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17 DE SETEMBRO DE 2024

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lerem em voz alta. Foi também determinada a proibição de as mulheres olharem para qualquer homem que não

seja seu familiar e avolumadas as restrições à sua circulação.

Esta legislação, que já mereceu a condenação da maioria dos membros do Conselho de Segurança da ONU,

visa privar as mulheres, raparigas e meninas de qualquer participação e presença no espaço público, marcando

a tentativa de as aniquilar como cidadãs e até como pessoas.

Note-se que tudo isto é operado de várias formas, seja através de preceitos legais escritos e orais, seja de

práticas por estes legitimadas e que alargam o seu próprio alcance e que, naturalmente, instigam e propagam

um ambiente social, tanto no plano público quanto no familiar, de subjugação das mulheres e das raparigas a

ditames que as atacam e menorizam, naquilo a que a ONU chama «apartheid de género».

Atualmente, no Afeganistão, a ausência das mulheres e das raparigas da vida pública é quase absoluta,

sendo-lhes sonegada a participação política, associativa ou pública em geral. A sua liberdade de movimentos

encontra-se enormemente reduzida, o exercício de um vasto conjunto de profissões e atividades está proibido

e o acesso ao sistema universitário, tanto de cariz público quanto privado, foi-lhes barrado.

A ONU e a Amnistia Internacional têm denunciado a situação, sem sucesso. A comunidade internacional não

pode continuar a assistir passiva. Vários são os textos de direito internacional violados: a Declaração Universal

dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, o Pacto Internacional sobre os

Direitos Económicos, Sociais e Culturais e a Convenção sobre a eliminação de todas as Formas de

Discriminação contra as Mulheres e da Convenção sobre os Direitos da Criança.

Mas mais do que isso, a discriminação e a violência a que as mulheres, as raparigas e as meninas afegãs

são sujeitas é passível de constituir um crime contra a humanidade nos termos do artigo 7.º do Estatuto de Roma

do Tribunal Penal Internacional (TPI).

Efetivamente, o tratamento das mulheres, raparigas e meninas no Afeganistão inclui vários atos – privação

de liberdade, tortura, violência sexual, perseguição coletiva em razão do sexo, apartheid e outros atos

desumanos causadores de grande sofrimento e lesão à saúde física e mental – que estão elencados no n.º 2

do artigo 7.º e que, de acordo com o disposto no n.º 1 do mesmo preceito, consubstanciam crimes contra a

Humanidade quando estes atos são cometidos no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra

qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque.

Ora, o que se verifica no Afeganistão é um ataque contra um grupo de pessoas identificado por motivos

associados ao sexo a que pertencem, não restando dúvidas de que se encontra preenchido o tipo penal previsto

no artigo 7.º do Estatuto do TPI.

O TPI tem jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes e pode exercer a sua jurisdição em relação

a qualquer um dos crimes previsto no respetivo estatuto se um Estado parte denunciar ao procurador qualquer

situação em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários desses crimes (artigos 1.º e 13.º do

Estatuto).

Por sua vez, o artigo 14.º estabelece que «qualquer Estado poderá denunciar ao procurador uma situação

em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários crimes da competência do Tribunal e solicitar ao

procurador que a investigue, com vista a determinar se uma ou mais pessoas identificadas deverão ser acusadas

da prática desses crimes.»

Portugal é parte no Estatuto do TPI e pode – e deve – por isso proceder a esta denúncia, quebrando a

passividade da comunidade internacional perante a situação inaceitável das mulheres afegãs e seguindo os

apelos da ONU e da Amnistia Internacional.

Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do

Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República

Portuguesa:

a) Condenar veementemente a discriminação de género e a violência contra as mulheres, raparigas e

meninas no Afeganistão.

b) Exprimir a sua solidariedade com as mulheres, raparigas e meninas afegãs.

c) Saudar todos os que, no próprio Afeganistão e no resto do mundo, se manifestam ativamente contra a

violação dos direitos das mulheres, raparigas e meninas pelo regime talibã.