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II SÉRIE-A — NÚMERO 133

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 451/XVI/1.ª

ASSUNÇÃO DE PODERES DE REVISÃO CONSTITUCIONAL EXTRAORDINÁRIA PELA ASSEMBLEIA

DA REPÚBLICA PARA ASSEGURAR A CONSAGRAÇÃO DA PROTEÇÃO DOS ANIMAIS NA

CONSTITUIÇÃO

A assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária, conforme explicam Gomes Canotilho e

Vital Moreira1, permite que a Assembleia da República, em casos em que tal «se torne imprescindível e

inadiável» e mediante uma maioria especialmente agravada, despolete um processo de revisão constitucional

«totalmente independente das revisões ordinárias», que «não interrompe a contagem do quinquénio iniciado

com a revisão ordinária precedente» e que determina que não comece «a contar-se novo prazo para efeitos

de nova revisão ordinária».

Este instrumento consagrado no artigo 284.º, n.º 2, da Constituição constitui, pois, o meio idóneo para

introduzir, no texto constitucional, alterações com carácter de urgência imperiosa que tornem a revisão

constitucional imprescindível e inadiável, embora possa não se cingir a esse âmbito material de revisão. Foi

isso mesmo que sucedeu no âmbito da quinta revisão constitucional, ocorrida em 2001, para assegurar a

ratificação do Tratado de Roma que criara o Tribunal Penal Internacional, ou no âmbito da sétima (e última)

revisão constitucional, ocorrida em 2005, que previu a realização de referendo sobre a aprovação de tratado

que vise a construção e o aprofundamento da União Europeia.

Ainda que, de acordo com Jorge Miranda e Rui Medeiros2 e à luz da Constituição, não seja necessário

identificar o âmbito material de revisão constitucional a operar na sequência da assunção de poderes de

revisão constitucional extraordinária, por razões de transparência o PAN considera que deverá clarificar os

termos e os fundamentos da consagração constitucional que pretende que seja feita com a presente iniciativa,

nomeada e exclusivamente a consagração da sua proteção dos animais, tal como acontece em países como a

Alemanha e a Suíça, considerando assim o seu valor intrínseco e estatuto próprio, em harmonia até com o

Código Civil português que reconhece que «os animais são seres vivos dotados de sensibilidade» (artigo

201.º-B).

A presente iniciativa propõe assim a assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária por parte

da Assembleia da República, com vista à consagração na Constituição da proteção animal.

E fá-lo, desde logo, pelo facto de no início do presente mês se terem completado nove anos desde que a

Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, entrou em vigor e introduziu no Código Penal os crimes de maus-tratos e de

abandono de animais de companhia. Uma lei que teve origem numa petição de cidadãos que recolheu mais de

40 mil assinaturas, tendo sido aprovada pela quase unanimidade de votos parlamentares, demonstrativo da

importância do tema em questão e do consenso em torno do mesmo.

Com esta lei, Portugal integrou o grupo maioritário de Estados-Membros da União Europeia que

criminalizam os maus-tratos contra animais.

Acontece, porém, que este avanço significativo, que mereceu alargado suporte parlamentar e se baseia

num indubitável clamor social, se encontra em sério risco de enfrentar um enorme retrocesso civilizacional e

enfrenta já uma incompreensível inaplicabilidade, como adiante melhor se irá expor.

Tal acontece, precisamente porque, no final de 2021, um acórdão da 3.ª Secção do Tribunal Constitucional,

em sede de fiscalização concreta, julgou, pela primeira vez, inconstitucional a norma que prevê e pune o crime

de maus-tratos a animal de companhia (artigo 387.º do Código Penal). Ora, pese embora, e com o devido

respeito, o PAN não acompanhe tal entendimento, o tribunal considerou «inevitável concluir pela inexistência

de fundamento constitucional para a criminalização dos maus-tratos a animais de companhia, previstos e

punidos no artigo 387.º do Código Penal». Em causa, a decisão sobre o recurso da pena de prisão de 16

meses de prisão efetiva pela prática de quatro crimes de maus-tratos a animais de companhia agravados, e na

pena acessória de privação do direito de detenção de animais de companhia pelo período máximo de 5 anos,

aplicada a um antigo enfermeiro que esventrou a cadela Pantufa, a sangue-frio, deixando-a em grande

sofrimento, a morrer, sem qualquer assistência médico-veterinária e ainda tendo colocado as suas crias no

lixo, que acabaram igualmente por morrer. Um crime de elevada crueldade e censurabilidade social, à qual o

1 Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II, 4.ª edição, Coimbra Editora, 2010, páginas 997 e 998. 2 Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III, Coimbra Editora, Dezembro de 2007, página 898.