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15 DE JUNHO DE 1988 519

culposos-, que hão-de caracterizar-se não só por uma certa ilicitude como pelo facto de tornarem insuportável a manutenção da relação jurídico-laboral, nesse caso a relação jurídico-laboral cessa. Mas cessa já! Porquê? Porque há justa causa, no sentido pleno que ela tem na Constituição vigente! A proposta é, se visa só isto, inútil!

Terceiro patamar de raciocínio: se isto fosse consagrado, com os equívocos referidos, e como o normativo teria de ser mediado através da acção do legislador ordinário, correríamos o risco de o PSD ter, nesta matéria, a mesma capacidade interpretativa que revela em relação à cláusula contida no artigo 53.°, n.° 1 - isto é, nenhuma. Ter um conceito interpretativo de justa causa tão lato, tão lato, tão lato, que consideraria, por exemplo, justa causa ou, neste caso, violação do dever de fidelidade, tal qual aqui é (mal) desenhado, situações como as que caracterizam os tais mirabolantes e infindáveis comportamentos que constam do "pacote laborai" que hoje está a ser apreciado nas instâncias competentes de fiscalização de constitucionalidade, isto é, uma caterva de comportamentos que dificilmente se pode cogitar que caibam dentro do conceito de justa causa e, neste caso, dificilmente se poderia cogitar que coubessem dentro do conceito de dever de fidelidade. Ou seja, arriscávamo-nos a uma dupla perversão: em sede constitucional e em sede de legiferação ordinária - o que é um risco insuportável.

Ultimo patamar de raciocínio: que campo de aplicações viabilizaria a proposta do PSD? Admitamos que o legislador constitucional ou de revisão constitucional era suficientemente complacente para adoptar um conceito vago ou nulo e com estas dificuldades que situei; que o legislador ordinário o alargava, ou mesmo o mantinha dentro dos limites vastos que acabei de situar. Que campo de aplicação é que se abriria? O Sr. Deputado Costa Andrade foi claríssimo: é tão viciosa a concepção do PSD que o PSD até entende que têm carácter confessional empresas, sociedades comerciais, como é a Rádio Renascença, que prosseguem não um múnus apostólico, nem um múnus espiritual, mas actividades em que se misturem ou amalgamem realidades de índole diversa - desde o anúncio da bebida Tala-Tala, ou do produto Popo-Popo, ou de outra mercadoria qualquer, tudo isto misturado com a missa, com o múnus espiritual. Isto é, o PSD considera que um jornalista da Rádio Renascença (isso ficou na acta e é verdadeiramente espectacular!) poderia, no exercício das suas funções, incorrer na violação do dever de fidelidade confessional - o que é verdadeiramente absurdo e não pode imaginar-se que se aplique. Aliás, conheço muito poucas pessoas que sustentem uma tese desse tipo, isto é, que transformem os homens e mulheres da Rádio Renascença em monges, que confundam a entrada para as Carmelitas com a entrada para a Rádio Renascença. Não é assim! Realmente, não é a título nenhum! E mesmo com uma norma deste tipo não o seria. O Sr. Deputado Costa Andrade, puxado à terra, admitiria perfeitamente haver uma grande diferença entre o monge e o jornalista que faz o noticiário ou o cidadão que limpa a sacristia: será que o honesto trabalhador que limpa a sacristia tem de ser sindicado por se ter convertido ao budismo? Teve uma crise de consciência, transformou-se em budista, mas continua a limpar a sacristia - deve ser despedido ou pode continuar (e até é um dever de fidelidade económica e de bom relacionamento que continue)?

Risos.

Portanto, Sr. Presidente, não podemos concordar com a proposta, sobretudo depois das digressões da bancada do PSD. A causa é má, não é muito fácil de defender, mas defendida em tais termos é francamente desastrosa. Sobretudo sabendo nós que o PSD tem do artigo 53.° a opinião que ressalta sinistramente da proposta de lei sobre os despedimentos.

O Sr. Presidente: - Espero que o PCP aplique rigorosamente a todos os seus militantes a doutrina que neste momento expendeu. Há alguns casos que neste momento ecoam nos jornais e irão permitir ter a pedra de toque desse comportamento.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, se V. Exa. quiser abrir um debate sobre essa matéria, em sede de revisão constitucional,...

O Sr. Presidente: - Não, não!

O Sr. José Magalhães (PCP): -... proponho que estabeleçamos as balizas e os parâmetros; depois partiremos para esse debate.

O Sr. Presidente: - Um debate em sede de revisão constitucional, não.

O Sr. António Vitorino (PS): - Pode ser um debate livre, sem balizas.

O Sr. Presidente: - Um debate livre seria divertido.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Se valer tudo, Sr. Presidente, vamos a isso!

O Sr. António Vitorino (PS): - É de homem! Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Pela minha parte, estou de acordo com algumas das afirmações do Sr. Deputado José Magalhães no que diz respeito à muito difícil sindicabilidade deste conceito de fidelidade ou infidelidade. Queria chamar apenas em ajuda disto a própria dificuldade do conceito de lealdade-já esse é difícil; e tanto é difícil que a lei do trabalho, as leis laborias, normalmente e ao contrário de outros deveres, procuram abrir caminhos para facilitar essa interpretação.

É o caso até da última proposta do Govêrno que li há pouco - comportamento desleal, designadamente: negociando por conta própria, concorrendo, divulgando informações -; faz um esforço para manter este dever de lealdade dentro de certos limites, já porque ele é de difícil sindicância, efectivamente. Quanto mais este dever de fidelidade! Parecia-me realmente perigoso que se fosse por este caminho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - A minha sugestão não interessa a VV. Exas.? A sugestão que há pouco fiz não interessa a VV. Exas.? É uma pergunta.