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13 DE JANEIRO DE 2025

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 567/XVI/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE APELE À REPÚBLICA DO IRAQUE QUE NÃO LEGALIZE OS

CASAMENTOS INFANTIS E NÃO DIMINUA OS DIREITOS DAS MULHERES NO CASAMENTO, NO

DIVÓRCIO, NA PARTILHA DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS E NA HERANÇA

Exposição de motivos

No Conselho dos Representantes da República do Iraque foi apresentada uma proposta de alteração à Lei

do Estatuto Pessoal, aprovada pela Lei n.º 88 de 1959, que procurando impor uma alegada interpretação rígida

da Sharia e «proteger as raparigas de relações imorais», propõe a redução da idade legal de casamento para

nove anos no caso das meninas e para 15 anos no caso dos rapazes, bem como propõe que casamentos não

registados possam ser válidos se celebrados líderes religiosos – abrindo a porta à legalização dos chamados

«casamentos de prazer», que são contratos de casamento temporários conduzidos por clérigos religiosos e que

permitem que os homens entrem em relações conjugais com um número ilimitado de mulheres por um período

tão curto quanto algumas horas ou tão longo quanto alguns meses.

Sob o argumento de possibilitar aos iraquianos «o direito de escolha», a mesma iniciativa legislativa propõe

ainda que a custódia obrigatória dos filhos com a mãe em caso de divórcio seja reduzida de 10 para dois anos

e que os nubentes possam escolher se ao casamento se aplicam as disposições previstas na Lei do Estatuto

Pessoal ou as disposições de determinadas escolas islâmicas de jurisprudência, o que na prática se poderá

traduzir em significativas perdas de direitos das mulheres em situações de divórcio (em que poderá perder os

direitos à casa de morada de família, a pensão de alimentos por três anos, ao seu dote e na partilha de

responsabilidades parentais, reconhecidos pela Lei do Estatuto Pessoal) e de morte do cônjuge ou de pai

(reforçando o privilégio dos homens e até do Estado nas disputas de heranças).

Esta proposta de alteração legal teve a sua primeira leitura no Conselho dos Representantes da República

do Iraque em 4 de agosto de 2024, uma segunda leitura em 16 de setembro de 2024, o aval do Supremo Tribunal

em 17 de setembro de 2024 e iniciou a sua votação no mês de dezembro de 2024. Embora várias tenham sido

as tentativas falhadas de introdução destas alterações legais desde a queda do regime de Saddam Hussein em

2003 – as mais importantes em 2014 e em 2017 –, esta trata-se da tentativa com mais probabilidades de sucesso

já que se insere num movimento legislativo mais abrangente que conta com uma sólida maioria no Conselho

dos Representantes da República do Iraque e que, em nome de uma alegada interpretação rígida da Sharia,

nos últimos tempos já conseguiu criminalizar a homossexualidade, proibir a utilização da palavra «género» ou

travar a aprovação de medidas de combate à violência doméstica no país.

A aprovação desta alteração legal traria a institucionalização da violência de género no Iraque e teria um

impacto devastador nos direitos e dignidade das meninas, raparigas e mulheres iraquianas, aumentando a sua

vulnerabilidade à exploração, à pobreza, ao abuso e à violência.

Ao reduzir-se substancialmente a autonomia financeira das mulheres em caso de divórcio ou de morte do

cônjuge ao mesmo tempo que se legitimam os casamentos não registados, muitas mulheres poderão ser

empurradas para a via dos chamados «casamentos de prazer» e para um rumo de exploração sexual. A

legitimidade que esta lei poderá dar aos «casamentos de prazer» pode aumentar o risco de propagação do VIH

no país, criando um grave problema de saúde pública no país, bem como diminuir os direitos das mulheres

perante os serviços públicos e no acesso à saúde (inclusive no caso de gravidez).

Ao reduzir-se a idade do consentimento das meninas para nove anos esta proposta contribuirá para o

agravamento de dois problemas sociais muito graves no contexto iraquiano, os casamentos precoces e forçados

(que hoje afetam 28 % das meninas iraquiana) ou as dificuldades de as mulheres acederem à educação (já que

46,2 % das mulheres que se casam antes dos 18 anos não têm educação ou apenas educação pré-primária).

Esta alteração representa a destruição dos traços essenciais da Lei do Estatuto Pessoal, aprovada pela Lei

n.º 88 de 1959, que é desde a sua adoção e até hoje uma das mais progressistas da região e um exemplo de

unificação de todos os cidadão independentemente de género, seita ou religião – já que partindo de

interpretações da Sharia conseguiu reunir o acordo de sunitas e de xiitas –, abrindo a porta a que as decisões

sobre questões familiares passem a ser colocadas nas mãos de clérigos religiosos e a que passe a haver um

direito da família arbitrário e que desconsidera de forma estrutural os direitos humanos.