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21 DE JULHO DE 1988 809

colectiva pode ser só de alguns meios de produção e pode até não ser dos principais, o que, quanto a nós, é o principal vício e a principal debilidade da proposta do PS, uma vez que permitiria, a ser consagrada nesses termos, altos graus de desvitalização da intervenção do Estado na vida económica. Por outro lado, estabelece uma cláusula conformadora, nos termos da qual, além de não haver uma obrigação de intervenção, haveria uma obrigação de só apropriação em função do interesse público, definido (como cláusula genérica que é) em termos muito latos e que carecem de esforços hermenêuticos. Tudo o resto me parece menos relevante. O principal é o primeiro segmento desta norma - que a lei deve determinar, depois, os critérios de fixação das indemnizações, em caso de nacionalização ou expropriação, parece-me opção derivada e secundária. Apenas creio que o PS ainda baldeou, de forma implícita, uma outra questão. É que, aparentemente, restringe os meios e as formas de intervenção a estas duas situações: à nacionalização ou à expropriação. Quer o PS inconstitucionalizar todas as outras formas de intervenção? Ou então o PS quer dizer que a lei é obrigada a determinar os critérios de fixação da correspondente indemnização só nos casos de nacionalização ou expropriação, podendo, nos outros casos de apropriação colectiva de meios de produção e solos, feitas sempre "de acordo com o interesse público", não haver lugar a indeminização. Prevêem outras formas? Que formas? Com que regime? E com que regime, designadamente, em relação àquelas entidades privadas que venham a ser atingidas por essas medidas? Ou esta norma, não quer dizer exactamente aquilo que parece e, conjugada com o artigo 85.°, quer dizer que se cria a possibilidade virtual de outras formas de intervenção do Estado; não na gestão - isso é matéria do artigo 85.°, n.° 2, do PS- mas na própria apropriação dos meios de produção por entidades privadas, no sentido restritivo e limitativo, que não comportem a inclusão nas duas figuras aqui tipificadas, a saber, a expropriação e a nacionalização. Creio que é bastante interessante, para medir a proposta do PS, termos respostas para estas interrogações. Se elas fossem no segundo sentido possível dos que equacionei, isto é, num sentido restritivo da propriedade privada, então o Sr. Deputado Costa Andrade rapidamente veria que o sorriso que começou por esboçar se transformaria num esgar. A proposta não quereria dizer exactamente o que ele julgou que queria dizer, poderia até querer dizer o seu contrário. Em todo o caso, creio que este debate poderá ser clarificador para que tudo, tudo, tudo seja dito pela forma própria.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Queria dizer que nesta reunião, se bem me recordo, ainda não me ri.

Risos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Costa Andrade, peço-lhe que não seja excessivamente sensível às descrições fisionómicas, anatómicas e outras, que têm o valor que têm; quando salientou que a proposta do PS era "melhor" (creio não estar a ser infiel ao reproduzir as suas palavras, mas a acta permitirá comprová-lo cabalmente), V. Exa. colocou uma questão realmente importante relativa ao segmento primeiro da proposta - pareceu-me ver-lhe o esboço de um sorriso, que eu compreenderia...

Risos.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Enganou-se!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Esse esboço de sorriso é susceptível de ser invertido pela evolução da hermenêutica.

Creio que seria bastante importante que pudéssemos aprofundar as linhas de discussão, por forma a encontrarmos respostas para, pelo menos, algumas das interrogações formuladas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Só uma pergunta muito rápida ao Sr. Deputado José Magalhães, não sem que, contudo, antes sublinhe que o Sr. Deputado José Magalhães não só contribui para as actas da Comissão com intervenções brilhantes e extensas, como inclusivamente com interessantes relatos de factos paralelos que ocorrem nesta Comissão. Para que conste, o livro a que o Sr. Deputado José Magalhães se referia é a Constituição da República Portuguesa Anotada, de Gomes Canotilho e Vital Moreira - é verdade o que o Sr. Deputado José Magalhães diz, p. 405, correcto; para que não fique nenhuma dúvida sobre qual o livro, que podia ser a Bíblia, por exemplo, e então teríamos uma situação mais complicada. Só que aquilo que o Sr. Deputado José Magalhães imputou à proposta do PS é contraditado pela própria anotação do Dr. Vital Moreira e do Prof. Gomes Canotilho, que diz, logo a abrir, p. 405, V. Exa. deve saber, "a redacção deste preceito não é muito clara, especialmente no que se refere ao objecto da intervenção", e continua, "aparentemente, ela refere-se também, tal como a nacionalização e a socialização, aos meios de produção"; contudo, segue dizendo que "o contexto do artigo, interpretação sistemática, colocado a seguir ao artigo 81.°, indica que o objecto deve ser bastante mais vasto do que qualquer forma de intervenção pública na vida económica", e termina com um requinte de comentário que é este: "O preceito quererá, pois, dizer o seguinte: 'A lei determinará os meios e formas de intervenção do Estado na economia e de nacionalização e socialização dos meios de produção [...]'." Citei bem? Não quero fugir ao espírito do texto citado.

Sr. Deputado José Magalhães, creio que o que acabei de ler é elucidativo, mas mais elucidativo do que a citação é a pergunta que lhe vou fazer: V. Exa. acha credível, acha que alguém poderá dizer que, à luz da proposta do PS, se tinha ilegitimado a intervenção do Estado na economia? Acha que é credível, acha que faz sentido, em termos de argumento rigoroso, dizer que numa Constituição destas, com as propostas em que o PS mantém integralmente as garantias dos direitos dos trabalhadores, que constituem obrigações sobre o Estado, acha que é um argumento usável, como instrumento de crítica ao PS, de que nós estávamos a ilegitimar a intervenção do Estado na economia, ou o emparcelamento - para dar exactamente o exemplo que vem citado na p. 405? Acho que faz bem em criticar as propostas do PS, porque as suas críticas são estimulantes, mas não nestes termos, sinceramente. Acha que era possível essa interpretação terrorista?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.