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0025 | II Série A - Número 080 | 26 de Janeiro de 2006

 

Magistratura, de 4 de Janeiro de 2006: "(…) é um dado de facto que, na prática do dia a dia, existem já critérios e prioridades na perseguição penal, resultantes desde logo da circunstância de os processos não serem despachados rigorosamente pela ordem em que entram nos tribunais, ou nos gabinetes dos magistrados.
E concedendo não ser exigível que assim seja, face ao princípio da legalidade, entende que deve haver regras claras e transparentes, que não deixem inteiramente à decisão individual a hierarquia temporal da perseguição penal.
Essa aleatoriedade que se verifica na acção dos magistrados, ocorre também com a intervenção dos órgãos de polícia criminal que, na prática, exercitam uma espécie de oportunidade de bolso."
Em conclusão, esta iniciativa representa um esforço no sentido da concretização de um princípio constitucional e de reforço da transparência na definição de critérios de afectação de meios à investigação criminal, implicando uma simultânea corresponsabilização do poder político.

3 - Da forma
3.1. Resolução/Lei
Uma das questões mais debatidas a propósito desta iniciativa residiu na forma a revestir pelo instrumento que deverá proceder à aprovação, com uma periodicidade bianual, das prioridades de política criminal: resolução ou lei, sendo certo que existem argumentos favoráveis às duas hipóteses conforme se passa a explicar.
Conforme se referiu atrás, a proposta de diploma em análise propõe a forma de resolução para a definição dos objectivos, prioridades e orientações de política criminal.
Esta opção parece encontrar justificação no carácter temporário (bianual) destas resoluções, mais facilmente compaginável com uma resolução do que com uma lei em sentido formal e ainda que no quadro do desenvolvimento de uma lei-quadro.
A resolução, constitucionalmente consagrada no actual artigo 166.º, n.º 5, surge como uma forma de algum modo atípica e residual, servindo para todos os actos da Assembleia da República para os quais a própria CRP não prescreva uma outra forma específica. As resoluções não estão sujeitas a promulgação, pelo que a sua existência, validade e eficácia não dependem de qualquer outro órgão, não estando também sujeitas, em regra, a controlo preventivo da constitucionalidade, mesmo quando possuam carácter normativo.
Em todo o caso, estaria sempre salvaguardada a fiscalização sucessiva da constitucionalidade destas resoluções em particular.
O interesse na vinculatividade externa e imediata destes actos normativos pode, contudo, aconselhar a que seja repensada a forma prevista na proposta, sendo certo que, em todo o caso, tanto da parte do Governo, enquanto autor da iniciativa, como da parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, foi manifestada abertura para se proceder a uma reavaliação deste ponto e, se necessário, proceder-se a uma alteração da natureza formal desta iniciativa.

3.2. Maioria de aprovação
Relativamente à questão da maioria exigida para a aprovação das resoluções em matéria de política criminal, parece não haver unanimidade, havendo quem entenda (nomeadamente o Bastonário da Ordem dos Advogados) que deveria ser exigida uma maioria de dois terços, como forma de obviar aos riscos de governamentalização na definição das prioridades e, sobretudo, a fim de evitar a criação de suspeições sobre a maioria parlamentar e o Governo, susceptível de criar um pernicioso clima de desconfiança na área da justiça.
O cumprimento desta exigência implicaria uma aprovação por uma maioria mais alargada do que a requerida para a elaboração das próprias leis penais, incluindo a "lei habilitante", isto é, a Lei Quadro da Política Criminal.
Pareceria uma incongruência do sistema que a "lei habilitante" fosse aprovada por uma maioria simples, exigindo-se uma maioria qualificada de dois terços para a aprovação da "resolução habilitada".
Por outro lado, acresce no mesmo sentido um outro argumento formal, de que é à Constituição que cabe definir as situações em que se deverá exigir uma maioria qualificada, não podendo ser a lei ordinária a fazê-lo.

4 - Enquadramento constitucional
A actual redacção do n.º 1 do artigo 219.º da Constituição, introduzida com a revisão constitucional de 1997, pressupõe a definição da política criminal pelos órgãos de soberania (Governo e Assembleia da República), ao prescrever que o Ministério Público participe na respectiva execução. No caso do Governo, a responsabilidade pela condução da política geral do país (artigo 182.º da Constituição) envolve necessariamente as políticas de segurança e criminal.
Ao incluir na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República a "definição dos crimes, penas, medidas de segurança e respectivos pressupostos, bem como (o) processo criminal" - alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º, a Constituição reconhece que este órgão de soberania, a par do Governo, possui competência para definir a política criminal.