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0665 | II Série A - Número 019 | 06 de Dezembro de 2003

 

Com efeito, inclusive por razões que se prendem com as dificuldades ocorridas aquando da aprovação do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, é imperativo recolocar nesta sede as questões já suscitadas no passado pela Assembleia da República e pelo Sr. Presidente da República quanto às normas contidas na referida disposição legal, uma vez que as iniciativas legislativa vertentes, maxime o projecto de lei n.º 362/IX, reproduzem as mesmas.
Na prática, importa aferir se as matérias constantes das iniciativas legislativas em apreço integram ou não o conceito legal de matérias de negociação colectiva, dado que a verificar-se tal, forçoso será concluir que as mesmas enfermam de ilegalidade e de inconstitucionalidade.
O n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa veio reconhecer às associações sindicais o direito de contratação colectiva, o qual é assegurado e densificado nos termos da lei.
O direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública sujeitos ao contrato individual de trabalho encontra-se regulado no Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro. Já o exercício do direito de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, encontra-se vertido na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Os n.os 1 e 2 do artigo 5.º do citado diploma legal consagram expressamente o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública, relativamente ao seu estatuto, sendo que o interlocutor pela Administração é o Governo, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 14.º. O referido diploma, consagra de forma taxativa as matérias objecto de negociação colectiva, definindo como tal, nomeadamente nos termos da alínea b) do artigo 6.º, as matérias relativas à fixação ou alteração "das pensões de aposentação ou de reforma".
A negociação colectiva deve iniciar-se, nos termos do artigo 7.º, a partir de 1 de Setembro de modo a poder estar concluída tendencialmente antes da votação final global da proposta de Orçamento do Estado, cabendo ao Governo tomar a decisão que entender adequada, caso não tenha sido obtido qualquer acordo, n.º 5 do artigo 9.º.
Ora, uma vez que as normas constantes dos projectos de lei sub judice versam sobre a fixação e/ou a alteração do método do cálculo das pensões de aposentação dos trabalhadores da Administração Pública, levando à modificação do montante das pensões, parece ser forçoso concluir que integram o conceito de matérias de negociação colectiva, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.
Neste contexto, tais matérias têm obrigatoriamente que ser objecto de negociação colectiva a exercer entre o Governo e as associações sindicais. Ora, não tendo ocorrido tal negociação e dado que a Assembleia da República não dispõe de mecanismos jurídicos que lhe permitam, em nome da Administração Pública ou do Governo, exercer a negociação colectiva em falta, entende-se que, salvo melhor opinião, as iniciativas legislativas em apreço enfermam de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação de normas e princípios legais e constitucionais que garantem o direito de negociação colectiva às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
A aprovação tout court das iniciativas legislativas em questão poria em crise as normas contidas no n.º 3 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa e na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, diploma legal que assume um valor reforçado.
Aliás, tal entendimento foi já avançado pelo Sr. Presidente da República no requerimento que enviou ao Tribunal Constitucional para a apreciação e declaração de inconstitucionalidade das normas contidas nos n.os 1 a 8 do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro.
Como desenvolvidamente refere o Acórdão n.º 360/2003, do Tribunal Constitucional, o Sr. Presidente da República, a propósito das alterações ao Estatuto da Aposentação constantes do artigo 9.º da Lei do Orçamento do Estado para 2003 (as mesmas a que se refere o projecto de lei n.º 362/IX), suscitou dúvidas de (in)constitucionalidade e de (i)legalidade, nos seguintes termos, sublinhando-se as passagens mais importantes:

"a) Segundo o artigo 56.º, n.º 3, da Constituição, compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.
No que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, é a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, que procede à densificação daquele direito de contratação colectiva, designadamente no seu artigo 6.º, alínea b), que são objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou alteração das pensões de aposentação ou de reforma.
Por sua vez, no que se refere aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito privado, o direito de negociação colectiva rege-se pela legislação geral referente à regulamentação colectiva das relações de trabalho;
b) Ora, uma vez que as normas constantes do artigo 9.º, n.os 1, 2, 4 e 5, da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, fixam ou modificam substancialmente o método de cálculo e, consequentemente, o montante das pensões de aposentação, elas deveriam ter sido objecto de prévia negociação colectiva entre o Governo e as associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública.
c) Não tendo ocorrido essa negociação colectiva antes da aprovação da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, as normas referidas enfermam de inconstitucionalidade por violação do direito de contratação colectiva das associações sindicais, consagrado no artigo 56.º, n.º 3, da Constituição.
(…)
l) Nestes termos, a inobservância dos procedimentos que, na Lei n.º 23/98, de 26 de Maio, regulam a produção de outros actos legislativos configura-se como inconstitucionalidade por violação indirecta dos artigos 2.º e 112.º, n.º 3, da Constituição, mas, como se infere do disposto no artigo 280.º, n.º 2, alínea a), e do disposto no artigo 281.º, n.º 1, alínea b), também se configura como vício autónomo de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.
m) Não tendo ocorrido, nos termos legalmente previstos, a negociação colectiva e a audição prévia das associações sindicais para efeitos de alteração das normas referentes às pensões e ao regime e Estatuto da Aposentação, as normas constantes do artigo 9.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, na parte em que se referem aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, enfermam de ilegalidade por violação dos artigos 6.º, alínea b), 7.º, 10.º, n.º 1, alínea d), e 9.º e 14.º da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio".

No Acórdão n.º 360/2003 que proferiu, o Tribunal Constitucional não respondeu àquelas questões, considerando que não valia a pena fazê-lo uma vez que concluiu previamente