu repita as reservas que já em análises anteriores manifestei. Mas seja como for, importa reconhecer os méritos das soluções agora propostas, quando comparadas com as anteriormente idealizadas.

Assim, no que respeita ao julgamento de ausentes, devo referir-me positivamente (e trata-se tão-só de dar alguns exemplos) ao momento processual da declaração de contumácia, que continua a ser, como hoje, o da audiência de julgamento; à possibilidade de serem julgados na ausência aqueles que faltam justificadamente à audiência anterior; e à solução de as declarações anteriormente prestadas na audiência realizada na ausência do arguido valerem como declarações para memória futura na nova audiência. E isto afirmo sem prejuízo de eu continuar a pensar que, aceitando--se em certos casos o julgamento de ausentes, então o sistema preferível seria o de o julgar concedendo-lhe todas as possibilidades de defesa mas não aceitando, em caso algum, o novo julgamento.

No que toca à modificação (porque, pelo menos na lei escrita, é de uma verdadeira modificação que se tratará) do sistema de recursos, devo sublinhar positivamente a manutenção das regras sobre a documentação das declarações prestadas oralmente perante o tribunal de julgamento. Declarações que, quando prestadas perante o tribunal colectivo, serão documentadas apenas se o tribunal puder dispor dos meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas, o que na prática vai muito provavelmente significar que raros serão os casos em que haverá duplo grau de recurso. Para mais se se tiver em conta, por um lado, que se recorre directamente para o Supremo Tribunal de Justiça quando se visa exclusivamente o reexame da matéria de direito; e, por outro lado, os casos de irrecorribilidade propostos no artigo 400.° Se for assim, se afinal o duplo grau de recurso for meramente aparente ou, em todo o caso, persistir uma acentuada distonia entre a law in lhe books e a law in action, talvez seja aconselhável reflectir ainda se vale a pena introduzir uma alteração deste tipo, que legitimará sempre a critica do desfasamento entre a lei e os meios disponíveis para a executar.

Exemplos de alterações que claramente contendem com o modelo vigente são já, porém, as propostas para os artigos 194.° e 285.°

A primeira porque, ao permitir ao juiz, durante a fase de inquérito, a realização de inquérito urgente sobre a