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23 DE JANEIRO DE 1991

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tradição ortográfica portuguesa, que o acento agudo, nestes casos, apenas assinalava a tonicidade da vogal e não o seu timbre, visando assim resolver as diferenças de pronuncia daquelas mesmas vogais.

A inviabilização prática de lais soluções leva-nos à conclusão dc que não £ possível unificar por via administrativa divergências que assentam cm claras diferenças de pronúncia, um dos critérios, aliás, em que se baseia o sistema ortográfico da língua portuguesa.

Nestas condições, há que procurar uma versão de unificação ortográfica que acautele mais o futuro do que o passado e que não receie sacrificar a simplificação também pretendida em 1986, cm favor da máxima unidade possível. Com a emergência de cinco novos países lusófonos, os factores de desagregação da unidade essencial da língua portuguesa far-se-ão sentir com mais acuidade e também no domínio ortográfico. Neste sentido importa, pois, consagrar uma versão de unificação ortográfica que fixe e delimite as diferenças actualmente existentes e previna contra a desagregação ortográfica da língua portuguesa.

Foi, pois, lendo presentes estes objectivos que se fixou o novo texto dc unificação ortográfica, o qual representa uma versão menos forte do que as que foram conseguidas em 1945 e 1986. Mas ainda assim suficientemente fone para unificar ortograficamente cerca de 98 % do vocabulário geral da língua.

3. Forma e substância do novo texto.

O novo texto dc unificação ortográfica agora proposto contém alterações dc forma (ou estrutura) c dc conteúdo, relativamente aos anteriores. Pode dtiet-se, simplificando, que em lermos dc estrutura se aproxima mais do acordo dc 1986, mas que cm termos de conteúdo adopta uma posição mais conforme com o projecto de 1975 atrás referido.

Em relação às alterações de conteúdo, elas afectam sobretudo o caso das consoantes mudas ou não articuladas, o sistema de acentuação gráfica, especialmente esdrúxulas, c a hifenacão.

Pode dizer-sc ainda que, no que respeita às alterações dc conteúdo, de entre os princípios em que assenta a ortografia portuguesa se privilegiou o critério fonético (ou da pronúncia) com um certo detrimento para o crilério etimológico.

É o crilério da pronúncia que determina, aliás, a supressão gráfica das consoantes mudas ou não articuladas, que sc tom conservado na ortografia lusitana essencialmente por razões de ordem etimológica.

É também o critério da pronúncia que nos leva a manter um certo número dc grafias duplas do tipo de caráter c carácter, facto e fato, sumptuoso e suntuoso, etc.

É ainda o critério da pronúncia que conduz à manutenção da dupla acentuação gráfica do tipo de económico c econômico, efémero e efêmero, género c gênero, génio c gênio, ou dc bónus e bônus, sémen c sêmen, ténis c tênis, ou ainda de bebé c bebê, ou metro c metrô, etc.

Explicilam-sc cm seguida as principais alterações introduzidas no novo texto dc unificação ortográfica, assim com a respectiva justificação.

4. Conservação ou supressão das consoantes c, p, b, g, m e t em certas sequências consonanticas (Base IV).

4.1 Estado da questão. Como é sabido, uma das principais dificuldades na unificação da

ortografia da língua portuguesa reside na solução a adoptar para a grafia das consoantes c c p, em certas sequencias consonanticas interiores, já que existem fones divergências na sua articulação.

Assim, umas vezes, estas consoantes são invariavelmente proferidas cm todo o espaço geográfico da língua portuguesa, conforme sucede em casos como compacto, ficção, pacto; adepto, aptidão, núpcias, etc.

Ncslc caso, não existe qualquer problema ortográfico, já que lais consoantes não podem deixar dc grafar-se [v. Base IV, n .* 1, alínea a)].

Noutros casos, porém, dá-sc a situação inversa da anterior, ou seja, lais consoantes não são proferidas em nenhuma pronúncia culta da língua, como acontece em acção, afectivo, direcção, adopção, exacto, óptimo, cie. Neste caso existe um problema. É que na norma gráfica brasileira há muito estas consoantes foram abolidas, ao contrário do que sucede na norma gráfica lusitana, em que tais consoantes sc conservam. A solução que agora se adopta [v. Base IV, n.9 I.9, alínea b)] é a dc as suprimir, por uma questão dc coerência e de uniformização dc critérios (vejam-se as razões dc tal supressão adiante, no n." 4.2).

As palavras afectadas por tal supressão representam 0,54 % do vocabulário geral da língua, o que é pouco significativo cm termos quantitativos (pouco mais dc 600 palavras cm cerca dc 110000). Este número é, no entanto, qualitativamente importante, já que compreende vocábulos dc uso muito frequente (como, por exemplo, acção, actor, actual, colecção, colectivo, correcção, direcção, director, electricidade, factor, factura, inspector, lectivo, óptimo, etc).

O terceiro caso que se verifica relativamente às consoantes cep diz respeito à oscilação de pronúncia, a qual ocorre umas vezes no interior da mesma norma culta (cf., por exemplo, cacto ou cato, dicção ou dição, sector ou setor, etc), outras vezes entre normas cultas distintas (cf., por exemplo, facto, receção em Portugal, mas fato, recepção no Brasil).

A solução que se propõe para estes casos, no novo texto ortográfico, consagra a dupla grafia [v. Base TV, n.B l.e, alínea c)J.

A estes casos de grafia dupla devem acresccnlar-sc as poucas variantes do tipo de súbdito e súdito, subtil e sutil, amígdala c amídala, amnistia e anistia, aritmética c arimélica, nas quais a oscilação da pronúncia sc verifica quanto às consoantes b, g, m e /, (v. Base IV, n.s 2.').

O número de palavras abrangidas pela dupla grafia é dc cerca dc 0.5 % do vocabulário geral da língua, o que é pouco significativo (ou seja, pouco mais dc 575 palavras em cerca de 110 000), embora nele sc incluam também alguns vocábulos de uso muito frequente.

4.2 Justificação da supressão de consoantes não articuladas [Base IV, n> 1.', alínea b).)

As razões que levaram à supressão das consoantes mudas ou não articuladas em palavras como ação (acção), ativo (activo), diretor (director), ótimo (óptimo) foram essencialmente as seguintes:

a) O argumento dc que a manutenção dc tais consoantes sc justifica por motivos de ordem etimológica, permitindo assinalar melhor a similaridade com as palavras congéneres das outras línguas românicas, não tem consistência. Por um lado, várias consoantes etimológicas se foram perdendo na evolução das palavras ao longo da história da língua portuguesa. Vários são, por outro lado, os exemplos de palavras deste tipo pertencentes a diferentes línguas românicas que, embora provenientes do mesmo étimo latino, revelam incongruências quanto à conservação ou não das referidas consoantes.

É o caso, por exemplo, da palavra objecto, proveniente do latim objeclu-, que até agora conservava o c, ao contrário do que sucede cm francês (cf. objet) ou em espanhol (cf. objeto). Do mesmo modo projecto (de projectu-) manlinha até agora a grafia com c, tal como acontece cm espanhol (cf. proyectó), mas não em francês (cf. projet). Nestes casos o italiano dobra a consoante, por assimilação (cf. oggetto c progelto). A palavra vitória há muito sc grafa sem c, apesar do espanhol vicloria, do francês vicloire ou do iuliano Vittoria. Muitos outros exemplos se poderiam citar. Aliás, não tem qualquer consistência a ideia de que a similaridade do português com as outras línguas românicas passa pela manutenção dc consoantes etimológicas do tipo mencionado. Con-frontem-sc, por exemplo, formas como as seguintes: porl. acidente (do lat. accidenle-) esp. accidente, fr. accident, accidente, porl. dicionário (do lai. dictionariu-), esp. diccio-nário, fr. diclionnaire, iL dizionario, porL ditar (do lai. dic-lare), esp. dictar, fr. dicter, it. deitare, port. estrutura (dc structura-), esp. eslructura, fr. structure, iL slruttura, etc.

Em conclusão, as divergências entre as línguas românicas, neste domínio, são evidentes, o que não impede, aliás, o imediato reconhecimento da similaridade entre tais formas. Tais divergências levantam dificuldades à memorização da norma gráfica, na aprendizagem destas línguas, mas não é com certeza a manutenção de consoantes não articuladas cm português que vai facilitar aquela tarefa;

b) A justificação dc que as ditas consoantes mudas travam o fechamento da vogal precedente também é dc fraco valor, já que, por um lado, se mantêm na língua palavras com vogal pré-tónica aberta, sem a presença de qualquer sinal diacrítico. como em corar, padeiro, oblação, pregar (fazer uma prédica), etc, c, por outro, a conservação dc tais consoantes não impede a tendência para o cnsurdccimcnlo da vogal anterior cm casos como accionar, actual, actualidade, exactidão, ladear, ele;

c) É indiscutível que a supressão deste üpo dc consoantes vem facilitar a aprendizagem da grafia das palavras cm que cias ocorriam.

Dc facto, como é que uma criança de 6-7 anos pode compreender que cm palavras como concepção, excepção c recepção, a consoante não articulada é um p, ao passo que em vocábulos como correcção, direcção, objecção, tal consoante é um c?