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21 DE ABRIL DE 1988 155

PCP seja aprovada, nos precisos termos do texto que aqui se encontra em discussão, julgo que haverá uma distorção completa daquilo que se quer tutelar a mais, ao se fazer a distingue entre a "violação dos direitos, liberdades e garantias", por um lado, e a "violação particularmente grave dos direitos, liberdades e garantias", por outro. Se apenas de pune a "violação particularmente grave", cairemos numa discricionariedade tal que haverá várias violações dos direitos, liberdades e garantias que poderão não ser graves e, por isso, não punidas. Julgo que esta expressão, com a consequente distinção, é perigosíssima, pelo que gostaria de saber quais as razões desta distinção em relação ao regime dos direitos, liberdades e garantias. Não encontro qualquer justificação para ela; vejo, sim, um perigo bastante grave - vou usar a expressão do PCP, mas ao contrário - em relação à tutela dos direitos, liberdades e garantias.

Quanto ao n.° 3 proposto, continuo a achar que é rigorosamente redundante em relação ao que se dispõe actualmente no artigo 22.° da Constituição qua tale. O n.° 3 proposto pelo PCP, além de conter a expressão "direitos, liberdades e garantias", fala em "interesses legalmente protegidos dos cidadãos", ou seja, acrescenta aquilo de que o artigo 22.° não contém a expressão: "interesses legalmente protegidos dos cidadãos". Pergunto: quando o artigo 22.° da Constituição refere, in fine, "violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem", não faz também uma distinção perigosíssima, em meu entender, em sede de regime dos direitos, liberdades e garantias, ou seja, interesses legalmente protegidos dos cidadãos, por um lado, e prejuízo para outrem, por outro lado. Não será a expressão "prejuízo para outrem" mais vasta do que "interesses legalmente protegidos"? E como, depois, concatenar as distinções que são feitas em sede dos n.ºs 2 e 3 da proposta do PCP?

Para concluir, diria que não só haverá redundância, por um lado, em relação aos n.ºs 2 e 3, como também, por outro, daria lugar a uma distinção.

Compreendo que se queira, de alguma forma, pormenorizar, mas que acaba ela própria por ter um efeito - passo a expressão - de boomerang, sendo, por isso, contraproducente.

O Sr. Presidente: - Gostaria também de fazer algumas perguntas ao Sr. Deputado José Magalhães acerca do sentido útil da proposta.

No que diz respeito ao n.° 2, a minha primeira dúvida é esta: é verdade que é possível interpretar o artigo 22.° da Constituição, na sua redacção actual, como dizendo apenas respeito à função executiva ou, quando muito, abrangendo a função executiva e a governativa e, portanto, não sendo aplicável à função legislativa e à jurisdicional. Isso teria algum conforto, por exemplo, no que diz respeito à função jurisdicional, no artigo 221.°, n.° 2, embora também seja possível uma interpretação diferente. Quando se diz, no artigo 221.°, n.° 2, da Constituição, que "os juizes não podem ser responsabilizados pelas suas decisões, salvas as excepções consignadas na lei", poderia admitir-se que esta expressão "lei" era utilizada em sentido lato e que uma das excepções resultava claramente do artigo 22.° Dir-se-á, porém, que uma certa orientação prevalecente na prática e até a maneira como o estatuto judiciário interpretou a responsabilidade dos juizes têm sido favoráveis a fórmulas restritivas de conceber o seu alcance no artigo 22.° Por consequência, uma das hipóteses possíveis da proposta do PCP seria, justamente, a de clarificar equívocos e dizer que este artigo 22.° é claramente também aplicável à função jurisdicional e à legislativa.

Por outro lado, se é verdade que, como há pouco foi referido pela Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves, é difícil, por vezes, conceber uma ofensa por parte das leis, porque falta a interpositio do acto concreto do Executivo, também é verdade que poderíamos aqui admitir que se estariam a clarificar igualmente aspectos relacionados com leis-medida, muito embora depois, ao abrigo do artigo 268.°, haja possibilidade de interpor recurso para defesa contra quaisquer actos, independentemente da sua forma. Essa hipótese também não é de excluir quanto aos efeitos negativos ou aos efeitos laterais dos actos normativos que possam ser prejudiciais, o que acontece nos regulamentos e também nas leis. Aliás, o Dr. Gomes Canotilho, por exemplo, tem um estudo bem interessante em que aborda esse tipo de questões.

Há, porém, um aspecto que me causa alguns engulhos. É que, ao dizer-se que a responsabilidade do Estado abrange as acções ou omissões praticadas no exercício das funções legislativa e jurisdicional e ao excluir-se a solidariedade - que ainda percebo em relação à função legislativa, mas já não em relação à função jurisdicional -, isso significa que parece querer encontrar-se uma fórmula que continue a garantir a irresponsabilidade dos juizes, mesmo em caso de violação particularmente grave dos direitos, liberdades e garantias. Isto é, esta não inclusão do inciso "solidariedade", "solidário" ou "forma solidária" pode inculcar um sentido diferente. E não sei se é esse sentido pretendido, que eu compreenderia em relação à função legislativa, sobretudo no que respeita ao parlamento, porque se torna muito difícil, obviamente, haver aí uma individualização da responsabilidade, mas já não em relação jurisdicional.

Depois, há uma outra razão, essa militando em favor do n.° 2 proposto pelo PCP. Como o Sr. Deputado José Magalhães sabe, há hoje fundadas dúvidas na doutrina acerca do carácter unitário do Estado, não no sentido do Estado unitário ou do Estado federal, mas no de as funções do Estado serem todas imputáveis à mesma pessoa colectiva, ou seja, de a função legislativa e a função jurisdicional serem imputáveis à pessoa colectiva Estado em sentido amplo. É que mesmo a doutrina clássica nunca conseguiu explicar muito bem o facto de o Estado ter relações consigo próprio - isto segundo a teoria clássica da impermeabilidade da pessoa colectiva, e tal não é admissível no caso de um processo em que de um lado está o juiz e do outro o Ministério Público. Foi sempre uma grande trapalhada. Mas, tendo isso em consideração, seria essa, porventura, uma vantagem para a aclaração dessa dificuldade.

Todavia, penso que, como o Sr. Deputado José Luís Ramos há pouco referiu, a expressão "particularmente grave", é algo que a torna pouco compreensível dentro dessa óptica, pelo que os seus termos deveriam ser justamente os do artigo 22.°, tratando-se apenas de uma extensão desse artigo. Nesse sentido, subscrevo inteiramente as considerações que o Sr. Deputado José Luís Ramos fez. É que, ainda por cima, quando se usa a expressão "violação particularmente grave", não se