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0822 | II Série A - Número 027 | 03 de Outubro de 2002

 

do índice de preços. Esta exclusão permite agir sobre a oferta e a procura sem outros constrangimentos que não sejam os dos imperativos sanitários. Do lado da oferta, uma política de venda a preços controlados permite eliminar os traficantes do mercado lícito. Do lado da procura, a fixação dos preços permite orientar os consumidores para os produtos menos nocivos. É, contudo, claro que esta separação de mercado não vem resolver magicamente o problema da toxicodependência, na medida em que não fornece soluções aplicáveis ao consumidor abusivo. São por isso necessários princípios complementares de prevenção e de reparação dos custos sociais mesmo no que diz respeito ao abuso do consumo de derivados da cannabis. Estes princípios baseiam-se na tributação do custo social da droga.
Finalmente, esta política permite uma melhor informação aos consumidores sobre a nocividade e o risco das dependências, porque os abrange na actividade socialmente explícita que é o consumo legal.
Esta política é sustentada pelos estudos científicos que estão disponíveis. Em 11 de Novembro de 1995 a revista The Lancet, já atrás citada, tinha publicado um editorial em que afirmava que, face aos estudos realizados, "O consumo de cannabis, mesmo no longo prazo, não é prejudicial à saúde". Três anos mais tarde, reavaliando a tempestade de debates provocados por esta afirmação, a mesma revista voltava a publicar um editorial em que analisava os resultados de um seminário sobre os efeitos de cannabis na saúde pública. Os médicos e cientistas reunidos nesse seminário estudaram efeitos da ingestão de derivados da cannabis, como a irritação dos brônquios, ou avaliaram o risco de acidentes em resultado da intoxicação, discutindo ainda a dependência e possível afecção das capacidades cognitivas com o uso intenso a longo prazo. Estas provas estavam, ao tempo, a ser consideradas por uma Comissão da Câmara dos Lordes, para efeitos de uma recomendação de realização de novas experiências clínicas de aplicação de drogas leves nos casos de esclerose múltipla e dor crónica. A comissão aprovou então a recomendação da reclassificação da cannabis para que pudesse ser eventualmente prescrita pelos médicos.
O editorial desta revista argumentou então, face a tal evidência científica, que, "De acordo com a evidência científica resumida por Hall e Solowij, será razoável considerar a cannabis como menos ameaçadora para a saúde do que o tabaco e o álcool, produtos que em muitos países são não só tolerados e publicitados mas que são também uma fonte útil de rendimentos fiscais. O desejo de tomar substâncias que alteram o comportamento é uma característica duradoura das sociedades humanas em todo o mundo, e mesmo a legislação mais draconiana não conseguiu extinguir esse desejo - porque por cada substância banida será descoberta uma outra, e é provável que todas tenham algum efeito nocivo na saúde. Isto deveria ser considerado pelos legisladores sociais que, condenando as indulgências de outras pessoas, as procuram ilegalizar. Ora essa legislação não se livra do problema, só o transfere para outro lado. (...) Qualificaremos a nossa opinião de há três anos atrás e diremos que, segundo a evidência médica disponível, o uso moderado de cannabis tem escassos efeitos prejudiciais para a saúde, e que as decisões sobre a legalização ou proibição da cannabis deveriam basear-se noutro tipo de considerações" (editorial de 14 Novembro de 1998).
É de assinalar igualmente que em outros países o uso medicinal da cannabis está definido e regulamentado. A 17 de Março de 1999 o Instituto de Medicina dos Estados Unidos apresentou um relatório declarando que a marijuana tem efeitos benéficos para os doentes terminais, em conclusão de um estudo pedido pelo Office of National Drug Control Policy da Casa Branca. Em seis Estados dos EUA, o uso médico de marijuana é autorizado por decisão de referendos. Em 23 Dezembro de 2000, o governo holandês criou uma instituição nacional para determinar o uso médico da cannabis e para estudar o seu efeito terapêutico, instituição que autorizará e coordenará a produção e terá o monopólio da importação e exportação. O Governo do Canadá autorizou entretanto o aumento do número de pacientes que usam cannabis, por exemplo para o controlo da epilepsia, estando a desenvolver um estudo em comunidades de pessoas infectadas por HIV. O Supremo Tribunal de Ontário, em 30 de Agosto de 2000, tinha decidido que o governo devia clarificar as regras sobre drogas, de modo a permitir o uso terapêutico.
A partir desta evolução dos conhecimentos médicos e do sentido de responsabilidade social, consideramos que a legalização do consumo dos derivados da cannabis é a melhor solução para a saúde pública, e que a sua repressão é a pior, facilitando a estratégia dos narcotraficantes.

III - Concretizar uma estratégia de prevenção e tratamento

O relatório da Comissão para a Estratégia Nacional de Combate à Droga representou um avanço no sentido da sistematização de propostas, reunindo técnicos e especialistas num debate aberto e plural. Este projecto de lei desenvolve o Plano Estratégico ali proposto, e sublinha a sua urgência, defendendo o Bloco de Esquerda como medidas complementares de uma estratégia de prevenção e tratamento, nomeadamente:
- A criação de gabinetes de apoio e centros de abrigo a partir de autarquias e ONG, subsidiadas para tal efeito pelo Estado. Preferencialmente devem articular-se com equipas de rua que desenvolvam trabalho nos bairros de tráfico e junto de toxicodependentes sem abrigo, "arrumadores" e prostitutas/os, com a finalidade de promoverem comportamentos de redução de danos (uso de preservativo, troca de seringas, rastreio de doenças infecto-contagiosas, cuidados sanitários, manutenção de hábitos de higiene, etc.);
- A revisão do actual programa de troca de seringas, procurando identificar as lacunas a nível da cobertura do território e respectivas causas, dando-lhe novo fôlego e, quando necessário, estabelecendo esquemas de troca alternativos - nas estruturas de saúde, nas ONG e com distribuidores automáticos, de forma a que, em todo o país, haja locais de troca acessíveis;
- A implementação nas prisões de uma política de redução de danos que inclua um rastreio sistemático das doenças infecciosas à entrada e periodicamente, o fornecimento de preservativos e a existência de alas livres de drogas. Neste capítulo, pronunciamo-nos tal como vários membros da Comissão pela implementação do programa de troca de seringas no interior dos estabelecimentos prisionais bem como de criação, com as devidas medidas de segurança, de salas de injecção assistida;
- Aperfeiçoar a política informativa, tornando-a mais rigorosa e específica, nomeadamente publicando