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0043 | II Série B - Número 040 | 17 de Abril de 2006

 

Da documentação depositada na Comissão de Inquérito e, sobretudo, dos depoimentos prestados perante a mesma, pode concluir-se que a solução extra-judicial do litígio que opunha a Eurominas ao Estado e que culminou com o arbitramento de uma indemnização teve por base três pressupostos essenciais: i) libertar a EDP de um processo judicial que poderia comprometer o respectivo processo de privatização; ii) a forte convicção de que o arrastamento e a eternização dos processos judiciais movidos pela Eurominas contra o Estado poderiam pôr em crise o projecto de revitalização do Porto de Setúbal e Sesimbra com a consequente perda dos apoios financeiros do QCA III e, finalmente; iii) a convicção de que a reversão dos terrenos sem que à mesma estivesse associada uma indemnização, era susceptível de colidir com princípios inscritos na Constituição da República Portuguesa.
A este respeito, o Sr. Deputado José Lamego, referiu perante a Comissão de Inquérito que:

"(…) na base dos princípios gerais do Direito Administrativo quer a reversão dos terrenos (que eram propriedade e estavam registados em nome da Eurominas) quer as benfeitorias configuram um direito a indemnização, até porque o nosso direito constitucional não admite o confisco e isso seria um confisco. (…) qualquer jurista minimamente informado saberia que, perante os princípios gerais do Direito, nomeadamente perante o artigo 18.º da Constituição, não pode haver reversão sem qualquer direito a indemnização, porque tal configura um confisco."

Nas declarações que o Sr. Deputado Vitalino Canas, realizou perante a Comissão de Inquérito também está patente tal preocupação:

"(…) o que interessava era que aquilo regressasse ao Estado para que o Estado pudesse beneficiar daquelas instalações portuárias e reconverter o porto de Setúbal do ponto de vista estratégico, utilizando aquelas instalações. (…) fiquei totalmente convencido de que não havia outra maneira de resolver aquela complicação toda que não através de uma solução extrajudicial daquele conflito, ou seja, através da possibilidade de uma contrapartida para a Eurominas."

Também o Sr. Deputado António Vitorino referiu à Comissão de Inquérito o seguinte:

"Penso que o ordenamento jurídico constitucional português dificilmente concebe essa forma de confisco, e não tenho qualquer pejo em escondê-lo. (…) na Revisão Constitucional de 1982 (…) foi introduzida, no artigo 82.º da Constituição, uma alteração onde precisamente, por dúvidas de compatibilidade com a solução que a Constituição consagrava com o ordenamento comunitário, foi afastada a hipótese de expropriação sem indemnização, por se entender exactamente que se tratava de um confisco."

No seu depoimento o Sr. Deputado António Vitorino referiu ainda que:

"(…) o acordo de Setembro de 1996 com a EDP permitiu retirar a EDP deste processo. Penso sinceramente que isto é um ganho substancial para a posição do Estado, sobretudo na perspectiva da sustentabilidade da posição da EDP e da sua privatização (…). Até ao Verão de 1997, quando o APSS invoca dois argumentos de peso contra esta solução. O primeiro é a queixa de outros operadores na zona, de que uma solução deste género poderia falsear a concorrência - operadores portuários e não apenas portuários -, havendo uma referência a isso num ofício da APSS, dirigido ao Secretário de Estado Adjunto do MEPAT. Em segundo lugar, há um argumento, o da APSS e o do MEPAT, que é dizer que o plano de expansão do porto de Setúbal exige a mobilização de fundos do QCA III e a tomada de posse efectiva do cais da Mitrena por parte do porto de Setúbal, para poder integrar plenamente o cais da Mitrena no plano de expansão do porto de Setúbal. Portanto, a solução terá de ser a de encontrar um acordo com a Eurominas, para que o Estado possa apossar-se do cais e garantir a expansão do porto de Setúbal."

Estando claras as motivações que estiveram na origem da solução extra-judicial que pôs termo ao litígio existente entre a Eurominas e o Estado, e tendo em conta que os diversos processos judiciais cruzados interpostos pela Euromina contra o Estado não chegaram ao fim, não é possível no âmbito desta Comissão de Inquérito determinar quais foram ganhos que o Estado obteve com a conclusão deste processo por via extra-judicial que não obtivesse por via judicial. Em todo o caso, sempre se dirá que a obtenção de um acordo pela via extra-judicial veio permitir a certeza e segurança jurídicas na resolução do litígio entre as partes, afastando, assim, os efeitos negativos, nomeadamente no plano económico, necessariamente associados a uma eternização dos processos judiciais.
Assim, a única conclusão objectiva que é possível tirar é a de que a solução extra-judicial alcançada pelas partes, além de ter posto termo a um litígio que remontava a 1986, concorreu para afastar em definitivo o risco de uma condenação judicial do Estado e, simultaneamente, permitiu o desenvolvimento do Porto de Setúbal e Sesimbra. Neste contexto e, finalmente, tendo em conta que o valor da indemnização alvitrado à Eurominas, se situou abaixo do valor proposto pelo presidente do grupo de trabalho, Dr. Luciano Patrão, julga-se razoável e aceitável a actuação do Governo nesta matéria.