918 II SÉRIE - NÚMERO 31-RC
expressa de uma maneira muito clara no artigo 91.° quando este preceito refere que a organização económica e social do País é orientada, coordenada e disciplinada pelo Plano. É, pois, contra essa ideia burocratizante e centralizante, que aspira a ter como modelo o tipo de planos quinquenais soviéticos que acabaram por demonstrar a sua incapacidade e estão a ser progressivamente abandonados, que de pleno nos inscrevemos contra. Julgamos que essa ideia do Plano não foi aplicada não por deficiência dos diversos governos que se sucederam, mas sim porque não podia ser aplicada, ou seja, não era exequível. E ela representava uma mentalidade centralista e burocratizante.
Ora, todo o desenvolvimento da estrutura de planificação do título III da Constituição obedece a essa ideia. E contra ela não temos nenhuma dúvida em nos batermos frontalmente.
No fundo, é uma ideia que felizmente não foi, ao contrário do que aconteceu em matéria de nacionalizações e reforma agrária, asfixiante da realidade da economia portuguesa porque não se chegou a colocar em prática. Felizmente também que o PS, mesmo quando a interpretou do ponto de vista ideológico, não a praticou quando teve responsabilidades no Governo.
Ela tem estigmas centralistas, burocratizantes, extremamente danosos, e corresponderam a uma certa moda intelectual e, mesmo quando não modista a uma certa corrente do pensamento que foi típica do final dos anos 50 e dos anos 60, particularmente em França. Mas isto não é confundível com uma coisa que se pretendeu misturar que é a ideia de que a planificação, a procura da previsibilidade da evolução económica e de uma intervenção voluntarista, no sentido de a modificar de acordo com determinados objectivos, seja algo que os economistas e os políticos pretendam estirpar da actividade da economia e da sociedade - não é nada disso. Cada vez mais, há uma preocupação de racionalizar a actividade económica, de introduzir centros de racionalidade da actividade económica - já aqui há tempos, referi que o problema dos grupos económicos está intimamente articulado com esse problema. Agora, o que não há hoje, na maior parte das escolas de pensamento económico e na maior parte das práticas políticas e económicas, designadamente nos países onde já houve essa ambição de planeamento ocidental (digamos "escola francesa"), é a ilusão de pensar que é possível reduzir tudo isso a um plano metido no computador, ao Plano com o grande. Há a ideia de que as planificações são possíveis como exercícios e algumas delas como até algo de exequível, e têm vindo a ser feitos planos parciais. Ainda há pouco, ironicamente, suponho que foi o Sr. Deputado José Magalhães, se falou no problema da RFA. Mas, se V. Exa. ler uma das discussões anuais dos professores de direito público alemão a propósito do planeamento e do plano - não é um problema nominalista -, verificará que esse problema tem sido encarado, quer pelos juristas, quer pelos economistas, na RFA, extremamente a sério, e a RFA não pode ser acusada de ter uma economia débil de ter uma economia que não progride, e de ter uma economia que não tem preocupações de justiça social. E a verdade, designadamente quando o SPD esteve no poder, é que aí tem havido uma grande preocupação pelos problemas da planificação e dos planos, e até - e com isso passamos ao segundo ponto - pela necessidade de assegurar uma participação democrática que não é confundida apenas com a participação dos trabalhadores. O que nós entendemos é que os trabalhadores são cidadãos, mas há outros cidadãos e outras entidades, e, portanto, não quereríamos confundir o que, por vezes, na interpretação da Constituição, se faz, e até, porventura, na vontade psicológica de alguns constituintes era nítido confundir os cidadãos com os trabalhadores e só a estes dar voz activa. Mas a verdade é que são possíveis outras interpretações e nós achamos que a participação na elaboração dos planos é fundamental - é fundamental por razões democráticas e fundamental por razões de eficácia - porque é sabido que, quando os destinatários não tomam parte nas decisões, acabam por não ser co-responsabilizados por elas. Nesse aspecto, a crítica não nos atinge porque não entendemos ser útil retirar a participação das diversas entidades, sejam os trabalhadores, sejam as entidades empresariais, sejam as autarquias locais, sejam outros grupos, na preparação dos planos e até na sua execução.
Mas, dizia, quando se discute os problemas da planificação, há efectivamente um problema central extremamente importante que é o de conjugar a necessidade de assegurar um controlo, ou uma intervenção política das assembleias - as assembleias representativas, as assembleias políticas -, com as dificuldades técnicas da elaboração dos planos. Isso é uma questão séria, é uma questão para a qual o Sr. Deputado José Magalhães chamou a atenção e na qual, de resto, o Sr. Deputado António Vitorino assentou uma parte importante da sua intervenção. Quanto à existência do problema, estamos inteiramente de acordo. O que não estamos já de acordo é com a interpretação dada pelo Sr. Deputado António Vitorino e, menos ainda, com a do Sr. Deputado José Magalhães, de que o PSD procuraria furtar os planos ao controlo do Parlamento. Não é isso o que é proposto no artigo 91.°-A do nosso projecto. Pelo contrário, aí é manifesto que a preocupação é a de que o destinatário das propostas do Governo é, obviamente, a Assembleia da República e não são apenas do Plano, o tal Plano, que nunca se praticou, com letra grande, mas são dos diversos planos, embora, evidentemente, reconheçamos que deve haver, em relação ao Plano que está em articulação com o programa do Governo, uma lei que o aprove. De resto, a Assembleia da República funciona, como V. Exa. sabe, Sr. Deputado António Vitorino, ou por leis ou por resoluções - não funciona de outra maneira. E, portanto, as propostas de algum modo terão de traduzir-se, primeiro, numa competência reconhecida à Assembleia da República e, segundo, ou por uma lei cuja natureza jurídica a doutrina discute ou por resoluções. E, nesse sentido, não vejo que, em primeiro lugar, ao contrário do que refere, tenha havido nenhum propósito de minimizar a competência da Assembleia da República e, em segundo lugar, que haja contradição com os diversos artigos da nossa proposta. Muito pelo contrário, elas coadunam-se, perfeitamente, com o artigo 91.°-A.
Por outro lado, gostaria de sublinhar que a intervenção do Sr. Deputado António Vitorino fez-nos luzir alguma esperança, ao contrário da interpretação pessimista e jubilosa do Sr. Deputado José Magalhães, manifestada acerca das profundas divergências entre o PSD e o PS. Porque há divergências, é evidente, mas o Sr. Deputado António Vitorino disse duas coisas que reputo extremamente importantes. Referiu, em primeiro lugar, a relevância da instituição Conselho Económico