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II SÉRIE-A — NÚMERO 47

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casa própria, assenta na aposta de resolução da questão da habitação através do mercado (seja pelos apoios

à procura, diretamente às pessoas, seja pelos incentivos à promoção privada). E esta reorientação enquadra-

se num esvaziamento generalizado dos mecanismos de intervenção pública, que não se esgota na redução da

promoção direta de alojamentos.

De facto, e um pouco por toda a Europa, assistiu-se à tendência, desde os anos 80, não só para a quebra

da promoção pública, mas também para lógicas de alienação de habitação social (que acentuou a perda de

relevância do setor público de alojamento no total), bem como ao enfraquecimento de mecanismos de regulação

das rendas, tanto do ponto de vista de uma maior desproteção dos inquilinos como na perspetiva da supressão

de instrumentos públicos de controlo do seu valor (Drago, 2021).8

No caso português, esta reorientação de política habitacional fica inscrita nas mudanças institucionais, ao

nível da própria nomenclatura dos organismos do Estado nesta área da habitação. De facto, o Fundo de Fomento

da Habitação, criado no ano de 1969 e extinto em 1982, desenvolveu uma atividade centrada na promoção

direta para arrendamento social a estratos mais desfavorecidos. Com a sua extinção, parte das competências

de financiamento do Fundo de Fomento da Habitação foram atribuídas ao, então criado, Fundo de Apoio ao

Investimento para a Habitação – FAIH que, por seu turno, seria extinto em 1984, em simultâneo com a criação

do Instituto Nacional de Habitação, IP (INH), este com competências reforçadas de intervenção financeira no

setor da habitação e de concessão de apoios à construção de habitação social por cooperativas, municípios,

instituições particulares de solidariedade social e privados, em resposta às carências mais prementes de

habitação. As restantes competências do extinto Fundo de Fomento da Habitação, em especial no domínio da

administração do seu parque habitacional, viriam a ser assumidas pelo Instituto de Gestão e Alienação do

Património Habitacional do Estado (IGAPHE), criado em 1987, que tinha entre as suas atribuições, como

explicita o próprio nome, a alienação de parte do património habitacional existente, num claro processo de

desinvestimento e retração do parque público de habitação.9

Em 2007, no âmbito do PRACE – Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado,

aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 124/2005, de 4 de agosto, o INH seria reestruturado e

redenominado Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP (IHRU, IP), sendo neste integradas as

atribuições do IGAPHE, então extinto.

A comparação entre os níveis de promoção habitacional efetuada por organismos públicos e o stock de fogos

propriedade pública, registado nos sucessivos Censos da População e da Habitação, permite estabelecer uma

aproximação ao contributo da alienação de alojamentos sociais na reduzida expressão do atual parque público

de habitação.

Quadro 10

Evolução do número de fogos construídos por organismos públicos e dos fogos propriedade de

organismos públicos contabilizados nos Censos (1981-2011)

1981 1991 2001 2011

n.º % no total n.º % no total n.º % no total n.º % no total

Fogos existentes

(Censos) 121 564 4,4 % 134 273 4,4 % 114 293 3,2 % 123 158 3,1 %

Fogos existentes

(em 1981) e

construídos

121 564 4,4 % 155 577 5,1 % 171 605 4,8 % 183 558 4,6 %

Diferença entre

fogos existentes e

construídos

0 -21 304 -57 312 -60 400

Fonte: INE, IP

Nestes termos, e considerando o período entre 1981 e 2011, observa-se que a diferença entre os dois

indicadores se acentua ao longo do tempo, traduzindo uma perda potencial de cerca de 60 000 fogos. O que

8 Cf. Drago, Ana (2021), Habitação entre crises: partição das classes médias, políticas de habitação acessível e o impacto da pandemia em Portugal. Cadernos do Observatório, n.º 2. Observatório das Crises e Alternativas. CES, Lisboa [https://www.ces.uc.pt/ficheiros2/files/crisalt/Caderno%2315_Habitacaoentre%20crises_fev2021.pdf]. 9 IHRU (2018), Habitação; cem anos de políticas públicas em Portugal, 1918-2018. [Cf. https://www.portaldahabitacao.pt/opencms/export/sites/portal/pt/portal/100anoshabitacao/af_IHRU_Habitacao_Social.pdf].