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II SÉRIE-C — NÚMERO 12

considerar-se como continuando em vigor» —ob. cil), prevê no artigo 8.° a «responsabilidade pelos prejuízos especiais e anormais resultante do funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente perigosos ou de coisas e actividades da mesma natureza» independentemente do apuramento de culpa de quaisquer titulares de órgãos ou de agentes.

A responsabilidade funda-se objectivamente no risco da actividade exercida por serviços do Estado.

39.3 — A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, por actos de gestão pública, rege-se ainda pelo Decreto-Lei n.° 48 051, de 21 de Novembro de 1967.

Esta responsabilidade decorre de um facto (acto ou omissão) culposo, praticado por órgão ou agente da Administração no exercício das suas funções e que, por causa desse exercício (nexo de causalidade) ofende (dano) direitos de terceiros ou desrespeita normas legais que visam protegê--los (ilicitude).

A culpa é apreciada nos termos do Código Civil e os titulares dos direitos ofendidos devem ser indemnizados pelos danos sofridos e provados.

Posto isto, e não obstante não ter agido a Administração segundo critérios de diligência e cuidado pressupostos pela actividade de risco em questão, não deixo de ponderar a questão da determinação de um nexo de causalidade.

Desconhecendo ainda os resultados das autópsias mas considerando provável que entre as causas das mortes figure a intoxicação alumínica crónica ou aguda, é possível desde já estabelecer a alta probabilidade daquele nexo entre os problemas da água deficientemente tratada na UH com todas ou algumas das mortes dos IRC assistidos no HDE.

Todavia, se não viesse a ser possível a demonstração de um nexo de causalidade entre as apontadas condutas da Administração e as mortes já verificadas de 22 IRC, bem como as lesões provocadas nos sobrevivos, ficariam estes e os familiares daqueles numa posição de manifesta fragilidade.

Neste tipo de casos, vem a doutrina reconhecendo a necessidade áevulnerabilizar o ónus da prova Como afirma Sinde Monteiro («Aspectos particulares da responsabilidade médica», in Direito da Saúde e Bioética, ed. Lex, 199t, Lisboa, p. 147), «pode entender-se que a criação de um risco injustificado ou o agravamento dos riscos culposamente provocados pelo acto médico são um fundamento válido para aligeirar a prova do nexo causal, podendo conduzir à inversão do ónus».

Todavia, a prova do nexo causal por quem invoca o direito a uma indemnização por actos de gestão pública ilícitos, tornar-se-ia, na situação vertente, lenta e demasiado onerosa.

E, contudo, face às circunstâncias, deve sublinhar-se o posicionamento, em desfavor do Estado, dos seguintes aspectos:

d) A posição débil, de quase sujeição, dos doentes que fazem regularmente hemodiálise, a qual lhes restringe intensamente qualquer domínio de facto sobre os citados actos médicos e sobre os demais actos de gestão pública conexos — impondo, assim, uma necessária cedência da regra geral sobre o ónus da prova, em termos equitativos;

b) O não cumprimento de deveres de cuidado quanto aos riscos inerentes, designadamente a utilização de água da rede não tratada, indiciando negligência.

Não pode por isso ficar dependente do apuramento de eventuais culpas dos agentes do Estado a imediata assunção

por este, como pessoa de bem que é, da sua responsabilidade pela indemnização das vítimas.

Nem tal assunção prejudica as simultâneas ou posteriores diligências tendentes ao apuramento da existência de actos ou omissões culposas dos indivíduos ao serviço do Estado.

Apurando-se a culpa, haverá então lugar à aplicação do regime do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 48 051, e eventualmente ao direito de regresso, previsto no n.° 2.

Não se apurando culpas individuais, aplicar-se-á integralmente o princípio da existência de faute du service ficando o Estado como único responsável perante as vítimas.

39.4 — A tudo isto ainda poderá acrescer a responsabilidade por omissão quanto à não publicação de normas • regulamentares ou legislativas que determinassem a aplicação de conhecimentos científicos, técnicos e de apoio logístico adequados à correcta e segura prestação de assistência médica.

A ideia de responsabilidade do Estado por omissões legislativas Ou regulamentares, mesmo fora do âmbito da inconstitucionalidade por omissão, encontra suporte no artigo 22.° da Constituição. Neste sentido, pode afirmar-se, com Rui Medeiros (in Ensaio Sobre a Responsabilidade Civil do Estado por Actos Legislativos, Livraria Almedina, Coimbra, 1992, p. 353) que:

Os danos devem ser imputados à Administração quando o órgão ou agente administrativo goza de liberdade na fixação do conteúdo do acto ou regulamento ou pode, inclusivamente, não o emitir. Assim, havendo discricionariedade da escolha ou da decisão, o lesado pode fundamentar o seu pedido de indemnização não só na Constituição mas também nos preceitos legais que regem a responsabilidade objectiva da Administração.

39.5 — O meio processual adequado ao estabelecimento do direito e do valor da indemnização decorrente da responsabilidade do Estado seria a acção civil interposta no tribunal administrativo competente.

Mas a onerosidade e delonga habitual nessas acções não se compadece com a situação anímica e social fragilizada dos doentes sobrevivos e dos familiares dos falecidos.

O Estado, enquanto pessoa de bem, deve providenciar um outro meio-mais expedito e isento para determinar e fazer pagar os valores das indemnizações que venham a ser devidas, bem como prestar o indispensável e imediato apoio social.

É assim juridicamente indispensável e eticamente aconselhável a procura urgente pelo Estado de uma solução adequada ao ressarcimento célere e justo das vítimas da negligência da Administração (directa, indirecta e autónoma).

Tal como para os seropositivos infectados na sequência de tratamentos com sangue ou seus derivados, também no presente caso se justifica a previsão da celebração de convenções de arbitragem, posteriores à frustração dos resultados da intervenção da comissão adiante preconizada, julgando os árbitros sem prejuízo do direito ao recurso constitucionalmente consagrado.

V — Conclusões ,

40 — De acordo com o que ficou exposto e em nome da atribuição constitucional que lhe é conferida de conduzir à prevenção e reparação de injustiças (artigo 23.°, h.° 1, da CRP),

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