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II SÉRIE-A — NÚMERO 38

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habitação consiste em obtê-la por via de propriedade ou arrendamento, traduzindo-se na exigência das

medidas e prestações estaduais adequadas a realizar tal objetivo. Neste sentido, o direito à habitação

apresenta-se como verdadeiro e próprio «direito social». (…) É, pois, um direito positivo que justifica e legitima

a pretensão do cidadão a determinadas prestações (cfr. AcsTC n.os 130/92, 131/92 e 420/00). O

incumprimento por parte do Estado e demais entidades públicas das obrigações constitucionais aqui indicadas

constitui uma omissão inconstitucional, e pode e deve desencadear os mecanismos da fiscalização da

inconstitucionalidade por omissão (artigo 283.º CRP).”

Também Jorge Miranda e Rui Medeiros4 abordam, no direito à habitação, enquanto direito a ter uma

morada decente ou condigna, “a dimensão social de «um direito a prestações, de conteúdo não determinável

ao nível das opções constitucionais», a pressupor, antes, uma tarefa de concretização e mediação do

legislador ordinário, cuja efetividade está dependente da reserva do possível, em termos políticos, económicos

e sociais (Acórdão n.º 374/02).” Sublinham, porém, citando jurisprudência do Tribunal Constitucional, que

enquanto direito fundamental de natureza social, o direito à habitação “pressupõe a mediação do legislador

ordinário destinada a concretizar o respetivo conteúdo» (…). Dele não se retira, nesta sua dimensão, «um

direito imediato a uma prestação efetiva, porquanto não é diretamente aplicável ou exequível, exigindo uma

atuação do legislador que permita concretizar tal direito» (…).”

Importa aludir, assim, que apesar do determinado na Constituição, e como é referido na exposição de

motivos da presente iniciativa, “enquanto para os restantes direitos sociais e culturais foram sendo criadas

sucessivas leis de bases gerais, que constituem uma orientação geral para as respetivas políticas públicas,

nunca houve entre nós uma lei de bases da habitação”.

A questão da habitação foi objeto de discussão parlamentar e políticas públicas desde a monarquia

constitucional5. Porém, e para efeitos da presente iniciativa, é pelo Decreto-Lei n.º 36 212, de 7 de abril de

1947, que criou o regime de “casas de renda limitada”, que surge o conceito de habitação acessível nos

mesmos termos. Tratava-se, então, de aprovar uma “nova modalidade de construção de prédios de

rendimento, baseada na prévia fixação da renda total máxima a cobrar pelos andares destinados a habitação”,

como aí é referido. Previa-se a vigência por dez anos, prorrogada por mais 10 anos pelo Decreto-Lei n.º 41

532, de 18 de fevereiro de 1958. Para o tornar exequível, eram estabelecidas facilidades de licenciamento e

uma série de benefícios fiscais (sisa e contribuição predial).

A criação do Fundo de Fomento da Habitação, pelo Decreto-Lei n.º 49 033, de 28 de maio (já revogado),

veio unificar num único organismo a matéria da habitação, com o objetivo não só de “fomentar a construção da

habitação social, correspondendo a uma das mais prementes necessidades nacionais”, mas também de fazer

“o estudo sistemático da problemática social da habitação, com vista a contribuir para o aperfeiçoamento da

nossa política habitacional”, como é referido no preâmbulo do diploma.

O regime de renda apoiada foi objeto de reforma em 1973, através do Decreto-Lei n.º 608/73, de 14 de

novembro, com uma ampla reforma estrutural, pela qual se visou a correção de erros e abusos entretanto

detetados. Instituía-se assim um “sistema de locação e construção”, criando o conceito de agências concelhias

ou “bolsas de habitação”, para intervir “direta e objetivamente na seleção de inquilinos e na formação do

contrato”, como é referido no preâmbulo do diploma. Caberia ao Fundo de Fomento da Habitação a garantia

do pagamento das rendas não satisfeitas pelos inquilinos através do sistema de depósito da caução, fixando

limites mínimos e máximos dos rendimentos dos agregados. O ónus da renda limitada era de 30 anos, de

acordo com o n.º 2 do artigo 1.º.

A transição para o regime democrático trouxe novos problemas no setor habitacional, a que se tentou

responder com iniciativas como o Despacho conjunto dos Ministérios da Administração Interna e do

Equipamento Social e do Ambiente de 6 de agosto de 1976, que instituía várias medidas destinadas a

solucionar determinados aspetos do problema habitacional, nomeadamente a criação do Serviço de Apoio

Ambulatório Local (SAAL), ou a política de solos, aprovada por Decreto-Lei n.º 794/76, de 5 de novembro.

Contudo, foi a partir da década de 80 do século XX que se tentou uniformizar a legislação referente à matéria,

quer em termos institucionais, quer através da revisão do regime de arrendamento e concessão de crédito à

habitação, acompanhada pela descentralização de competências na matéria para as autarquias locais.

4 Miranda, Jorge, Medeiros, Rui, Constituição da República Portuguesa Anotada, Tomo I, Artigos 1º a 79º, 2.ª edição, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2005, p. 1326.