A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, esta é a terceira reunião em que a Comissão de Defesa Nacional se debruça sobre o orçamento e a segunda com a presença do Sr. Ministro da Defesa Nacional.
Ora, é a presença do Sr. Ministro na primeira reunião da Comissão que me faz suscitar uma questão, que não tem incidência orçamental directa mas tem incidência no relacionamento desta Comissão com V. Ex.ª, Sr. Ministro, no que diz respeito ao orçamento do Ministério para 2000.
Na última reunião, vários Deputados de diversos grupos parlamentares tiveram ocasião de colocar-lhe questões que vão desde o quadro conceptual da defesa nacional até às que decorrem da presidência portuguesa da União Europeia, que ocorre neste primeiro semestre, e que passam por uma articulação entre a União da Europa Ocidental, a União Europeia e a NATO - e, aliás, o último exercício CRISEX é elucidativo a esse respeito -, respectivamente, a definição de uma entidade europeia de segurança e defesa ou, na vertente da União Europeia, uma política europeia de segurança e defesa.
Colocámos-lhe, ainda, questões sobre a Lei de Programação Militar, sobre a Lei do Serviço Militar, sobre algumas rubricas inscritas em PIDDAC, mas a verdade é que o Sr. Ministro, que nunca tomou nota das perguntas que lhe foram feitas, raramente respondeu às questões e eu próprio, numa intervenção que fiz, tive ocasião de dizer que o Sr. Ministro tinha um "esquecimento selectivo", isto porque lhe creditava uma memória excelente, enquanto advogado e antigo Bastonário da Ordem dos Advogados. Só que, Sr. Ministro, enganei-me redondamente! V. Ex.ª tem um caso bem mais grave do que aquele que eu classificaria de "esquecimento selectivo". E por quê?
O Sr. Ministro esteve na Comissão de Defesa Nacional, no dia 8, e os jornais do dia 9, relatando aquela reunião da Comissão e citando declarações suas proferidas à saída da mesma, publicam uma notícia em que se diz que "o Ministro da Defesa, Júlio Castro Caldas, anunciou ontem, na Comissão Parlamentar de Defesa, que o Governo se prepara para adquirir dois aviões Airbus destinados à Força Aérea".
Ora, estive presente na reunião todo o tempo, mas nunca ouvi o Sr. Ministro falar na compra dos dois Airbus. O Sr. Ministro falou foi na dificuldade de projecção estratégica que tinham as Forças Armadas Portuguesas, mas, repito, em nenhum momento da reunião o Sr. Ministro se referiu à compra de dois Airbus.
Portanto, tem um caso gravíssimo, porque o seu esquecimento já não é em relação ao que ouve, é em relação ao que diz em sede de Comissão, o que é bem mais grave e pode pôr em causa o relacionamento da mesma com o Ministro. Julgo que não é interesse deste Governo, que se diz dialogante, que a situação que acabo de descrever volte a repetir-se.
Mas estamos a debater o orçamento do Ministério da Defesa, que o senhor próprio definiu como sendo o mínimo dos mínimos e com verbas diminutas. De facto, se atentarmos à despesa e aos valores da despesa consolidada do Ministério da Defesa, verificamos que passam de 4,3% para 3,9% do total da despesa da Administração Central, e relembro que, em 1996, aquela percentagem era de 4,8%.
Igualmente, no que toca à despesa em relação ao PIB, mantém-se a percentagem de 1,6%, como era em 1999, mas a diferença já vem a cair desde 1996 - 1,8%, em 1996; 1,7%, em 1997; 1,7%, em 1998. A tendência é, pois, de decréscimo. Aliás, na expressão do Sr. Deputado Marques Júnior, na Europa, quer-se que a despesa com a Defesa ascenda a um mínimo de 1,8% do PIB.
Por outro lado, o grave é que o orçamento do Ministério da Defesa Nacional para 2000 está abaixo da execução do orçamento para 1999, porque a estimativa de execução deste último era de 347 milhões de contos, muito acima do orçamentado, que era 320 milhões de contos, e abaixo dos 336 milhões de contos que ora estão inscritos no orçamento.
Outro elemento agravante deste orçamento tem a ver com as despesas de funcionamento normal por agrupamentos, e refiro-me às despesas do pessoal que aumentam e às de manutenção e funcionamento que baixam. Se queremos ter umas Forças Armadas devidamente operacionalizadas, estes montantes não me parecem de facto significativos.
Ora, foram estes três indicadores que levaram a Comissão de Defesa Nacional, todos os partidos que a compõem, em jeito de apreciação final do orçamento apresentado por V. Ex.ª a este Parlamento, a tecer os seguintes considerandos: primeiro, o orçamento do Ministério da Defesa Nacional não reflecte integralmente os próprios considerandos das Grandes Opções do Plano. Isto porque os números que acabo de referir não podem, de maneira alguma, reflectir aquilo que o Sr. Ministro pretende como medidas organizacionais - o desenvolvimento das acções de treino e formação necessárias ao máximo desempenho e prontidão das Forças Armadas; o prosseguimento das melhorias de infra-estruturas e da reorganização do funcionamento das instalações militares, com vista à adaptação qualitativa e ao recrutamento de base voluntária e de contrato. Na verdade, este orçamento não reflecte integralmente os próprios considerandos das Grandes Opções do Plano.
Segundo, o orçamento do Ministério da Defesa Nacional, ao procurar acompanhar as novas exigências internacionais de Portugal, levanta dificuldades ao cabal cumprimento das missões das Forças Armadas. Tanto assim é que, em recente encontro que tivemos com o Sr. Chefe do Estado-Maior do Exército, o General Martins Barrento, ele próprio referia que o orçamento do Exército era exíguo e que apenas se socorria das verbas consignadas em Lei de Programação Militar, o que é grave, Sr. Ministro.
Terceiro, a aposta no reequipamento das Forças Armadas, na manutenção e funcionamento do seu equipamento e as melhorias salariais dos nossos militares, tão necessárias à dignificação da respectiva carreira, não se encontram devidamente reflectidas neste orçamento.
Este é, claramente, um relatório que reflecte um alerta da Comissão da Defesa Nacional. Aliás, é assim que eu entendo o significado destes considerandos, votados por todos os partidos, porque nós não queremos, como a Espanha está a fazer, diminuir o coeficiente intelectual exigido para acesso às Forças Armadas e não queremos que o dinheiro consignado na Lei de Programação Militar seja utilizado em funcionamento e manutenção das Forças Armadas.
Mas, já que estamos aqui, em sede de especialidade, a discutir o orçamento, tenho algumas questões para colocar-lhe, Sr. Ministro, desde logo, a da alienação do património das Forças Armadas.