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II SÉRIE-A — NÚMERO 28

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PROJETO DE LEI N.º 76/XV/1.ª

CONSAGRAÇÃO EXPRESSA DO CRIME DE EXPOSIÇÃO DE MENOR A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

(QUINQUAGÉSIMA SEXTA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO PENAL)

A violência doméstica é um crime com milhares de vítimas em Portugal que envolve, na sua essência, uma

assimetria de poder entre o agressor e a vítima, concretizada não só na violência física, mas também psicológica,

económica ou sexual. É um flagelo que, apesar dos muitos esforços, tem sido particularmente difícil de eliminar

da sociedade portuguesa.

De forma cada vez mais marcada, tem-se reconhecido o impacto que este crime tem nas crianças que o

testemunham. As consequências de um crime desta natureza são verdadeiramente devastadoras, não só para

a vítima contra a qual são praticados os atos de violência como também para as crianças, ainda em

desenvolvimento e crescimento, em fase de maior suscetibilidade e vulnerabilidade, que testemunham estas

ações horríveis. A saúde, o bem-estar e o desenvolvimento destas crianças são fortemente prejudicados pela

exposição a este crime, tal como a comunidade científica tem vindo a demonstrar, manifestando uma crescente

preocupação com as suas consequências a curto, médio, e longo prazo.

A ausência da consagração autónoma do crime de exposição de menor a violência doméstica constitui uma

lacuna que deve ser colmatada, pois o acervo normativo atualmente em vigor não tem protegido adequadamente

os menores dos danos ao seu desenvolvimento que a exposição a ações que integrem a prática de crime de

violência doméstica acarreta, exposição esta que ocorre em cerca de 31,7% dos casos registados, de acordo

com o Relatório Anual de Monitorização de Violência Doméstica referente ao ano de 2020. A necessidade de

autonomização deste crime resulta ainda da urgência de clarificação do Artigo 152.º do Código Penal, já que

tem sido entendido que a exposição de menor a violência doméstica se trata de uma mera agravante do crime

de violência doméstica e não um tipo penal autonomizado. A mera agravação do crime de violência doméstica

não contempla o menor como vítima de um crime contra si dirigido e cujos danos são por si sofridos e não

confere dignidade penal independente ao bem jurídico da integridade física e psíquica do menor.

Segundo o parecer do Conselho Superior do Ministério Público relativo à Proposta de Lei n.º 28/XIV/1.ª, a

consagração expressa do crime de exposição de menores à violência doméstica é exigida pela «Lei

Fundamental quando determina ao Estado português a consagração do direito das crianças ‘à proteção da

sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de

abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais

instituições.’», pela «Convenção sobre os Direitos da Criança que determina que ‘os Estados Partes tomam

todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas adequadas à proteção da criança contra

todas as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus tratos

ou exploração, incluindo a violência sexual, enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles,

dos representantes legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada.’», e pela «Convenção

do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica

(Convenção de Istambul), quando reconhece que ‘as crianças são vítimas de violência doméstica,

designadamente como testemunhas de violência na família’, e prevê que os Estados parte adotem medidas

legislativas ou outras necessárias para assegurar que, ao oferecer serviços de proteção e apoio às vítimas, os

direitos e as necessidades das crianças testemunhas de todas as formas de violência cobertas pelo âmbito de

aplicação da Convenção sejam tomados em conta, incluindo aconselhamento psicossocial adaptado à idade

das crianças testemunhas e tendo em devida conta o interesse superior da criança (artigo 26.º)».

Os projetos de lei sobre esta matéria têm reunido pareceres positivos de diversas entidades, como o

Conselho Superior do Ministério Público, a Ordem dos Advogados e a Comissão de Proteção às Vítimas de

Crimes. Algumas destas entidades sublinham que a exposição de menores a violência doméstica já se encontra

criminalizada nos termos do artigo 152.º do Código Penal, reconhecendo, todavia, que nem sempre a prática

judiciária tem seguido este entendimento, pelo que esta clarificação continua a ser pertinente.

O presente projeto de lei tem, assim, como objetivo, autonomizar expressamente o crime de exposição de

menor a violência doméstica, no sentido de garantir que as crianças que testemunhem esta realidade sejam

segura e adequadamente protegidas enquanto vítimas de crime.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do