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24 DE SETEMBRO DE 1998

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A partir de agora, é necessário assumir que, sem um considerável êxito na luta contra a pobreza e exclusão social, não haverá qualquer ganho em termos de bem-estar social, por muito que o PIB per capita e a eficiência económica global cresçam.

Neste sentido, a pobreza e a exclusão social já não são apenas a negação de um direito social. São o principal obstáculo à obtenção de justiça social, a qual é por seu

turno uma condição necessária do desenvolvimento económico e social.

Por isso, entende-se que o Estado deve assumir um novo papel neste combate. Em primeiro lugar, incrementando os meios financeiros do subsistema de solidariedade social no quadro das prioridades acima referidas. E, em segundo lugar, exigindo continuadamente das entidades prestadoras, públicas ou privadas, maior eficiência e qualidade nos serviços prestados. Isso pressupõe uma vontade continuada de correcção das falhas do Estado e do mercado, numa lógica de contratualização, a levar tão longe quanto possível, em que os serviços públicos e privados não lucrativos deverão concorrer, em condições de igualdade, na captação dos financiamentos públicos afectos à maioria dos regimes de prestações sociais complementares e dos regimes de acção social.

Cabe recordar que, à míngua do subsistema público de protecção social antes de 1974, respondeu a sociedade civil com uma plêiade impressionante de instituições privadas de fins não lucrativos, com destaque para as misericórdias.

É por isso que em Portugal as IPSS (instituições particulares de solidariedade social) estão aptas a realizar uma grande parte dos serviços de apoios sociais, possuindo uma expressão sem paralelo nos demais países europeus.

Baseadas no altruísmo, que se traduz por muitos milhares de horas de trabalho voluntário e gratuito de cidadãos empenhados no serviço às suas comunidades, as IPSS têm demonstrado ser, em muitos casos, o melhor veículo organizacional para prestar os apoios complexos especializados e personalizados que as crianças, os jovens e os idosos das famílias de rendimentos débeis ou as pessoas portadoras de deficiências ou socialmente excluídas necessitam para que o seu processo de reinserção social possa ter êxito.

Em vez de o sector público avançar com a criação de serviços públicos para introduzir novas prestações e só depois e de forma complementar estimular a participação das IPSS e instituições análogas na respectiva produção ou distribuição, de acordo com o conceito da presente lei, a referida ordem de prioridades será inversa.

Deseja-se, pois, um Estado menos produtor e mais con-tratualizador, com um considerável reforço da sua capacidade de supervisão e fiscalização sobre os organismos produtores e distribuidores, públicos e privados, e suas redes funcionais e também com uma acrescida capacidade de acompanhamento e de avaliação da qualidade e eficiência com que tais organismos contribuem para os objectivos da segurança social.

O subsistema de solidariedade social deve também primar pela simplicidade e transparência na arrumação dos seus regimes, o que na presente lei se traduz pela constituição de duas secções.

A primeira engloba os regimes de combate à pobreza, disfunção e exclusão social, cujas prestações são fundamentalmente financeiras.

Aí se inserem, por exemplo, os esforços de correcção extraordinária das pensões débeis. E ainda nela se integra o aparecimento de novas realidades sociais que necessitam de imediato apoio financeiro.

A segunda secção abrange a intensificação da contratualização com as IPSS e entidades análogas, em relação à generalidade dos regimes de acção social, no quadro

dç um esforço de desconcentração e descongestionamento dos serviços centrais e regionais da segurança social e de um maior papel por parte, designadamente, das autarquias.

O papel destas deverá traduzir-se numa descentralização das decisões sobre a aplicabilidade e execução dos regimes de segurança social, numa lógica de subsidiariedade.

Por outro lado, não é possível, por razões financeiras, inscrever na presente lei uma regra definida de aproximação rápida das pensões do regime geral da segurança social ao regime de pensões dos trabalhadores da função pública, o qual é em geral significativamente mais favorável. A uniformização de regimes, que já existe para os trabalhadores da função pública admitidos a partir de 1993, que têm regime idêntico ao do regime geral, deverá fazer-se sem quebra dos direitos adquiridos e em formação, nos termos fixados na presente lei.

O que significa que aqui se consagra, sem margem para equívocos, que a responsabilidade actuarial do Estado respeita à convergência gradual das pensões do regime geral para as pensões do regime dos trabalhadores da função pública, e não o contrário, para correspondentes carreiras contributivas e taxas obrigatórias de descontos.

Para isso a presente lei assegura a todos os actuais trabalhadores no activo que, quaisquer que sejam os regimes previdenciais de segurança social em que estejam inscritos e quaisquer que sejam as suas carreiras contributivas, os seus direitos adquiridos e em formação não se limitam a esses anos já passados.

Pelo contrário, eles permanecem válidos também

no futuro, se entretanto o regime previdencial em que se encontrem vier a ser modificado pelo legislador, assegu-rando-se que, em todo e qualquer momento posterior, incluindo o termo da sua carreira contributiva, o valor da sua pensão nunca poderá ser inferior à expectativa que seria legítimo estabelecer para esse período se continuasse em vigor o regime ao qual se encontravam vinculados.

Cabe, por último, uma nota sobre a fiscalidade.

Nenhuma reforma da segurança social deve ser levada a cabo sem observar os limites das suas implicações orçamentais de curto e longo prazos, nomeadamente em matéria da despesa corrente do Estado e do seu rácio de endividamento.

Mas também nenhuma alteração estrutural nos regimes da segurança social pode em geral dispensar algumas reformas importantes na fiscalidade. No caso português, importará designadamente rever, em sede própria, a actual base de incidência da taxa social única e. prever a sua substituição parcial pelo chamado IVA social ou medidas fiscais análogas, bem como reformular e homogeneizar os incentivos fiscais em vigor para estímulo da poupança de longo prazo.

Em conclusão, considera-se, pois, que é possível hoje proceder ao conjunto de alterações estruturais que a presente lei consagra, mantendo também sob contioio a estabilidade financeira global das contas públicas..