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19 DE OUTUBRO DE 2023

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República Portuguesa, pela manutenção da tutela penal de criminalização dos maus tratos e abandono de

animais de companhia, e ainda, e mais recentemente, foi igualmente entregue na Assembleia da República uma

petição com vista à inclusão expressa dos animais na Constituição, que recolheu mais de 30 mil assinaturas8.

As decisões do Tribunal Constitucional convocam duas dimensões essenciais para o debate sobre a

criminalização dos maus-tratos contra animais. Por um lado, respaldando a decisão na inexistência de um bem

jurídico constitucionalmente protegido suscetível de habilitar a restrição ao direito à liberdade, nos termos do

artigo 27.º da Lei Fundamental, através de uma sanção penal privativa da liberdade, os juízes conselheiros

lançam o repto para a necessidade de clarificar o bem jurídico constitucionalmente protegido, centrado no valor

intrínseco do animal, pela inclusão necessária em sede de revisão constitucional, por outro lado, a necessidade

de clarificar, igualmente, as normas penais em apreço.

Por outro lado, e ainda que, em suma, as decisões se prendam com a inexistência de bem jurídico, alguns

juízes conselheiros divergiram desse entendimento, e consideraram estar perante a existência de um bem

jurídico com suficiente densidade constitucional para preencher a exigência do texto constitucional, sustentando,

porém, que a norma em presença incumpre as exigências de tipicidade e determinabilidade exigidas pelo n.º 1

do artigo 29.º da Constituição da República, concretamente por aludir a conceitos indeterminados que ditariam

a inconstitucionalidade da norma, em particular ao nível da norma que estabelece o conceito de animal, o

conteúdo da ação penalmente censurada e o conceito excludente da prática de ilícito, incitando aos legisladores

que procedam a essa clarificação.

Todavia, para o PAN, existe uma segunda ordem de razão para uma tal inclusão na nossa Lei Fundamental,

a qual se prende com um imperativo civilizacional e ético de consideração moral pelos animais.

Com efeito, e ainda que consideremos que inexiste qualquer inconstitucionalidade conforme supra defendido,

é indubitável que a proteção dos animais e, consequentemente, o seu valor intrínseco, enquanto seres

sencientes, devem ter proteção explícita na nossa Constituição, tal como já o fazem diversos outros

ordenamentos jurídicos, esclarecendo e afastando qualquer risco de uma eventual declaração de

inconstitucionalidade com força obrigatória geral e acompanhando o passo civilizacional já dado por outros

países.

A Alemanha desenvolveu normativos de índole constitucional em torno da protecção animal, quando, em

2002, introduziu na sua Constituição da República Federal, o artigo 20a, com consagração expressa de deveres

do Estado para com a proteção dos animais. Dispõe o referido artigo que, «na responsabilidade pelas futuras

gerações, o Estado protege também os fundamentos naturais da vida e os animais, de acordo com os preceitos

da ordem constitucional, através de legislação e de acordo com a lei e o direito, através do seu pleno poder e

jurisdição».

Também a Suíça dispõe, nos artigos 80 e 120 da Constituição da Confederação Helvética e Lei de 4-10-

2002, a proteção expressa dos animais.

Segundo o exemplo da Alemanha, que consagrou de forma expressa os deveres do Estado para com a

proteção dos animais, no entender do PAN, também na nossa Constituição deve constar expressamente a

proteção dos animais como tarefa fundamental do Estado (concretamente no seu artigo 9.º) e/ou ainda com

consagração da proteção e do bem-estar animal, tal como expresso para o ambiente, no artigo 66.º da nossa

Lei Fundamental, sem prejuízo das demais normas constitucionais que o legislador constitucional entenda

adequadas.

Veja-se também que o artigo 13.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE)9, com

antecedentes no Protocolo n.º 13 do Tratado de Amesterdão (1997), na redação introduzida pelo Tratado de

Lisboa, veio reconhecer um dever de proteção, por parte dos Estados-Membros, aos animais, enquanto seres

«sensíveis», a saber:

«Na definição e aplicação das políticas da União nos domínios da agricultura, da pesca, dos transportes, do

mercado interno, da investigação e desenvolvimento tecnológico e do espaço, a União e os Estados-Membros

terão plenamente em conta as exigências em matéria de bem-estar dos animais, enquanto seres

sensíveis […]»(destacado nosso).

E no sentido da senciência dos animais, a 7 de julho de 2012, um grupo de renomados neurocientistas

proclamaram na Declaração de Cambridge sobre a Consciência (The Cambridge Declaration on

8 Pela inclusão da protecção dos animais na Constituição da República Portuguesa: Petição Pública (peticaopublica.com) 9 http://europa.eu/pol/pdf/consolidated-treaties_pt.pdf