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12 | II Série A - Número: 003S1 | 29 de Setembro de 2007

fundamentais em concurso, bem como do equilíbrio entre as liberdades individuais e as garantias colectivas, entre a liberdade e a segurança.
7. A matéria do projecto de diploma aqui em apreço prende-se, igualmente e de forma particularmente premente, com o direito (fundamental) à identidade pessoal, previsto no n.º 1 do artigo 26.º da CRP. A identidade pessoal é aquilo que caracteriza cada pessoa enquanto unidade individualizada que se diferencia de todas as outras pessoas, é o que torna cada indivíduo singular, único, irrepetível, mas também irredutível e indivisível. A identidade pessoal inclui, tanto a identidade absoluta – aquilo que identifica os indivíduos de forma singular e os torna inconfundíveis entre si – como a identidade relativa – respeitante à memória familiar e à historicidade pessoal. O direito à identidade pessoal comporta, também, estas duas vertentes.
6 8. Mais ainda, caminhando no sentido das profundezas do ser humano e chegando ao «cerne mais oculto da célula e do cromossoma»
7 de cada indivíduo, o Projecto versa sobre a identidade genética
8 de cada cidadão, sobre a criação de bases de dados de perfis de ADN 9 10 11
, quer para fins de identificação civil, quer para fins de investigação criminal. Sobre a identidade genética, o comando contido no n.º 3 do artigo 26.º da CRP traz uma imposição legislativa no sentido de uma garantia adicional e especial de respeito pela dignidade pessoal e pela identidade genética do ser humano, quando colocada perante a utilização de tecnologias e a experimentação científica. Dizemos adicional e especial porque o respeito pela dignidade pessoal não pode ser, em caso algum, questionada, pois ela sustenta toda a comunidade política portuguesa: artigo 1.º da CRP.
Também a identidade genética, sendo uma das identidades pessoais, tem o seu direito reconhecido pelo n.º 1 deste artigo 26.º da CRP; o n.º 3 é, por isso, um aditivo garantístico conferido pela Lei Fundamental à identidade genética. Tendo em atenção que os direitos fundamentais, os direitos, liberdades e garantias são «direitos de liberdade»
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, direitos que visam, em primeira mão, proteger os cidadãos face à ingerência do Estado, tendo em vista que esses mesmos direitos estão sujeitos ao regime da «concordância prática»
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, a necessidade do legislador constituinte consagrar especificadamente esta garantia só pode significar a imposição de um respeito adicional, especial, um plus garantístico a respeitar sempre que se combina identidade genética com criação, desenvolvimento e utilização das tecnologias.
9. Este cuidado acrescido é plenamente justificado e alicerça-se na maior prudência do legislador constituinte: «Na origem dos grandes riscos que ameaçam a sociedade está a biotecnologia». «Como saldo, podemos dizer que os riscos aumentam sempre, mais celeremente que as soluções dos problemas».
14 II – A Sociedade da Informação e os riscos da modernidade

1. Os últimos 25 anos do século XX ficaram marcados pelo aparecimento da informática. Inicialmente, como instrumento de armazenamento de informação, acabou por demonstrar uma combinação entre rapidez e capacidade até então inimaginável. Seguidamente, como instrumento de realização de operações de cálculo e de cruzamento de informação armazenada, ultrapassou em muito larga medida, em termos de idêntica combinação, a capacidade humana. Finalmente, como instrumento de comunicação, a informática – nomeadamente e de forma muito especial a Internet – mudou os parâmetros do espaço-tempo da vivência humana. A eliminação de distâncias na comunicação e a difusão da realidade em tempo real, tornando global o mais particularista fenómeno local e trazendo à experiência local o mais global dos acontecimentos, foi uma transformação que mudou o mundo.
15 2. No cerne desta transformação está, precisamente, a Informação. 6 Paulo Otero, «Personalidade e Identidade Pessoal e Genética do Ser Humano: um perfil constitucional da bioética», Almedina, Coimbra, 1999, pags. 63 e ss.
7 Luís Archer, «Genoma e Intimidade», Cadernos de Bioética n.º 7, citado em Bernardo Xavier, «O acesso à informação genética. O caso particular das entidades empregadoras», Esudos de Direito da Bioética, Almedina, Coimbra, 2005, pag. 142.
8 A genética «é a ciência que estuda a hereditariedade e os mecanismos e leis da transmissão dos caracteres dos progenitores aos descendentes, bem como a formação e evolução das espécies animais e vegetais»: Stela Barbas, «Direito ao Património Genético», Almedina, Coimbra, 1998, pag. 11.
9 ADN é a sigla que designa Ácido Desoxirribonucleico («molécula formada por um conjunto de substâncias químicas elementares, em que avultam quatro elementos que se agrupam em pares e que formam os intermináveis «degraus da escada helicoidal» a que se chama a «dupla hélice».) Cromossomas são feitos de ADN e, portanto, todo o material genético de um organismo é ADN: Guilherme de Oliveira, «Temas de Direito da Medicina», n.º 1, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, pag. 115 e ss.
10 Perfil de ADN é constituído pelas características singulares de cada indivíduo, a sua «impressão digital genética».
11 O perfil de ADN é tido por todos os seres humanos, único e singular em cada indivíduo, permanecendo imutável ao longo de toda a vida e pós-morte, à excepção dos gémeos monozigóticos, aqueles que provêm do mesmo zigoto, que partilham o mesmo conjunto de genes e a mesma identidade genética. Ver, a este propósito, de novo Guilherme de Oliveira, ob. cit.
12 J. J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, «Constituição da República Portuguesa Anotada», Vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pag.
377.
13 José Carlos Vieira de Andrade, «Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976», Almedina, Coimbra, 1987, pag. 222.
14 José de Oliveira Ascensão, «Intervenções no Genoma Humano. Validade Ético-Jurídica», Estudos de Direito da Bioética, Almedina, Coimbra, 2005, pags. 25 e 26.
15 Sobre este assunto, ver, por todos, a trilogia de Manuel Castells intitulada «A Era da Informação – Economia, Sociedade e Cultura» e composta pelos Volume I – «A Sociedade em Rede», pelo Volume II – «O Poder da Identidade» e pelo Volume III – «O Fim do Milénio», todos editados pela Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2002.