em acta. V. Ex.ª recordar-se-á que eu respondi: "V. Ex.ª, que sabe tudo, saberá também disso."
Sr.ª Doutora, suponho que nós nunca falámos antes. Eu só conhecia V. Ex.ª porque é uma ilustríssima magistrada deste país, mas pelos jornais, se bem que V. Ex.ª também não me conheça, já que sou um Deputado mais ou menos anónimo deste país mas muito pouco dado a insinuações e muito zeloso do meu bom nome.
E porque ficou registado em acta, dito por V. Ex.ª, se eu não seria uma dessas pessoas, gostava que V. Ex.ª, também como questão prévia, precisasse, para registar em acta, a que tipo de pessoas se referia, porque eu gosto de saber em que conta V. Ex.ª me tem, quanto mais não seja porque é o meu bom nome que está em causa, naturalmente. E se em algum momento V. Ex.ª, com essa intervenção, que acredito tenha sido mais emotiva, quis envolver-me com o que quer que seja, gostaria também de sabê-lo, quanto mais não seja para depois usar na minha defesa.
Voltando propriamente a esta matéria, Sr.ª Procuradora, quero relevar que quando falo com V. Ex.ª não falo com uma pessoa qualquer - como acontece, de resto, em relação ao depoente desta manhã -, pois V. Ex.ª foi Directora Adjunta na Polícia Judiciária, V. Ex.ª é uma ilustríssima magistrada do Ministério Público e, portanto, quando valoramos os seus actos e as suas declarações não podemos valorá-los como valoraríamos as declarações de um qualquer cidadão, porque V. Ex.ª está acima de um cidadão médio normal, V. Ex.ª é uma referência em algum ponto de vista.
Por isso, para efeitos de análise desses actos e desses comportamentos, vamos a factos e a documentos, por muito que V. Ex.ª, hoje, não os queira relevar.
Primeiro facto: V. Ex.ª demitiu-se, V. Ex.ª não foi demitida. Pelo fax do dia 27, V. Ex.ª apresentou a sua demissão do cargo a partir dessa altura.
O segundo facto inquestionável, Sr.ª Procuradora, é que, relevando este pedido de demissão, o Director Nacional da PJ deu "por finda, a seu pedido, a comissão de serviço que vinha sendo exercida" - isto também está demonstrado documentalmente.
Dois dias depois, no dia 29, V. Ex.ª confirmou junto do Director Nacional - isto é particularmente importante do meu ponto de vista, Sr.ª Procuradora -, que o pedido de demissão "relaciona-se única e exclusivamente com as questões de estratégia operacional respeitantes à organização da direcção central." À organização, repito, única e exclusivamente. E em organização estamos a falar de organigrama, estamos a falar de estrutura organizativa da direcção central.
V. Ex.ª conhece, até pela sua formação, o valor probatório dos documentos particulares, mas, mesmo assim, chamo aqui à colação o Prof. Antunes Varela, que escreve muito bem sobre a matéria e é muito claro até na relevância dos factos desfavoráveis, como V. Ex.ª sabe. E como sabe também, aqui aplica-se muita matéria processual.
Posteriormente, em 11 de Setembro de 2002, V. Ex.ª , uma vez mais, então em sede de 1.ª Comissão, disse: "os motivos originadores do meu pedido de demissão estão relacionados com questões de estratégia operacional respeitantes à organização da direcção central." Sublinho a expressão "à organização".
Não foi uma única declaração, feita de fugida, que V. Ex.ª proferiu algures, em parte incerta!… Foram declarações feitas na 1.ª Comissão, reiteradas, escritas e confirmadas por V. Ex.ª.
O mesmo afirmou à imprensa, que fez títulos tão sugestivos como Maria José Morgado rejeita politização da sua demissão e, que me conste, nunca vi V. Ex.ª desmentir publicamente estes títulos, embora agora pretendesse que a Ministra da Justiça viesse desmentir outros factos que, supostamente, a imprensa lhe terá imputado. Ou seja, pretendia para a Sr.ª Ministra da Justiça um comportamento diverso daquele que V. Ex.ª teve.
Continuando nessa notícia, nela se lê expressamente: "A Procuradora Adjunta Maria José Morgado, rejeitou ontem a politização da sua demissão da Polícia Judiciária, afirmando que a decisão deriva apenas de divergências técnicas e operacionais com o director Adelino Salvado". Aliás, nem sequer referiu a Ministra da Justiça ou o Ministro Paulo Portas; foi "com o director Adelino Salvado".
Isto leva-me, Sr.ª Procuradora, quanto à razão de fundo - aparte a questão prévia que lhe coloquei -, à primeira questão. É que das duas uma: ou V. Ex.ª, por razão de coerência, atenta inclusivamente a pessoa que é, mantém o que sempre afirmou, ou seja, que a sua saída se deveu a razões respeitantes à organização da direcção central - o que disse e repetiu insistentemente -, ou então V. Ex.ª entra aqui num processo de contradição que, devo dizer-lhe, parece quase que insanável a quem tenta analisar estes factos politicamente, dá o dito por não dito e isso a nós, que somos políticos, legitima uma conclusão - pelo menos a mim legitima, com toda a certeza -, a de que pelas suas declarações anteriores, escritas e reiteradas, efectivamente nunca houve politização alguma na demissão de V. Ex.ª. O que me parece haver já é politização na sua acção, Sr.ª Procuradora, desde que começou a contradizer-se com razões que não são conciliáveis com a sua posição anterior.
Assim, ou não houve politização no passado e V. Ex.ª é coerente com o que sempre afirmou, ou a partir da sua demissão, aí sim, há politização. E havendo politização, Sr.ª Procuradora, isso leva-me a pergunta-lhe se V. Ex.ª, desde que se demitiu, por si ou por interposta pessoa, tem mantido contacto com algum Sr. Deputado, aqui presente ou aqui ausente, sobre a matéria em discussão. E pondere bem nessa resposta, por razões que depois lhe explicarei, Sr.ª Procuradora Adjunta.
V. Ex.ª teve também uma expressão muito curiosa. A dado passo disse que o autor material da demissão de V. Ex.ª foi V. Ex.ª, mas que o autor moral não foi V. Ex.ª.
Sr.ª Procuradora, do decurso das suas longas intervenções nesta comissão verificamos que, em inúmeras ocasiões, o autor moral e o autor material da demissão de V. Ex.ª coincidiram apenas em V. Ex.ª. E dou-lhe como exemplo a dita reunião de 16 de Julho, onde lhe disse que já tinha decidido que iria demitir-se pelas razões que aqui apontou, sendo que depois, aí, não se demitiu. Ou seja, nesse momento o autor moral da demissão de V. Ex.ª foi V. Ex.ª e o autor material que não permitiu a demissão de V. Ex.ª, com a sua argumentação, foi o Director Nacional da PJ. E isso já não relevou V. Ex.ª!… E, também nesta parte, V. Ex.ª não pode ter dois pesos e duas medidas.
O que me leva também à questão do acompanhamento do caso Moderna, Sr.ª Procuradora!… Como estamos no âmbito do direito, sendo eu advogado e conhecendo relativamente bem o Código de Processo Penal, que me conste, esse processo está em fase de julgamento.
Ora, estando na fase de julgamento, o processo já não se encontra sob a dependência do Ministério Público e, assim sendo, não me parece que competisse ao Ministério