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7 DE JULHO DE 1988 675

-lhe, Sr. Deputado, que o que o Estado pagava anualmente apenas a esse médico era quase suficiente para comprar um aparelho de tomografia axial computadorizada (TAC) e instalá-lo no Hospital de Santa Maria. É por isso que digo que não se deve incentivar este estado de coisas.

Estou de acordo, sim, com o facto de, como aconteceu, por exemplo, em Bragança, alguém se ter antecipado ao Estado e ter tido a iniciativa de montar um TAC. Ora, se o número populacional dessa cidade não justifica a existência de dois aparelhos deste tipo, é natural que o Estado invista no seu hospital e aproveite o TAC existente. Mas deve fazê-lo em condições a estabelecer, de tal forma que o Estado não esteja assim a alimentar lucros excessivos da iniciativa privada. O que queremos realmente confirmar sempre é que a medicina, tal qual como a farmácia e os medicamentos, tem uma intervenção nitidamente social quanto a este problema e não pode confundir-se com um comércio qualquer.

Gostaria de referir algo a propósito da desumanização da medicina. Ela resulta, de facto, na maior parte das vezes, da relação que se estabelece entre o médico, o doente e o restante pessoal da saúde. Tal relação, nas unidades hospitalares, depende extraordinariamente da existência ou não de pessoal em quantidade e qualidade suficiente. Neste âmbito, informo-vos que acabo de visitar um serviço do Estado, um serviço público, e devo dizer que estou convencido de que em nenhum hospital privado haverá tanta humanização como encontrei na Unidade de Tratamento Intensivo das Coronárias (UTIC). Na UTIC há, em média, uma enfermeira por cama; no serviço de cardiologia, que funciona ao lado, há uma enfermeira para 30 camas. Naturalmente que cada uma desta enfermeiras não pode ter os mesmos carinhos, os mesmos cuidados e as mesmas atenções com cada doente do que aquelas enfermeiras, porque não há possibilidades físicas de o fazer. Na UTIC, sentíamos um cabelo a levantar-se no ar e aparecia-nos logo uma enfermeira a tranquilizar-nos e a explicar-nos as razões pelas quais isso estava a acontecer. Aí está a tal humanização da medicina! Quando se emprega essa expressão, ainda muita gente julga que significa aparecerem meia dúzia de senhores da alta sociedade a distribuírem rebuçados e cigarros pelos doentes e a fazerem-lhes visitas. O que realmente é necessário é dotar os hospitais do equipamento e do pessoal adequados, e assim essa humanização verificar-se-á. Teremos certamente alguns médicos e enfermeiros que descurarão as suas obrigações, mas encontraremos em muitos serviços - felizmente na maioria deles - a chamada "carolice", que nos deveria levar a apregoar as boas qualidades da classe médica e da classe de enfermagem em vez de andarmos a destruir a sua credibilidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Desculpar-me-ão a minha ousadia de tentar esclarecer melhor esta questão do seguro de doença. Chego a pensar que o Sr. Deputado Luís Filipe Meneses talvez não tenha uma noção exacta - há-de compreender este meu atrevimento - de quais são as consequências do seguro de doença.

Vou dar apenas dois ou três exemplos para compreendermos melhor esta temática.

Como sabem, a regra do mercado em relação a qualquer seguro é a de quem paga mais tem mais benefícios, e não o contrário. Quanto mais se paga para um seguro mais benefícios se tem. Em termos de saúde, não se julgue que o seguro de doença é um seguro igual para toda a gente. E que, se uns pagam x, outros pagam o dobro para terem também o dobro dos benefícios. Sr. Deputado Luís Filipe Meneses, dou-lhe um exemplo: as mulheres, em iguais circunstâncias, de doença, pagam uma taxa x, mas, se a mulher está grávida, paga mais apenas por esse facto, ou seja, porque corre mais riscos. Não sei se o Sr. Deputado tem a noção disso.

O sistema do seguro de doença é semelhante ao do seguro dos automóveis: o seguro contra terceiros será de x, mas, se eu quiser um seguro contra roubo e todas as outras variantes, terei de pagar bastante mais. Não julgue, pois, que o seguro de doença é igual para todos.

Em relação aos mais idosos, evidentemente que os respectivos seguros são feitos pelas companhias seguradoras e não pelo Estado. O sistema de seguros tem modalidades variadíssimas, e não pensem que uma companhia deste ramo faz o mesmo seguro para um jovem e para um idoso; obviamente que o idoso pagará mais porque há um maior risco de ficar doente. Dou um exemplo concreto: no Hospital da Universidade de Coimbra existem quartos particulares e o critério actualmente seguido para a ocupação de quarto particular é o da gravidade da doença. Ou seja: se dá entrada nesse hospital um indivíduo gravemente doente, e pelas condições especiais da sua doença, é ele que ocupa um quarto particular. Com o seguro de doença isso não se processa assim: o indivíduo que pagou mais, o que tem o seguro mais caro, é que vai para o quarto particular e o que paga menos vai para a enfermaria.

O Sr. Deputado Luís Filipe Meneses talvez não tenha noção das consequências de tudo isto; ou, se a tem, terá de me explicar o texto da alínea a) do n.° 4 da vossa proposta, que diz: "Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente das suas condições económicas, aos cuidados de medicina preventiva, curativa e de reabilitação." Os mais ricos pagarão naturalmente mais para terem seguros melhores. Mais grave ainda é o facto de este sistema criar também uma divisão etária, nomeadamente entre os idosos e os jovens. Isto acontece em termos gerais, mas realmente não sei o que poderá vir a acontecer em concreto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Rui de Almeida, apresento-lhe um problema colocando-me na pele do Sr. Deputado Luís Filipe Meneses: não seria concebível criar-se um seguro organizado pelo próprio Estado, com risco ponderado, e, portanto, com um prémio ponderado?

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Não, Sr. Presidente. A outra questão nevrálgica nesta área é a de que ainda não está definido o sistema de seguros que o PSD propõe.

Por outro lado, deve ficar muito claro que ninguém é hoje em dia contra a iniciativa privada. Creio que todos somos apoiantes da ideia de que deve haver um sector privado no nosso país, desde que não seja parasitário do serviço público.