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II SÉRIE-A — NÚMERO 93

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enquadrada como crime contra o bem jurídico que é a liberdade sexual, porque à disseminação é quase

sempre alheio o constrangimento da vítima a sofrer ou praticar um ato sexual. Com frequência, a vítima

consente ou participa na gravação ou na captura de imagens, que depois são partilhadas sem o seu

consentimento, por exemplo no âmbito daquilo a que se vem chamando pornografia de vingança.

Diversamente, caso haja, por exemplo, divulgação da gravação obtida enquanto estava a ser cometido um

crime de violação, estar-se-á perante uma pluralidade de crimes merecedores de punição autónoma. Os bens

jurídicos ofendidos pela disseminação não consensual de conteúdos íntimos são aqueles relacionados com a

privacidade e a intimidade, atacados por formas particularmente graves de indiscrição.

É sabido que estas condutas desvaliosas já têm enquadramento nas normas criminais vigentes. Todavia,

também existe significativo consenso quer quanto à insuficiência da moldura sancionatória prevista no artigo

192.º do Código Penal para o crime de devassa da vida privada, quer quanto à necessidade de adoção de

medidas orientadas para fazer cessar os danos. O crime de devassa da vida privada é punível com pena de

prisão até 1 ano ou pena de multa até 240 dias. O artigo 193.º do Código Penal prevê o crime de devassa por

meio de informática, dispondo que «quem criar, mantiver ou utilizar ficheiro automatizado de dados

individualmente identificáveis e referentes a convicções políticas, religiosas ou filosóficas, a filiação partidária

ou sindical, à vida privada, ou a origem étnica, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa

até 240 dias». Esta norma relaciona-se inequivocamente com o n.º 3 do artigo 35.º da Constituição, segundo o

qual «a informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou

políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem étnica, salvo mediante consentimento

expresso do titular, autorização prevista por lei com garantias de não discriminação ou para processamento de

dados estatísticos não individualmente identificáveis». Aquilo que aqui está em causa, portanto, é uma

proibição específica do armazenamento e tratamento informático de um círculo mais restrito de dados

pessoais.

Por outro lado, quando a disseminação consensual de conteúdos íntimos ocorrer no contexto de um

relacionamento afetivo, atual ou já terminado, tornar-se-á aplicável o regime jurídico-penal da violência

doméstica, crime tipificado no artigo 152.º do Código Penal.

Mais recentemente, por força da Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto, aprovada na sequência de projeto de lei

apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, deu-se um reforço da proteção jurídico-penal da

intimidade da vida privada contra agressões praticadas na Internet, agravando-se o limite mínimo da pena

aplicável ao crime de violência doméstica, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 152.º do Código Penal.

Alterou-se também o artigo 197.º do Código Penal, que passou a dispor que «as penas previstas nos artigos

190.º a 195.º são elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo se o facto for praticado através de

meio de comunicação social, ou da difusão através da Internet, ou de outros meios de difusão pública

generalizada».

Pretende-se, através desta iniciativa legislativa, determinar uma agravação da moldura penal prevista para

os crimes de devassa da vida privada e de devassa por meio de informática superior àquela que, por

remissão, resultaria do artigo 197.º do Código Penal, adequando as sanções aplicáveis ao desvalor objetivo da

indiscrição perpetrada através de meios de comunicação social, da Internet ou de outros meios de difusão

pública ou generalizada, de modo a corresponder às novas necessidades preventivas relativamente aos

crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos.

Sendo certo que, sob o ponto de vista da proteção das necessidades das vítimas, a cessação da

disseminação não consensual dos conteúdos íntimos é condição essencial para a reparação dos danos

causados, propõe-se também o alargamento da imposição de deveres de informação e de bloqueio para os

prestadores intermediários de serviços em rede (prevista desde 2020 para a pornografia de menores por força

da Lei n.º 40/2020, de 18 de Agosto) aos crimes de devassa da vida privada praticados através da Internet.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo

Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei reforça a proteção das vítimas de crimes de disseminação não consensual de