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0047 | II Série A - Número 110S | 04 de Julho de 2003

 

ao artigo 112.º, n.º 6, da Constituição, na medida em que constituem um direito dos trabalhadores, não podendo, por isso, derrogar direitos que a lei lhes confere. Por conseguinte, só posso concluir, por maioria de razão, que os regulamentos administrativos também não podem derrogar regimes legais mais favoráveis, uma vez que a sua justificação ante o artigo 112.º, n.º 6, é assegurarem a efectividade do direito à contratação colectiva.
Foi pelas razões enunciadas que votei vencida parcialmente a alínea f) da decisão, no que se refere às portarias de extensão, e no sentido de uma mais ampla inconstitucionalidade quanto à alínea g) da decisão, no que respeita aos regulamentos de condições mínimas (os quais também são, em meu entender, inconstitucionais quando estabeleçam um tratamento menos favorável para o trabalhador do que o decorrente das chamadas normas legais supletivas - dito de outro modo, não aceito a existência de normas legais supletivas nessa hipótese, mas antes, em rigor, de normas que apenas podem ser derrogadas um sentido mais favorável para o trabalhador).
6. Quanto à alínea i) da decisão, votei igualmente vencida porque entendo que a caducidade das convenções colectivas de trabalho prevista pelo artigo 557.º, n.ºs 2, 3 e 4 do "Código do Trabalho", permite um vazio de regulamentação que atinge sobretudo as medidas protectoras dos trabalhadores e desequilibra a posição destes perante os empregadores na negociação de convenções de trabalho.
Na verdade, os trabalhadores são constrangidos a negociar novas convenções e a aceitar, eventualmente, cláusulas menos favoráveis, na medida em que se perfila como alternativa a caducidade das convenções anteriores e um eventual vazio de regulamentação ou as condições mínimas previstas na lei.
Por outro lado, creio que é contraditório invocar a autonomia privada para pôr fim a um princípio com a relevância do favor laboratoris e, simultaneamente, desconsiderar aquela autonomia e não admitir sequer que as partes que negoceiam uma convenção colectiva de trabalho pretendam fazê la valer por um período alargado de anos ou mesmo sem limitação temporal.
O sentido do direito à contratação colectiva como direito fundamental fica, assim, desvirtuado, operando se uma mutação funcional de conceitos valorativos que pressupõe, aqui como no ponto anterior, uma revisão pela lei ordinária da "Constituição laboral".
7. Quanto à alínea d) da decisão, concordando, no essencial, com as razões aduzidas pelo Conselheiro Mário Torres na sua declaração de voto, direi simplesmente que o artigo 438.º, n.ºs 2, 3 e 4, do "Código do Trabalho", ao admitir a não reintegração do trabalhador de microempresa ou que ocupe cargo de administração ou direcção despedido sem justa causa (ainda que compita ao Tribunal apreciar se o regresso do trabalhador é gravemente prejudicial e perturbador para a prossecução da actividade empresarial), viola a proibição de despedimentos sem justa causa em conjugação com o direito à segurança no emprego (artigo 53.º da Constituição).
Se é verdade que a Constituição, ao proibir os despedimentos sem justa causa, não diz explicitamente que a consequência da sua ilicitude é a reintegração do trabalhador e não apenas a indemnização, também é certo que nunca autoriza ou admite o despedimento sem justa causa. Deste modo, a restrição do direito à reparação integral dos danos (através de uma "reconstituição natural") constitui uma restrição de um direito - o direito à segurança no emprego - que não é prevista ou autorizada pela própria Constituição nem assenta numa ponderação de valores constitucionalmente fundada.
A invocação da protecção da prossecução da actividade empresarial é, para além disso, uma fórmula vaga e indeterminada, que não permite distinguir as razões objectivas da sua fundamentação nem demonstra que princípios de justiça elementares num Estado de Direito, instrumentais da realização de direitos de personalidade (quer se tenha uma visão comunitária quer se tenha uma visão contratual da relação juslaboral), não são sacrificados por razões de ordem económica ou em nome do interesse colectivo.
O primado da protecção da pessoa sobre valores importantes, mas ainda instrumentais, como a produtividade ou o interesse da empresa, é corolário de um "núcleo moral mínimo" que, com fontes inspiradoras plurais, tais como o pensamento político da social democracia e do socialismo democrático ou a doutrina social da Igreja, constitui o ponto de equilíbrio (o "consenso por sobreposição" das sociedades liberais democráticas, na perspectiva de Rawls) da Constituição Portuguesa - exprime, enfim, a sua tradição "humanista", a tradição que não precisa de estar escrita na Constituição para se poder dizer que nela está inscrita.
Aliás, a jurisprudência do Tribunal Constitucional evidencia esta linha de orientação, ao rejeitar expressivamente "a funcionalização do trabalhador aos interesses da empresa" (Acórdão n.º 581/95, na linha do Acórdão n.º 107/88) e ao admitir apenas em situações expressamente qualificáveis de impossibilidade objectiva da manutenção do vínculo laboral a cessação daquele vínculo.
O caso em análise está, porém, marcado pela sua génese - o despedimento ilícito - e não por uma circunstância objectiva que origine prejuízo para a prossecução da actividade empresarial. O trabalhador não pode, por isso, ser considerado "causa" de tal prejuízo. Causa será, necessariamente, a ruptura causada pelo despedimento ilícito.
Também os casos de contratos especiais citados no Acórdão, como exemplos de direito ordinário, não são comparáveis. No contrato de serviço doméstico, há uma ponderação de valores diversa que justifica a não reintegração, por estar em causa a inserção do trabalhador num ambiente familiar em que a protecção da privacidade colide com o direito à segurança no emprego. No caso do contrato desportivo, em que todavia se prevê o direito à reintegração, a hipotética flexibilização de tal direito ainda poderá ser justificada, para quem invoca esse exemplo, pela natureza de tal contrato, no qual a segurança no emprego é compensada por outras características. E o contrato desportivo não pode ser o paradigma do contrato de trabalho dos trabalhadores das microempresas ou do contrato de trabalho dos administradores e directores de empresa.
A situação que analisámos é, assim, pela sua génese e natureza, essencialmente idêntica à considerada no Acórdão n.º 107/88 e diversa da do Acórdão n.º 581/95 (ambos citados no presente Acórdão) ou dos casos concretos de contratos especiais referidos, configurando se, assim, como uma objectiva rejeição da anterior jurisprudência.
A atribuição aos tribunais da possibilidade de atender aos fundamentos do empregador para a não reintegração do trabalhador, em nome do interesse da empresa,