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0819 | II Série A - Número 027 | 03 de Outubro de 2002

 

do circuito clandestino, da marginalidade e das práticas de risco no consumo das substâncias em causa.
Prevenção e articulação dos serviços de saúde:
Uma aposta séria na prevenção, em particular dirigida à juventude, sem moralismos mas com informação acerca dos efeitos de cada substância para a saúde, deve estar no centro desta nova política, nomeadamente aproveitando os recursos e verbas transferidas do aparelho repressivo e do sistema prisional. Neste sentido, subscrevemos a análise feita no relatório da Comissão de Estratégia de Combate à Droga:
"Exige-se uma alteração radical da política de informação relativamente às drogas. A informação deve evitar dois perigos em que frequentemente tem incorrido: o da banalização e o da diabolização. A desvalorização dos riscos que os consumos pressupõem aparece de braço dado com a insistência numa informação desadequada ao contexto e à população-alvo, logo sem credibilidade (ex. cartaz dizendo "defende-te, a droga mata", numa atmosfera de belicismo inconsequente, ou campanhas em tudo semelhantes ao já famoso Just say no, tão do agrado de alguns elementos influentes da sociedade americana). A culpabilização e discriminação sistemática dos toxicodependentes fazem-nos deslizar do estatuto de cidadãos com deveres, direitos e um problema grave a resolver para o de "objectos-problema", cujo afastamento da "parte sã" da sociedade passa a ser um imperativo na tentativa de impedir o "contágio"."
Da mesma forma, é necessária uma maior disponibilidade financeira para os tratamentos de recuperação, sobretudo dos toxicómanos dependentes de heroína e de cocaína. Libertam-se assim as energias para tratamentos mais demorados de pelo menos um ano. A lógica central deste "núcleo duro" do tratamento seriam as comunidades terapêuticas de médio e longo curso - seis meses a um ano - e não como agora as consultas avulsas.
À lógica das desintoxicações-recaídas repetidas opomos o argumento do tratamento mais consequente para os heroinómanos em programas prolongados, com equipas integradas e multidisciplinares, com valências médicas, psicológicas, psicoterapêuticas, sócio-terapêuticas, familiares e comunitárias.
Este sistema só será adequado se for realizado em locais próprios, ligados às estruturas de saúde. O modelo mais adequado deve preservar o que já existe, sem no entanto "invadir" os centros de tratamento com a prescrição de drogas legais ou substitutas, como a metadona.
No caso da distribuição da metadona é importante que o circuito a definir não seja misturado com a actividade dos centros de tratamento. Devem ser criadas estruturas intermédias fora dos Centros de Atendimento a Toxicodependentes (CAT), por exemplo sediados em hospitais públicos ou em locais próprios onde exista um registo informatizado dos utentes - de forma a evitar dosagens repetidas - e elaboração de análises toxicológicas prévias - para evitar overdoses por acumulação com outros opiáceos. Estes centros podem albergar outros programas de substituição para além da metadona e devem ser alargados desde já ao meio prisional, a par da prometida e esquecida proposta de distribuição de seringas no interior das cadeias.
Da mesma forma, as estruturas a criar para efeito de disponibilização de heroína para toxicodependentes devem obedecer às mesmas regras - com registo informatizado e sob vigilância médica, e separadas dos CAT, dos locais de distribuição de metadona e de quaisquer outras soluções que tenham como objectivo o tratamento dos toxicodependentes.
Algumas destas estruturas podem ainda exercer funções de supervisão das chamadas "casas de xuto", que devem ser instaladas desde já nos locais de consumo público, como foi até há pouco o Casal Ventoso. Estas "casas de xuto", instaladas por iniciativa pública e sob controlo médico, permitem prevenir os riscos da actual ilegalidade inerente ao tráfico, que não garante a segurança do consumidor nem a qualidade ou composição da substância a ingerir. Estes locais asseguram condições de higiene, nomeadamente através da distribuição de kits com os materiais necessários ao consumo que existe hoje em dia à vista de todos os que vivem ou passam pelas zonas e bairros de consumo.
Outro exemplo é o de a introdução do plano de troca de seringas nas prisões - há vários anos em curso em várias cadeias do vizinho Estado espanhol, sem que a segurança dos guardas tivesse sido posta em causa por isso. Já em Abril de 1999 dizia o então Provedor de Justiça, Meneres Pimentel:
"Entendo que, sem prejuízo do combate à entrada e circulação de droga nas prisões, e tendo presente os números de toxicodependentes e da incidência de doenças infecciosas nas prisões, a par de um juízo de prognose quanto à sua evolução, se deveria proceder à realização de estudos sobre a criação, nos estabelecimentos prisionais, de instalações próprias para a administração pelos reclusos toxicodependentes de droga por via endovenosa, dispondo de material esterilizado e de assistência médica adequada, com sistema de recepção de seringa à entrada do compartimento contra a sua devolução à saída, tendo em vista a redução dos riscos, actualmente alarmantes, de infecção em meio prisional resultante da partilha de seringas." (30 de Abril de 1999, intervenção no IX.º Colóquio sobre "Atitudes, Comportamentos e Toxicodependência", promovido pelo PROSALIS).
No mesmo sentido, o Bloco de Esquerda defende a importância da criação de salas de injecção assistida nas prisões, a serem criadas com as necessárias medidas de segurança.
A criação e desenvolvimento de centros de tratamento livres de drogas devem ser outra das prioridades do sistema. Nestes centros, que podem coincidir com os actuais CAT, os toxicodependentes podem atravessar uma fase de desintoxicação com uso de medicamentos, seguindo-se uma outra fase com uso de antagonistas opiáceos e, em complemento ou alternativa, a psicoterapia. Para além destes centros é igualmente urgente alargar a rede de comunidades terapêuticas estatais que recorram predominantemente ao uso da psicoterapia. Pela simples razão de que hoje em dia não existe essa rede - funcionam apenas duas comunidades terapêuticas do Estado português, com 40 camas no total -, trata-se de uma reivindicação básica para que o tratamento seja encarado como uma prioridade.
Outro problema decisivo é a incidência da toxicodependência na geração de comportamentos criminosos. Actualmente, mais de dois terços da população prisional está condenada por pequenos crimes associados aos preços inflacionados das drogas ilegais. Ao encaminhar o toxicodependente para programas de acompanhamento com prescrição