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26 | II Série GOPOE - Número: 009 | 16 de Novembro de 2005

Se é uma norma geral e abstracta, torpedeia directamente um dos institutos mais firmes, mais sustentados do nosso ordenamento jurídico que é o instituto da cessão de créditos. Esta norma, de uma forma muito enviesada, procura derrogar o instituto previsto no Código Civil, lei de valor reforçadíssimo, e que consigna a liberdade de cessão de créditos. Isto é, o credor é livre de ceder os seus créditos, bastando para tanto, em termos de eficácia, que notifique o devedor. Esta norma torpedeia, elimina, derroga de forma frontal este princípio.
Se se trata de uma norma «confeccionada» para atingir, em particular e em especial, uma instituição ou um conjunto de membros de uma determinada actividade económica, então, penso que, só por isso, seria motivo para a sua revogação enquanto proposta de lei a apresentar ao País, sob pena de desvio de poder, ou seja, sob pena de estarmos a servir-nos de um instrumento legal, de um instrumento orçamental, de uma proposta com força de lei, para alcançar fins que não são directamente do Estado português.
Temos muitas dúvidas — e daí a questão que vou colocar a V. Ex.ª — sobre a própria bondade económica desta medida, na perspectiva, uma vez enunciada por V. Ex.ª nesta Assembleia, acerca de ganhos extraordinários que estariam inerentes à actividade intermediária financeira da Associação Nacional de Farmácias, o tal 1,5% que pairava no âmbito desse debate e que chocaria V. Ex.ª ao ponto de ter anunciado previamente o aparecimento de uma norma neste sentido.
Sabemos que a situação dos acordos entre as farmácias e o Estado português não é de hoje, conhecemola desde, pelo menos, 1988. Mas penso que foi em 1998 que se gizou o principal acordo que visava evitar que o Estado português, de acordo com o que os tribunais então o tinham condenado, pagasse os juros de mora à taxa legal pelas dívidas em mora do Estado às farmácias.
O ano de 1998, penso, foi o momento em que se consolidou essa dívida e em que, pela primeira vez, se chegou a um entendimento no sentido de que seria perdoado ao Estado português o juro de mora legal e que este apenas teria de pagar às farmácias um juro convencional igual ou efectivamente incorrido por estas últimas no seu endividamento junto dos bancos. Creio que, basicamente, ainda é este sistema que está em vigor.
É um sistema segundo o qual, até ao segundo mês, o Estado não paga juros das dívidas que tem em relação às farmácias, entre o segundo e o quinto mês, paga o valor dos juros que as farmácias suportam junto da banca e, a partir do quinto mês, o Estado paga mais 1,5%.
A questão que coloco a V. Ex.ª é a de saber se, do ponto de vista da economia de meios e da economia do Estado, a derrogação deste acordo vigente com a Associação Nacional de Farmácias traz alguma vantagem económica para o Estado ou se a introdução desta norma visa tão-só criar condições para que o Estado português regresse ao tempo em que não pagava aos seus fornecedores.
Em resposta, V. Ex.ª considerará com certeza dois pressupostos. O primeiro é este: está o Estado português, durante o ano de 2005, a pagar algum juro suplementar — o tal 1,5% — acima dos juros bancários? Qual tem sido a média de encargos, em juros, que o Estado tem pago durante o ano de 2005? E, prevendo V.
Ex.ª, como anuncia no orçamento, que o Estado está em condições de pagar a 2,6 meses de vista em relação aos seus fornecedores, o pressuposto da mora também desaparece do cenário? Estes elementos são fundamentais para, por um lado, percebermos até onde V. Ex.ª pretende chegar com esta disposição proposta e, por outro, procurarmos entre todos encontrar, se houver vantagem económica para o Estado, uma redacção para esta norma, que não fira o ordenamento jurídico português e não torpedeie o instituto da cessão de créditos.
E veja V. Ex.ª que, no n.º 1 do artigo 8.º, os únicos negócios jurídicos aí previstos como anuláveis são aqueles que envolvem a eventual cobrança de juros convencionais. Ou seja, se esses mesmos negócios jurídicos envolverem a cobrança de juros legais, superiores e bem mais caros, já esta nulidade não ocorre.
Para nós, era fundamental que esta questão ficasse resolvida com toda a clareza.
A quarta questão tem a ver com a perspectiva em sede de recursos humanos na saúde. Alude-se, na proposta de lei de Orçamento e no seu Relatório, a um conjunto de transformações, anunciadas pelo Sr. Ministro da Saúde, em sede de reorganização dos serviços das administrações regionais de saúde, da extinção das sub-regiões de saúde e da transformação dos hospitais em entidades públicas empresariais. Todas estas transformações anunciadas por V. Ex.ª, de acordo com o Relatório do Orçamento, prevêem a constituição de excedentes de pessoal, em relação aos quais seria necessário introduzir reorientações profissionais.
Permita-me V. Ex.ª que lhe pergunte o que tem previsto em sede desta reorientação profissional, qual será a dimensão destes excedentes, qual a sua origem, o seu destino e de que meios orçamentais V. Ex.ª dispõe.
Uma outra questão, que não ficou bem explicada, nem está explicada no Relatório do Orçamento, tem a ver com a diminuição drástica das verbas destinadas ao investimento do Estado, ao ponto de se colocar em dúvida a manutenção da qualidade dos próprios serviços e haver o risco da diminuição da performance desses serviços.
E, em sede de investimento do Estado, há um caso concreto, que mereceria a atenção da parte deste grupo parlamentar e da parte de V. Ex.ª e que tem a ver com o hospital de Vila Nova de Gaia, uma promessa de V. Ex.ª, no sentido de que este hospital seria uma realidade já em 2009, ou seja, dentro de quatro anos. Tratase de um projecto em parceria público-privada, que, em princípio, não acarretaria grandes encargos para o Estado, a não ser na fase de estudo ou na fase de concepção e projecto, uma vez que libertaria terrenos que, em termos de mercado, permitiriam a realização dos fundos necessários à sua construção ou, pelo menos, à contrapartida estadual.