Todos estes dados são, em nosso entender, preocupantes - e o Sr. Ministro das Finanças dir-nos-á se é assim ou não - e, no decurso do debate do Orçamento do Estado no Parlamento, parecem, infelizmente, vir confirmar algumas das críticas que aqui foram feitas, nomeadamente pelo PSD, em relação ao quadro macroeconómico que serviu de base à elaboração do Orçamento do Estado.
Em relação ao consumo, verifica-se que estes últimos dados demonstram uma redução do mesmo. Há, por exemplo, uma redução drástica do número da venda de automóveis ligeiros, que, em Outubro deste ano, desceu 14,7% em relação a Outubro do ano anterior. Este é um dado que, normalmente, tem muito a ver com a forma como o consumo está a decorrer no País. Por outro lado, a taxa de inflação, em relação à taxa homóloga de Outubro do ano passado, cresceu 4,1%, sendo a variação média anual de 4,4%, devido ao facto de em Setembro ela ter sido de 4,3%, o que levou a um acréscimo.
Recentemente, o Governo aumentou, para 2002, o salário mínimo nacional em 4,1% para o regime geral e em 6,4% para o serviço doméstico. É evidente que o salário mínimo nacional poderá nada ter a ver com o resto, mas o Governo prevê uma taxa de inflação de 2,7% e um crescimento dos salários tal que os aumentos ficam abaixo do crescimento do salário mínimo nacional.
Portanto, a questão que se coloca ainda é a mesma. Face a estes dados de conjuntura que temos e face a estes elementos, o Governo ainda acredita que o aumento previsto para os salários é, efectivamente, aquele que prevê no Orçamento do Estado? Isso não corresponderá, face a todos esses dados, a uma efectiva diminuição do poder de compra dos trabalhadores, nomeadamente dos da função pública, que serão os principais prejudicados, e, segundo parece, cada vez mais, com esta situação?
Uma outra pergunta, que vem na sequência desta, é a seguinte: se se prevê para o IRS e outros impostos, em termos de taxa, um crescimento da ordem dos 2,7%, que é a taxa de inflação, não corresponderá esse aumento da taxa a um aumento efectivo dos impostos? Porque, se a taxa de inflação for efectivamente maior, se os aumentos salariais forem efectivamente maiores, os trabalhadores por conta de outrem vão pagar mais impostos. Portanto, o que gostava de saber é se, com este quadro, com esta previsão, os trabalhadores não vão efectivamente pagar mais impostos.
No entanto, esses dados que surgiram recentemente são extremamente gravosos, principalmente no que respeita à receita. Vem-se a confirmar que, efectivamente, as receitas fiscais não estão a atingir aquilo que o próprio Governo previa quando elaborou o Orçamento do Estado para 2002, e, portanto, não se estão a verificar os elementos que permitiram ao Governo traçar o quadro macroeconómico que traçou.
Ainda segundo os dados que surgiram agora, a taxa de crescimento da despesa corrente primária até Outubro cresceu 7,9% em vez dos 5,8% que o Governo previa no Orçamento para 2002 em relação à execução de 2001. Ou seja, previa-se um crescimento da despesa corrente primária até Outubro de 5,8%, mas neste momento está nos 7,9%. Logo, só a despesa com pessoal cresceu, como eu disse há pouco, até Outubro de 2001, 10,2%. Por outro lado, a receita fiscal de 2001 será claramente inferior àquela que foi prevista no Orçamento rectificativo.
Face a todos estes dados, apesar de o Ministério das Finanças já ter anunciado a apresentação de um outro Orçamento rectificativo, pergunta-se: como é que podemos estar a discutir o Orçamento para 2002 sem termos os dados concretos da execução de 2001? Porque, para o discutirmos, temos de partir de uma base concreta, que terá de ser essa execução de 2001. Ora, como ainda não sabemos quais são os termos do Orçamento rectificativo, penso que o mais razoável, da parte do Ministério e para o Parlamento, seria apresentar o Orçamento rectificativo, para o discutirmos e votarmos, ficando-se assim na posse de todos os dados, e só depois se procederia à discussão e votação do Orçamento do Estado para 2002.
Em suma, segundo estes últimos dados, há uma baixa no consumo privado, uma redução do investimento e, também, do consumo público, pergunto: como é que o Sr. Ministro acredita que este Orçamento para 2002 vá chegar, em matéria de previsões, aos resultados que pretendidos? O Sr. Ministro disse que previsões são previsões, mas seria importante que, pelo menos, o Governo, na proposta de lei do Orçamento, acertasse nessas mesmas previsões.
Por outro lado, aquando da apresentação do programa da reforma da despesa pública, há alguns meses atrás, em Junho de 2001, falou-se que o Governo pretendia limitar o crescimento da despesa corrente a 4%/ano. Agora, o Governo, na proposta do Orçamento do Estado, prevê um crescimento da despesa corrente primária em 4,2%. Estes dados recentes vêm dizer que, em relação à execução de 2001, só a despesa com pessoal cresceu 10,2% e que a despesa corrente primária cresceu quase 9%.
Assim, pergunto: face a este quadro, há ou não uma clara suborçamentação das despesas com o pessoal do serviço público administrativo? Se assim não é, qual é o valor efectivo da estimativa do crescimento da despesa corrente primária para 2002.
Voltando um pouco atrás, ainda em relação ao consumo privado, há um dado que, efectivamente, não se entende - e V. Ex.ª explicará a esta Câmara -, que é o seguinte: como é que continua a acreditar que as receitas do IVA crescerão 7,5%, em relação à execução de 2001? Aquando da primeira audição na Comissão, o Ministério das Finanças disse que se baseara em vários dados e elementos que possuía para chegar a estes valores, que tinha naturalmente os seus critérios. No entanto, pergunto se o Governo acredita efectivamente no aumento dessas receitas. Ou, melhor, face a este quadro, de uma diminuição do consumo, o que é que vai acontecer que permita ao Governo dizer que, em 2002, as receitas do IVA irão crescer 7,5%, em relação à estimativa e à execução de 2001.
Também gostava de colocar ao Sr. Ministro uma questão relacionada com a Lei de Finanças das Regiões Autónomas. O Orçamento do Estado está para ser votado, em votação final global, no fim da próxima semana. Neste momento, ainda não ocorreu nem a discussão nem a votação das alterações à Lei de Finanças das Regiões Autónomas, mas temos conhecimento de que a proposta de lei de alteração da Lei de Finanças das Regiões Autónomas já deu entrada no Parlamento. E, segundo me parece, há, nessa proposta de lei, uma definição concreta de critérios para vários aspectos, nomeadamente para o aumento da capacidade de endividamento das regiões autónomas.
Neste sentido, pergunto, muito claramente, ao Ministério das Finanças: o que é que vai vigorar para 2002? É aquilo que o Governo propõe como aumento da capacidade de endividamento e que consta da proposta de lei do Orçamento do Estado? Ou é, pelo contrário, aquilo que vai resultar das propostas de alteração que o próprio Governo faz à Lei de Finanças das Regiões Autónomas, e que, tanto quanto me parece de uma mera leitura, apontam para valores de outra ordem? O Sr. Ministro faz-me sinal de que não, mas, da