0020 | II Série A - Número 110S | 04 de Julho de 2003
mínima do tratamento dos trabalhadores da mesma profissão ou de profissão análoga e/ou do mesmo âmbito sectorial e profissional, e, sobretudo, considerando que ao prever a sua emissão o legislador está ainda a regular a eficácia, através do alargamento do seu âmbito pessoal, das normas constantes de convenções colectivas de trabalho, como lhe é consentido pelo n.º 4 do artigo 56.º da CRP, entende se que a norma do artigo 4.º, n.º 2, do Código do Trabalho, na parte em que se refere a regulamentos de extensão, não padece de inconstitucionalidade.
Quanto aos regulamentos de condições mínimas, importa distinguir quatro categorias de normas do Código do Trabalho: (i) normas absolutamente imperativas, que não consentem qualquer derrogação, seja in melius, seja in pejus (exemplos: artigos 210.º e 383.º, n.º 1, primeira parte); (ii) normas parcialmente imperativas, que consentem derrogação apenas num desses sentidos (in melius: artigo 110.º; in pejus: artigos 167.º, n.º 2, e 369.º, n.º 1); (iii) normas "dispositivas", que consentem derrogações em ambos os sentidos (exemplos: artigos 66.º, n.º 2, 194.º, n.º 1, 314.º, n.º 2, 315.º, n.º 3, 316.º, n.º 2, e 383.º, n.º 2); e (iv) normas supletivas, em que a norma do Código só actua se não houver regulação por instrumento colectivo ou pelo contrato individual de trabalho (exemplos: artigos 166.º, n.º 1, 178.º, n.º 2, 184.º, n.º 3, 256.º, n.ºs 2 e 3, e 268.º, n.º 1).
A questão da eventual violação do disposto no n.º 6 do artigo 112.º da CRP só se coloca relativamente às normas do Código das segunda e terceira categorias, que procederam, de modo imediatamente operativo, à regulação de certas matérias. A possibilidade, por força do impugnado artigo 4.º, n.º 1, de essas normas, dotadas de incondicionada eficácia, serem afastadas por actos não legislativos é que coloca um problema de conformidade com a estatuição daquele preceito constitucional. Já não assim quanto às normas supletivas, em que o Código entende que a matéria deve ser regulada, em primeira linha, por instrumentos de regulamentação colectiva e só para a hipótese de estes instrumentos nada regularem é que estabelece o regime aplicável. Nesta hipótese, a operatividade da norma legal está dependente da verificação de uma condição, pelo que não chegou a constituir se o "congelamento do grau hierárquico" da lei reguladora da matéria, que está na base da estatuição do n.º 6 do artigo 112.º.
Posto isto, a argumentação desenvolvida a propósito da conformidade constitucional dos regulamentos de extensão não se pode estender aos regulamentos de condições mínimas, que têm carácter normativo inovatório e não se ligam a nenhum instrumento de regulamentação colectiva negocial anterior. Ao prever que as normas não absolutamente imperativas nem supletivas (no sentido acabado de assinalar) do Código (que é um acto legislativo) possam ser afastadas por regulamentos de condições mínimas (que são actos de natureza não legislativa), o questionado artigo 4.º, n.º 1, viola irremissivelmente o disposto no artigo 112.º, n.º 6, da CRP.
E) Inconstitucionalidade da norma constante da segunda parte do artigo 606.º do Código do Trabalho, que prevê a consagração nas convenções colectivas de "cláusulas de paz social relativa".
22. Dispõe o artigo 606.º do Código em causa - inserido no Capítulo II (Greve) do Subtítulo III (Conflitos colectivos) do Título III (Direito colectivo) do Livro I (Parte geral) -, sob a epígrafe "Contratação colectiva":
"Para além das matérias referidas no n.º 1 do artigo 599.º, pode a contratação colectiva estabelecer normas especiais relativas a procedimentos de resolução dos conflitos susceptíveis de determinar o recurso à greve, assim como limitações, durante a vigência do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, à declaração de greve por parte dos sindicatos outorgantes por motivos relacionados com o conteúdo dessa convenção."
Este preceito corresponde ao artigo 615.º do Anteprojecto e ao artigo 592.º da Proposta de Lei, com meros ajustamentos de redacção.
O n.º 1 do artigo 599.º estipula que os serviços mínimos previstos nos n.ºs 1 e 3 do artigo anterior - serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades sociais impreteríveis e serviços necessários à segurança e manutenção do equipamento e instalações - devem ser definidos por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou por acordo com os representantes dos trabalhadores.
23. Para o requerente, a segunda parte deste preceito, permitindo o estabelecimento, na contratação colectiva, de "limitações, durante a vigência do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, à declaração de greve por parte dos sindicatos outorgantes por motivos relacionados com o conteúdo dessa convenção", "suscita a controversa questão da possibilidade de renúncia ou, mais propriamente, de disposição do direito à declaração de greve por parte dos sindicatos outorgantes", prosseguindo:
"Sendo o direito à greve um direito, liberdade ou garantia dos trabalhadores consagrado no artigo 57.º da Constituição, é, pelo menos, constitucionalmente duvidoso se podem os sindicatos vincular-se juridicamente a aceitar as limitações convencionalmente acordadas, renunciando ou dispondo do direito de declarar a greve de que são legalmente titulares. É que, sendo a declaração sindical da greve um pressuposto da possibilidade de exercício do direito à greve por parte dos trabalhadores, a renúncia ou disposição, mesmo que temporária, parcelar ou condicionada, do direito de declarar a greve por parte dos sindicatos priva os trabalhadores, nos exactos termos e condições daquela renúncia, do exercício do seu direito constitucional à greve.
Assim, a segunda parte do artigo 606.º pode constituir uma violação do direito à greve consagrado no artigo 57.º da Constituição."
24. A norma ora em apreço não tem correspondência na legislação actualmente vigente.
O n.º 1 do artigo 5.º do Decreto Lei n.º 392/74, de 27 de Agosto, considerava ilícita a greve que tivesse como objectivo a modificação de contratos e acordos colectivos de trabalho, antes de expirado o seu prazo de vigência. O Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, no parecer n.º 123/76 B, considerando que o artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa, entretanto entrada em vigor, atribuíra aos trabalhadores competência para "definir o âmbito dos interesses a defender através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito", concluiu que aquele artigo 5.º do diploma de 1974 devia ter se por revogado (ponto 11