404 II SÉRIE - NÚMERO 14-RC
A minha pergunta é, em suma, a seguinte: pode o PSD realmente dizer qualquer coisa em lermos de sim ou não quanto a esta maioria? Creio que vamos ter que esperar pelo próximo capítulo...
O Sr. Presidente: - Compreendo que V. Exa. lenha que - deixar registados em acta - obviamente que lhe estou a responder em relação à minha intervenção- os entendimentos que comprovem, de uma maneira inequívoca, o espírito com que o PCP participa nos trabalhos de uma revisão constitucional cujo pendor não lhe agrada. Entendo isso e julgo que e perfeitamente legítimo. Peço é que isso seja feito, se possível, apenas uma vez por reunião. Este é somente um pedido, não mais do que isso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso é liberticida!
O Sr. Presidente: - Não é liberticida, mas sim o respeito pela liberdade dos outros. Esta é a minha ideia, mas provavelmente não será essa a sua interpretação.
Sr. Deputado José Magalhães, tenho uma interpretação acerca do comportamento do PCP no que diz respeito à sua preocupação pelo modelo do Estado ligeiramente diferente daquela que o senhor me deu, mas talvez acabe, no fundo, por redundar na mesma coisa.
É evidente que nesta fase de transição em que nos encontramos o PCP está muito interessado em defender os aspectos da Constituição que defende, já sabemos que assim é. No terceiro milénio a situação do PCP será com certeza diferente, e então ele voltará à pureza dos princípios últimos ou dos objectivos iniciais.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Esperemos que não haja Estado nessa altura, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Ora bem, Sr. Deputado, isso foi outra coisa que me surpreendeu: é que a sua estatolatria está em profunda contradição com a ideia que agora expressou, que essa, sim, e radicalmente marxista.
O Sr. José Magalhães (PCP): - V. Exa. será o melhor juiz dessa questão marxista.
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, gosto muito de apreciar a ortodoxia marxista das pessoas que tem, em princípio e por dever de ofício, de a defender e por vezes não o fazem.
Quanto ao problema que me apresenta, devo dizer-lhe que não entendo que seja possível colocá-lo nesses termos. Estamos a discutir um problema de revisão constitucional, e não perfilho a sua interpretação acerca das propostas que virão a vingar em termos de legislação ordinária e que hão-de ser conformes à Constituição, senão, o Tribunal Constitucional anulá-las-á.
Ora, o que estamos neste momento a fazer e a tentar estruturar uma lei constitucional que saia desta revisão e que seja adequada. É isso que estamos a fazer, foi nesse sentido que recebemos, como o Sr. Deputado disse há pouco, o mandato, e não para tergiversarmos em matérias que introduzem uma polémica eventualmente muito importante, mas que não e o objecto desta nossa Comissão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Portanto, não respondeu à pergunta.
O Sr. Presidente: - Deixando esse "chapéu" de parte, tenho inscritos para usar da palavra os Srs. Deputados Carlos Encarnação e Jorge Lacão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, não sei se aquilo que vou dizer se justificará, porque, não tendo estado presente na primeira parte da reunião, não sei o que entretanto foi aqui referido. Penso que apanhei algumas coisas no ar - e porventura algumas delas serão repetidas -, mas gostaria de me dirigir aos Srs. Deputados José Magalhães e Almeida Santos tecendo um comentário às posições de ambos e delas extraindo também algumas conclusões em relação à posição do PSD perante a revisão da Constituição e outras questões que foram focadas.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que as posições do PSD e do PS face à opinião do PCP são profundamente diferentes. O PCP pretende ter tudo na Constituição, pretende que esta consista num texto denso e melodramático que evite quase que a legislação ordinária tenha espaço para se exprimir. Ao fim e ao cabo, o que deseja é que a legislação ordinária repita tudo o que está expresso na Constituição, o que é uma complicação, porque sempre que quisermos elaborar alguma peça de legislação ordinária teremos de repetir passo a passo o que estiver consignado no texto constitucional. Repetir-se-iam assim frequentemente alguns artigos. É exactamente isso o que tem acontecido e, porventura, o PCP gostaria que assim continuasse a acontecer. Temos uma visão diferente do que devem ser os princípios constitucionais a inserir na Constituição e as respectivas normas de execução. E esta confusão é tão grande no espírito do PCP que o leva a cometer outros excessos, tais como, por exemplo, o de atribuir poderes executivos à Assembleia da República. É evidente que o PCP - e voltando a uma observação anterior do Sr. Deputado José Magalhães - não pode nem nunca poderá estar numa cimeira, porque as suas concepções em relação às questões fundamentais são radicalmente diferentes das nossas.
Diria que as posições do Partido Socialista são posições que tem evoluído ao longo do tempo, e de forma sensível, designadamente no respeitante ao monopólio da televisão. A posição que o Sr. Deputado Almeida Santos agora perfilha é, segundo creio, fruto de uma elaborada construção ao longo do tempo no seio do PS, que muito prezamos e que nesta altura reflecte um pensamento diferente. Foi surgindo por força das circunstâncias, dos impactes tecnológicos, da realidade do mundo, dos princípios gerais que se verificam nas outras sociedades modernas e democráticas, e certamente tudo isso e mais alguma coisa leva a que o PS tenha nesta fase uma abertura diferente para considerar de outra forma questões essenciais que há algum tempo não considerava assim. É isto que nos faz dizer que nos congratulamos com a abertura do Partido Socialista em relação a algumas questões.
Relativamente ao serviço público mínimo, ou à questão do serviço público tal como é encarada pelo PS e pelo PSD, creio que, se e porventura uma temática de dimensão, é, mais do que isso - e friso a afirmação do Sr. Deputado Almeida Santos relativamente aos jornais -, uma questão de evidencia e também uma conclusão comparativa, decorrente das nossas duas posições, entre o que se passa nos países democráticos e o que se deve passar em Portugal. O Sr. Deputado Almeida Santos certamente não conhece jornais que concretamente façam parte do serviço público em qualquer democracia ocidental. Fazem parte desse serviço meios de comunicação social que, do ponto de vista tecnológico, aconselham a que realmente o serviço público neles seja exercido, mas o Sr. Deputado não verifica que esse serviço seja exercido nos jornais, a não ser que se considere - e nós também o poderíamos considerar, apenas por graça - que o Diário da República seja um jornal que consubstancie também o exercício de um serviço público mínimo, pelo menos em relação às obrigações gerais.