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II SÉRIE-B — NÚMERO 35

chamado caso Campos, não tendo, provavelmente, sido alheia a esta atitude a notariedadc que o referido caso de perdão fiscal assumiu junto da opinião pública.

Pode, assim, afirmar-se que a Comissão deu como adquirido, sem que lenha havido lugar a fortes discordâncias, que a generalidade do «procedimento da administração fiscal, em matéria de facilidades no pagamento de juros compensatórios ou moratórias e multas, observou, em regra, o disposto na Lei n.-10186, de 11 de Junho, ou as determinações do Decreto-Lei n.q 53/88, de 25 de Fevereiro», embora conclua «pela conveniência em introduzir, nesta matéria de perdões de multas e juros fiscais, aperfeiçoamentos legislativos que dêem parâmetros mais claros e precisos para o exercício do poder dos membros do Governo com autoridade no domínio fiscal».

Estes juízos constam, de resto, das conclusões, e porque respondem significativa e claramente ao primeiro dos três objectivos políticos do inquérito (segundo a interpretação que eu próprio faço da realidade política que o condiciona), têm a minha concordância.

Quanto ao apuramento da existência ou não existência de critérios de objectividade, em matéria de perdão de dívidas fiscais, os depoimentos recolhidos e relevantes para a matéria ou apontaram claramente para a existência de situações de favoritismo (desde logo as declarações do Sr. Dr. António Martinho, jornalista do Expresso, e, de certo modo, as declarações do Sr. Dr. Mota Figueiredo, da Cerâmica Campos) ou foram insuficientes (e contraditórios) para anularem essa presunção (nomeadamente a declaração do adjunto do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Dr. Catarino).

Acresce ainda que constam dos autos informações relativas a comportamentos diferenciados perante situações fiscais, aparentemente similares, que não podem ser ignoradas (Caves Aliança, António Pessoa, L.da, METALTQRRE — Sociedade de Montagens e Estruturas Metálicas, L.d', RAPIDAUTO — Reparações Rápidas em Automóveis, L.da, SIVA — Sociedade de Importação de Veículos Automóveis, L.a>, etc.). Porque assim é, não posso aderir à conclusão do inquérito que aponta para a inexistência de arbitrariedade na concessão de facilidades no pagamento de juros e multas, mesmo considerando que tal afirmação assenta apenas na insuficiência objectiva dos indícios existentes, para comprovar uma prática de perdões fiscais destinados a proteger empresas, amizades pessoais ou cumplicidades políticas.

No que respeita ao apuramento e tratamento da situação fiscal da empresa Campos, a minha discordância com o relatório (c respectivas conclusões) é ainda mais acentuada.

Com efeito:

1 —A empresa Cerâmica Campos requereu, em 15 de Maio de 1990, ao Secretario de Estado dos Assuntos Fiscais, perdão total dos juros e multas eventualmente exigíveis, sem prejuízo de manter as reclamações oportunamente apresentadas, quanto ao valor dos impostos entretanto apurados.

2 — Este requerimento, apresentado na sequência de dois requerimentos anteriores (Novembro de 1987 e 6 de Fevereiro de 1990), é elaborado depois da realização (em 3 de Maio de 1990) de uma reunião na Secretaria de Estado, com o objectivo exclusivo de tratar este assunto. Como ficou provado, por declarações diversas, nesta teunião esteve presente o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

3 — Ao contrário do que sucedeu com os dois requerimentos anteriores, cujos propósitos eram semelhantes, o

terceiro requerimento foi enviado para informação a um técnico da dependência directa do Secretário de Estado e da sua máxima confiança, pois desempenha funções de adjunto no respectivo Gabinete.

4 — O referido técnico produziu uma informação que

entregou em 21 de Maio dc 1990 onde, inequivocamente, recomenda ao Secretario de Estado dos Assuntos Fiscais que, excepcionalmente, autorize o que é solicitado pela empresa, ou seja, como se refere na aludida informação:

Que seja levada em conta a quantia de 1 018 928S já paga;

Que sejam perdoados juros e multas;

Que sejam extintos os processos de execução instaurados e levantadas as apreensões de bens para garantia;

Que se considere não precludido o direito de reclamar contra as fixações apuradas.

5 — Esta informação, ao contrário do que é referido nas conclusões do relatório, constitui um parecer muito claro sobre a globalidade da situação fiscal, como a empresa a apresenta e nos exactos termos em que a requer, e não pode ser reduzida, como contraditoriamente pretendeu o adjunto do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nas declarações que prestou à Comissão, a uma afirmação exclusivamente produzida «para especialistas» sobre a situação fiscal da Campos relativa ao ano de 1984.

6 — Consequentemente, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, quando despachou, em 21 de Maio de 1990, «Concordo. Autorizo conforme proposto», estava, de harmonia com o mais elementar bom-senso, a despachar favoravelmente o que lhe era requerido pela empresa, nomeadamente o perdão dos juros e multas relativos a todos os impostos já apurados ou a apurar pela Cerâmica Campos.

7 — Não se trata, ao contrário do que se conclui no relatório, de um despacho condicionado quanto ao perdão dos juros e multas, antes se apresenta, neste domínio específico, como um despacho claramente definitivo.

8 — Com efeito, o que ficou indeterminado é o que consta de um novo despacho (com a mesma data) proferido sobre a mesma informação, ou seja, os valores dos impostos em dívida anteriormente apurados, porque — e só porque — pareceram ao Secretário de Estado exagerados face às condições existentes no sector onde a empresa laborava.

Daí que se tenha determinado uma nova fiscalização à empresa.

Não é relevante, como é óbvio, para a matéria objecto do inquérito (existência ou não de um perdão fiscal) que a nova inspecção tenha confirmado, praticamente, e ao contrário do que eram as expectativas do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, os valores anteriormente determinados.

9 — Ficaram suficientemente comprovados a existência de uma relação directa entre a realização da reunião de 3 de Maio de 1990 (onde estiveram presentes representantes da Cerâmica Campos, da empresa CAIMA, da empresa DECA e da empresa Ernst & Young e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais), as respectivas conclusões e compromissos, a forma e a data de apresentação do terceiro requerimento e o teor do despacho do Secretario de Estado.

10 — Esta relação directa e o entendimento generalizado da sua existência foram determinantes para a concretização do negócio de venda da Cerâmica Campos à empresa CAIMA, bem como à fixação do respectivo valor de transacção.