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0166 | II Série C - Número 015 | 03 de Agosto de 2002

 

O povo português assume os valores da paz, da independência nacional, da liberdade e da justiça social e tem lutado por eles com grande vontade nacional, mostrando-se disponível e solidário para o seu reforço. Mesmo em casos como o de Timor Leste - terra longínqua, esquecida, pobre e sacrificada - revelou a sua afeição àqueles valores e tem aceitado os encargos adicionais que tal comporta.
Do que atrás se diz, pode concluir-se que embora existam algumas vulnerabilidades (média riqueza do solo e subsolo, dependência energética e em bens essenciais, estreiteza do território, atraso económico e social, crescente influência do capital estrangeiro, reestruturação atrasada nas Forças Armadas), as potencialidades (vasta ZEE, situação estratégica global, densidade populacional, condições democráticas, vontade nacional, condições para aumentar a produção de alimentos se necessário, larga comunidade linguística), carecendo de ser persistente e coerentemente desenvolvidas, superam as vulnerabilidades e podem constituir - se devidamente aproveitadas e se forem alteradas as políticas - uma base credível de desenvolvimento integrado.
Portugal não enfrenta, como certos países europeus, condicionalismos territoriais, populacionais, político-constitucionais, geográficos ou outros, que possam constituir-se, à partida, em fatalismo de vir a perder a independência ou de ter de se integrar forçosamente numa ou várias organizações internacionais para poder sobreviver como nação soberana. Portugal é viável e, com uma política integrada e adequada de defesa nacional, não correrá o risco de vir a colocar-se na posição de país exíguo. Num mundo em que aumentam as interdependências, Portugal tem - e pode aumentar - capacidade de intervenção, de autonomia de estratégia e de decisão (excluído que seja a forma obsoleta de nacionalismo autárcico). Portugal carece de desenvolver uma estratégia permanente, esforçada e coerente de redução das vulnerabilidades e de reforço das potencialidades, no quadro do primado dos interesses nacionais.

III
Situação internacional

O exame da situação internacional abrange preferencialmente as zonas mais directamente relevantes para efeito da elaboração do CEDN.
Essas zonas são aquelas em que Portugal se insere directamente, com as quais tem proximidade, para as quais apareça com alegado valor estratégico e aquelas com as quais desenvolve laços específicos de cooperação e amizade. Estão no primeiro caso a Europa e, em particular, a Península Ibérica; no segundo caso, o Magrebe e, em geral, o Mundo Árabe; no terceiro caso, os Estados Unidos; e, no quarto caso, os países de língua oficial portuguesa. Nalgumas dessas zonas, o exame conhece dificuldades decorrentes de processos em curso com rumo e desenlaces incertos.
A Europa mudou radicalmente. A uma Europa dividida em dois blocos (NATO e Pacto Varsóvia) sucedeu uma outra, onde um dos blocos (o Pacto Varsóvia) se extinguiu (política e militarmente) e o principal país que o integrava (a URSS) se desagregou.
Não foi por acaso que, imediatamente, começaram a surgir as chamadas "crises de média intensidade", com intervenções armadas poderosas e sofisticadas (Golfo, Bósnia, Kosovo, Tchetchénia, etc.), deslocações maciças de populações, chacinas, propaganda despudorada, ultrajes ao direito internacional.
Na Alemanha, a RFA anexou a RDA e, através de acordos múltiplos, fez cessar completamente o estatuto que lhe decorria da II Grande Guerra. A Alemanha aparece, hoje, no Centro da Europa, como uma grande potência (económica, financeira, populacional) e já participa com tropas em acções externas (Kosovo). A sua influência, nestes últimos 17 anos, estendeu-se e abrange hoje a Áustria, a República Checa, a Eslováquia, a Croácia, a Eslovénia, o Montenegro, a Macedónia, o Kosovo, parte da Bósnia, parte da Suíça, a Voivodina e mantém relações objectivas com descendentes de alemães que vivem nas regiões que pertenciam ao III Reich e que, pela derrota deste, couberam à Polónia.
Com as adesões em curso, o estatuto de neutralidade e não-alinhamento de vários países (Áustria, Suécia, Finlândia, Suíça) tende a ser apagado, em benefício da política de blocos e, como tal, a perder mais um factor de estabilidade.
A NATO, onde os EUA exercem uma hegemonia esmagadora que lhes permite usar a organização ou apenas invocá-la, escolher aliados e atribuir-lhes missões, engrandece-se face ao desaparecimento do outro bloco e aparece com uma estratégia ofensiva, procurando arvorar-se não só em polícia da "paz interna" (substituindo as funções dos sistemas de segurança) como em sistema de "defesa" contra ameaças externas, vindas agora, não do Leste, mas de qualquer azimute (reformulação doutrinária). Este processo tornou-se mais nítido em resultado do 11 de Setembro e uma nova reorganização está em curso no seio da NATO, cujos traços essenciais, embora ainda pouco nítidos, perspectivam o reforço do comando e controlo por parte dos EUA.
O norte da Itália já não constitui a chamada "fronteira oriental da NATO". Agora, transfigurada que foi a Albânia em autêntica base dos EUA e quase-protectorado deste país, a influência da NATO estende-se em direcção ao Cáucaso e ao Mar Negro.
Para este novo papel da NATO contribuiu poderosamente a situação de guerra no Golfo e a campanha do Afeganistão, conduzidas pelos EUA, que demonstraram capacidade de pressionar e de pôr ao seu serviço não só as Forças Armadas europeias e de outros países do mundo, como instituições de segurança, como a ONU. E conseguiram um objectivo estratégico que há mais de quarenta anos os ingleses e franceses procuravam e que a Liga Árabe sempre impedia: ter uma base militar dominando os poços de petróleo (Arábia Saudita). E, agora, bases e pontos de apoio militares na área estratégica que domina o sudoeste da Rússia, o sul da China, a Índia e Paquistão, o gasoduto e instalações de experiências nucleares.
Os exemplos da Bósnia e do Kosovo são paradigmas da doutrina americana pós-reunião de Washington (24 de Abril de 1999). Ficou claro, com o novo conceito estratégico da NATO, que os EUA se arrogam o direito de fazer a guerra lá onde os seus interesses vitais o exigirem, com a ONU, sem esta ou mesmo contra esta organização de segurança, através da NATO ou sozinhos.
Neste quadro, a própria OSCE corre grave risco, já que está a ser hegemonizada pelos EUA, Reino Unido e Canadá e somente é activada quando interessa ampliar apoios.
Teóricos, políticos e opinion-makers tentam defender a necessidade da legalização de um "direito-dever de ingerência humanitária", o qual, aproveitando-se de quadros dramáticos, quantas vezes confusos e até forjados, poderia conduzir à autorização de intervenção de Forças de Interposição ou mesmo de Imposição pelo Conselho de Segurança, sem a solicitação ou autorização de país soberano. Relevante é, neste contexto, o accionamento pela primeira vez do artigo 5.º do Tratado constitutivo da NATO.
O processo de desarmamento, através do tratado INF, do tratado CFE e do tratado START, tem tido muitos recuos e alguns desvios e avanços; paradoxalmente a França, os EUA, a China e a Índia reactivaram as experiências com bombas nucleares subterrâneas; os EUA relançaram, em força, a IDE (mesmo ao arrepio de 138 nações que, em Novembro de 2000, reafirmaram o Tratado Espacial de 1967, entre elas várias da NATO) e aumentam substancialmente o orçamento militar, agora também a pretexto dos "acontecimentos