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31 DE MAIO DE 2023

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atos em concreto que estejam em causa, pode configurar a prática de um ou mais de entre vários ilícitos já

previstos, designadamente injúrias, ameaça, perseguição, importunação sexual, coação sexual ou violação)

apesar de, ainda assim, sustentar o «acerto da iniciativa no que respeita à autonomização deste crime» [não

acompanhando, porém, «a forma como (…) foi delineada»)]. Todavia, da opção vertida na iniciativa legislativa

de passar a denominar como «assédio sexual» apenas as condutas subsumíveis no atual (e menos grave) ilícito

de importunação sexual, resulta a intenção de encurtamento conceptual daquilo a que se vem chamando

assédio? Eis a primeira dúvida que se suscita. De forma porventura mais enfática, o parecer do Conselho

Superior da Magistratura sublinha que «não se afigura, nem a exposição de motivos o fundamenta

suficientemente, que a realidade social reclame, para além do quadro legal já vigente, a necessidade de

criminalização de outras condutas para além daquelas que já são passíveis de ser sancionadas, podendo tal

intervenção do direito penal revelar-se excessiva». Retomando ideia antes constante de parecer da ASJP, o

CSM reafirma que «nunca se poderá, contudo, criminalizar condutas de assédio sexual indesejadas que não

ultrapassem a grosseria ou má-educação. Deve ter-se presente ao artigo 18.º da Constituição da República

Portuguesa». E conclui-se, no parecer do CSM, que «uma incriminação com essa amplitude pode revelar-se

excessiva por ofender outros direitos fundamentais e abranger condutas sem qualquer relevância penal, o que

não passará no crivo dos princípios constitucionais da necessidade e da proporcionalidade».

Por outro lado, o projeto de lei em apreço é ainda questionável à luz do princípio da determinabilidade das

normas penais incriminadoras (dimensão inegável do princípio da legalidade), porquanto recorre a conceitos

indeterminados cujas fronteiras parecem de muito difícil concretização (o parecer da Ordem dos Advogados

refere a possibilidade de se tratar de solução «violadora dos princípios jurídicos da legalidade e da tipicidade»;

o parecer do CSM refere os «conceitos de tal modo abrangentes, indefinidos e indeterminados que não

permitirão ao destinatário da norma saber quais são os atos realmente proibidos, o que colidirá com o princípio

da tipicidade enquanto expressão do princípio constitucional da legalidade»).

Em terceiro lugar, as pronúncias recebidas até ao momento enfatizam as críticas à criação de um crime de

«assédio sexual qualificado» num novo artigo 170.º-A, porquanto sempre seria redundante face à solução

atualmente constante do artigo 177.º do Código Penal, introduzindo fatores de perturbação para o aplicador.

Finalmente, o parecer da APAV manifesta-se expressamente sobre a natureza do crime no que respeita à

promoção processual, rejeitando a publicização, em sentido que merece concordância. Nos seus termos, «o

procedimento criminal acaba muitas vezes por submeter a vítima a um penoso e difícil processo de vitimação

secundária, razão pela qual defendemos, para este como para os restantes crimes contra a liberdade sexual,

que não é positiva para as vítimas a publicização tout-court (…) entende-se que ao crime de assédio sexual na

forma simples deverá ser conferida natureza semipública, tal como sucede atualmente com o crime de

importunação sexual. Estando presente alguma circunstância de agravação, admite-se a possibilidade de

mitigação dessa natureza semipública através do alargamento do âmbito de aplicação do artigo 178.º, n.º 2,

atribuindo-se ao Ministério Público a prerrogativa de poder dar início ao procedimento criminal sempre que o

interesse da vítima o aconselhe». Também o parecer do CSM rejeita a atribuição da natureza pública a estes

crimes: «vê-se com dificuldade que se retire à vítima ou ao titular do direito de queixa (…) o poder de decidir

sobre o início da ação penal, sendo-lhe perfeitamente legítimo preferir o esquecimento à estigmatização a que

normalmente está associado este tipo de processos».

PARTE III – Conclusões

1 – O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da

República o Projeto de Lei n.º 743/XV/1.ª (BE) – Cria o tipo legal de crime de assédio sexual e de assédio sexual

qualificado, reforçando a proteção legal das vítimas.

2 – A iniciativa legislativa sub judice visa a autonomização do crime de assédio sexual e a criação de um

crime de assédio sexual qualificado.

3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto

de Lei n.º 743/XV/1.ª (BE) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em

Plenário.