15 DE ABRIL DE 1999
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6 — A desactualização das coimas comidas em muitos diplomas específicos que prevêem contra-ordenações é uma realidade inegável que só pode, contudo, ser resolvida de forma satisfatória com intervenções legislativas específicas. Ao regime geral apenas é possível, nesta matéria, dispor para o futuro, enquadrando as próximas decisões do legislador, e procurar criar soluções que possam compensar a referida desactualização. Neste sentido, foram revistos os valores abstractos das coimas consagrados no artigo 17.° e tornaram-se as sanções acessórias, previstas no artigo 21.", imediatamente aplicáveis, sem necessidade de uma intervenção legislativa autónoma. Por isso também se consagra agora expressamente os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade quanto ao recurso a estas sanções (n.os 3 e 4 do artigo 21.°).
7 — As regras de determinação da sanção aplicável (artigo 18.°) foram pormenorizadas, mantendo-se a distinção entre a graduação da sanção e a ponderação do benefício económico obtido, que pode, em alguns casos, permitir que a sanção se eleve para além do limite máximo legalmente previsto, até um terço desse montante.
8 — Modificações substanciais verificam-se no regime do artigo 19.°, que passa a conter as regras do concurso de contra-ordenações e da infracção continuada. Esta figura passa a ter agora consagração expressa (n.os 4 e 5 do artigo 19.°), embora com pressupostos específicos e bem delimitados, que têm de ser escrupulosamente cumpridos pelos aplicadores do direito.
O regime de concurso de infracções mantém a solução do cúmulo jurídico apenas para os casos de concurso ideal, isto é, em que um facto preenche várias contra-ordenações (artigo 19°, n.° 1). Nas situações de concurso real, isto é, em que uma pluralidade de factos realiza diversas contra-ordenações, segue-se a regra, já constante de alguma legislação especial, do cúmulo material, que pode conduzir a uma coima única, que corresponde à soma das diversas coimas concretas (artigo 19.°, n.°2). Cúmulo material, em rigor, só haverá se as diversas infracções forem objecto de um único processo, caso em que não se pode exceder o triplo do limite máximo da coima mais elevada (artigo 19.°, n.os 2 e 3). Para este efeito, adquirem ainda relevância as regras de conexão obrigatória de processos (artigo 36.°-A), já que só nestes casos funciona o limite máximo referido.
A reformulação das regras do concurso de cqntra-orde-nações constituiu ainda um pretexto para se resolverem problemas de distribuição de competência das autoridades administrativas que não tinham obtido resposta na revisão de 1995, apesar de se ter então acolhido para todos os casos o regime do cúmulo jurídico. Optou-se por seguir uma regra de autonomia da competência material (artigo 36.°, n.° 1), com regras de conexão facultativa para efeito da decisão de cúmulo jurídico em caso de concurso ideal (artigo 36.°, n.1* 2, 3 e 4) e de separação de processos em caso de concurso real (artigo 36.°, n.° 5).
9 — Os prazos de prescrição constantes do artigo 27.° estavam manifestamente desactualizados em relação à complexidade de muitas infracções que, desde a década de 90, foram qualificadas como contra-ordenações e aos factores dilatórios que, por diversas razões, foram surgindo no processamento das contra-ordenações. Acresce ainda a estes factos as dúvidas que foram surgindo sobre a existência ou não de prazos máximos de prescrição do procedimento, que têm originado jurisprudência contraditória. Optou-se, assim, por reformular os prazos de prescrição e introduzir expressamente no regime geral regras novas sobre a contagem do prazo, a suspensão, a interrupção e os limites máximos des-
ses prazos. Com a nova regulamentação da prescrição pretende-se acolher regras adequadas ao processamento das contra-ordenações em função da sua possível complexidade e pôr fim à incerteza actualmente reinante.
10 — A comunicação das decisões (artigo 46.°) faz-se agora nos termos do Código de Processo Penal, objecto de alteração em 1998, por se afigurar o mais adequado, estabelecendo-se, contudo, regras específicas sobre a notificação de pessoas colectivas e equiparadas, em virtude de a sua presença no processo de contra-ordenação ter uma frequência que não se verifica no processo penal.
11 — A contagem dos prazos (artigo 47.°-A) passa a ser feita nos termos previstos no Código de Processo Civil, isto é, de forma continuada e sem suspensões, excepto na fase judicial de impugnação ou recurso, onde, apesar de o mesmo se contar de forma continuada, se suspende, mesmo quando coincida com o período das férias judiciais.
12 — A revisão de 1995 revogou os n.os 2 e 3 da versão inicial do artigo 49.°, que permitia a detenção para identificação, a que corresponde agora o artigo 50.°, por se terem suscitado dúvidas quanto à respectiva constitucionalidade. Trata-se, contudo, de um instrumento necessário e de grande importância na acção policial, que ficou seriamente prejudicado na sua capacidade de intervenção, por nãó poder identificar o autor de uma contra-ordenação verificada em flagrante delito.
A alteração ao artigo 27.° da Constituição, pela revisão de 1997, afastou, porém, as dúvidas de natureza constitucional que se colocavam, pelo que se introduz uma norma expressa permitindo o recurso ao regime previsto no artigo 250.° do Código de Processo Penal, revisto em 1998, para identificação de agentes de contra-ordenações.
13 — As alterações ao artigo 52.°, que tem por objecto o direito de audição e de defesa, clarificam e regulamentam as respectivas formas de efectivação, generalizadas noutros diplomas, conferindo, por esta via, melhor expressão processual a um instituto fundamental do regime das contra-ordenações, de modo a obter-se a suficiente definição prévia do objecto do processo e uma melhor garantia do direito de defesa.
14 — A alteração mais importante no artigo 57.° traduz--se no afastamento da regra, consagrada em 1995, que passou a proibir a reformotio in pejus em qualquer fase da impugnação ou recurso judicial.
Esta proibição é completamente estranha à estrutura e aos valores do processo de contra-ordenação e à natureza da impugnação judicial e do recurso da decisão do tribunal de 1 .* instância.
Os efeitos da proibição genérica da reformatio in pejus revelaram-se nocivos para a actividade processual das autoridades administrativas com competências contra-ordenacionais e para a prática judicial, banalizando o direito ao recurso, independentemente do fundamento, tornando-o em muitos casos uma forma compensadora de adiar a execução das sanções.
Torna-se, assim, fundamental, restaurar o regime anterior à reforma de 1995, limitando agora a proibição da reformatio in pejus aos casos previsto no artigo 75.°-A do regime geral.
15 — O regime das nulidades da decisão administrativa tem constituído um dos factores fundamentais do bloqueamento do sistema vigente, sendo frequente a devolução dos processos pelos tribunais às autoridades administrativas com base na invocação de nulidades, muitas vezes deduzidas da aplicação do regime de nulidades do processo penal, que se invoca, sem se aferir previamente da colisão com os princípios fundamentais do direito das contra-ordenações.