20 DE JULHO DE 1988 789
nosso programa- alguns sinais inequívocos do que pensamos serem as bases mínimas para uma política energética correcta. Mantendo as condições atrás referidas, consistem tais sinais na diversificação das fontes de produção, na utilização de energias limpas e renovadas, na nacionalização dos consumos e, como já mencionei, na proibição da instalação de centrais nucleares, que, apesar de vir expressa em último lugar, não é certamente a menos importante, bem pelo contrário.
É essa, sucintamente, a razão principal pela qual apresentamos a nossa proposta. Entendemos que a actual Constituição, embora já consagrando um quadro para a política energética que pensamos ser correcto, deveria fazer menção expressa pelo menos à recusa liminar da utilização de energia nuclear em território português, ainda que para fins de produção energética.
O Sr. Presidente: - Suponho que esta explicação foi suficiente clara.
Portanto, voltaríamos agora à apreciação da intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos. Esta explanação provocou duas inscrições para intervir: a do Sr. Deputado José Magalhães e a de mim próprio.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não foi seguramente por isso que sugeri o que sugeri há pouco, mas apenas atendendo a que o PSD linha manifestado um particular empenhamento em discutir este ponto.
Pela nossa parte, devo dizer que também temos interesse nisso, principalmente em relação àquilo que pudemos ouvir da boca do Sr. Deputado Almeida Santos. Há realmente por parte do PSD uma perspectivação extremamente diferente daquilo que devam ser as incumbências prioritárias do Estado.
O Sr. Deputado Almeida Santos leve ocasião de afirmar que as propostas do CDS inverteriam o sentido da Constituição neste ponto, caso fossem aprovadas. Creio que isso é uma evidência. No entanto, o mesmo se pode dizer das propostas apresentadas pelo PSD. E aí o Sr. Deputado Almeida Santos sublinhou que não tinha uma oposição radical, mas sim uma "substancial divergência" (sic).
Se assim é, julgo que isso significaria que o PS não estaria disponível para considerar outras alterações do artigo 81.° além daquelas que constam do seu próprio projecto de revisão constitucional, e elas são três. Contudo, dessas três alterações duas são de tomo. Mas, verdadeiramente, serão duas as alterações de tomo, ou será apenas uma? Esta é a questão que se me suscita.
O PS mantém como incumbência prioritária do Estado o eliminar-se e impedir-se a formação de monopólios privados. Isto quer dizer que, há pouco, o Sr. Presidente somente por gentileza ou por tratamento diferenciado em relação ao PS é que não dirigiu ao Sr. Deputado Almeida Santos as críticas ou as agulhas que nos linha endereçado a nós quanto a uma suposta, e, aliás, inexistente, confusão da nossa parte entre grupos económicos e monopólios.
Daqui depreendo, o que de resto não é difícil, que o PS não confunde a existência de grupos económicos com a questão da formação de monopólios e se pronuncia pela manutenção do pilar antimonopolista da Constituição.
No entanto, a questão carece de uma completa explicitação, devido às propostas apresentadas pelo PS em relação aos artigos 9.º, 81.° e 83.º, aos limites materiais de revisão constitucional e a outros preceitos e dimensões da constituição económica.
O PS mantém a alínea e) do artigo 81.°, com uma supressão parcial de texto, que o Sr. Deputado Almeida Santos teve ocasião de situar, mas altera simultaneamente outras disposições com as quais esta está conexionada.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se isso não significa ou não pode acarretar um esbatimento do princípio que aqui se define e se estabelece. Como é que o PS encara isso, dado que se trata obviamente de uma responsabilidade não levianamente assumível essa de gerar um esbatimento nesta área, a qual é fulcral e de entre todas centralíssima?
Naturalmente, deixo de lado a reflexão sobre se a "factura" da referencia constitucional reiterada às nacionalizações é "insuportável", ou se não será mais difícil suportar a factura decorrente da sua supressão...
Mas essa é para o PS uma questão chave. Da nossa parte a crítica e conhecida. Ela é quanto a nós justíssima, e as apreensões que temos no que respeita a essa matéria dispensam reforço ou explicitação adicional.
Quanto à alínea h) do artigo 81.° passa-se outro tanto. Não vamos aqui seguramente antecipar todo o debate acerca da parte da Constituição respeitante à reforma agrária. Mas a eliminação do conceito como tal, com a manutenção da incumbência prioritária de eliminação dos latifúndios, só numa leitura desprevenida poderia significar que o PS tem propostas puramente baptismais e não de alteração da estrutura constitucional no respeitante a este ponto...
Creio que o debate sobre esta matéria, sem prejuízo daquele que há-de ter lugar na sede própria, deve ser mais aprofundado, porque a consequência dessa opção é quanto a nós extremamente preocupante.
Não nos parece que esse grau de empobrecimento valha o preço que o PS parece considerar bastante. Esse preço seria o da "diminuição da factura" se bem compreendo. Por outras palavras, como há em Portugal quem aposte tanto na destruição da reforma agrária que foi capaz de apresentar uma proposta inconstitucional - a qual é conhecida e que está pendente nesta Assembleia -, além de ser capaz de desencadear no quotidiano, na acção corrente da Administração Pública, ofensivas com as consequências e a extensão daquela que lamentavelmente é desencadeada todos os dias, como há esses que assim pensam, entende o PS que é melhor sacrificar no altar dessa aspiração destrutiva um nome, conceito, uma garantia constitucional.
Que conceito, que nome é que fica substituindo esse que o PS pretende sacrificar? Que consequências é que isso tem? Que responsabilidade é assumida por isso? Creio que era bom que fosse feita alguma reflexão adicional acerca desta matéria.
Por outro lado - e devo dizer que esta é para mim a grande interrogação -, quais são as consequências deste conjunto de alterações em relação ao funcionamento concreto da economia?
O Sr. Deputado Rui Machete teve ocasião de dizer que "não é por estarem na Constituição que as coisas deixam de ser o que são ou passam a ser diferentes", o que realmente abre um debate fascinante (mas provavelmente de fronteiras excessivas) acerca do valor do direito e do seu não valor, uma vez que se sabe que há uma diferença entre um código e uma faca, ou seja, o primeiro não corta e a segunda corta.
O Sr. Presidente: - Ambos cortam!
O Sr. José Magalhães (PCP): -Ora aí está! Em todo o caso, a questão é que a extracção da Constituição de determinados conceitos pode precipitar na realidade portuguesa consequências gravíssimas, de tal modo graves que não nos disponibilizamos para as contestar a qualquer título. O PS, pelo contrário, disponibiliza-se.