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14 DE OUTUBRO DE 1988 1347

tancialmente diferente. A convicção tem um substrato realista, a fé é uma crença no direito natural.

Ora bem, o que queria dizer era o seguinte: O Sr. Deputado Carlos Encarnação deu um exemplo que visa essencialmente destruir o argumento dos dois terços, mas a maioria de aprovação é um minus na questão que se discutia. Desde o princípio, quando apresentei a proposta das paraconstitucionais, disse que havia que considerar vários critérios na sua caracterização. Não se pode utilizar apenas o critério dos dois terços para tentar destruir todo o edifício. Agora o Sr. Deputado Rui Machete disse, em àparte, que o exemplo da Constituição espanhola era mau. Estou de acordo com V. Exa., e é isto que faz da proposta do PS uma proposta moderada e perfeitamente realista. É porque fica a quilómetros de distância da Constituição espanhola. É porque a proposta do PS é particularmente rigorosa no elenco das matérias que se incluem como leis paraconstitucionais. É porque não deixa nenhuma cláusula aberta. É porque a única coisa que faz depender da intervenção do legislador é a densificação do núcleo de matérias que devem figurar nas leis paraconstitucionais. Vou já acabar...

O Sr. Presidente: - Deixe acabar a exposição, que é extremamente densa e extremamente sintética, e depois podemos fazer perguntas.

O Sr. António Vitorino (PS): - Acabo de seguida e peço desculpa por ter sido tão longo. Quanto ao problema que me coloca sobre como sair deste impasse, no fundo é esta a questão que está aqui colocada: O PSD diz-nos, nuns casos com argumentos atendíveis, noutros com argumentos totalmente inatendíveis, que não tem qualquer simpatia pelas leis paracontitucionais e deixa o Sr. Deputado José Magalhães naquela angustiante situação de ter que perceber o que se está a passar.

O Sr. Presidente: - Isso é divertido.

O Sr. António Vitorino (PS): - Ele desconfia que há um acordo, e, como este não pode deixar de passar por aqui, e nós estamos neste diálogo, pensará "mas onde é que está o acordo?". Não se pode deixar também o Sr. Deputado José Magalhães, que é um homem novo e que tem uma vida brilhante a viver, sofrer estas angústias para almoço, para ceia, para tudo. Como sair? O que procuramos é seriar questões. Há várias saídas possíveis, uma já foi aqui assumida na Comissão em relação ao estatuto da informação, por exemplo, e recordo esse debate. Os Srs. Deputados do PSD, na altura, disseram que achavam que não deveria haver um estatuto da informação, nem paraconstitucional nem não paraconstitucional, mas aceitavam que algumas das regras sobre aquilo que é considerado pelo PS o conteúdo fundamental desse estatuto sejam inseridas na própria Constituição.

O Sr. Presidente: - Fui eu que defendi isso.

O Sr. António Vitorino (PS): - Exacto.

Esse é um dos instrumentos possíveis em relação ao estatuto da informação, em relação a outros não será exactamente. O que gostava de deixar como conclusão

vai no sentido do que há pouco o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia referiu, de que matérias há em relação às quais também nós ficaremos mais tranquilos que constassem desde logo da Constituição do que se fossem remetidas para leis paraconstitucionais, mesmo com os requisitos que o PS coloca a estas leis, quanto mais se prescindirmos da maioria qualificada. A minha posição sobre esta matéria é a de reafirmar que na nossa proposta não há nenhuma pérfida preocupação de boicotar o processo de elaboração legislativa, ou de criar dificuldades à normal actuação legislativa do Estado. E o penhor desta verdade é que nós escolhemos leis que, exceptuando um e um só caso, já são todas elas leis em vigor aprovadas anteriormente por maioria de dois terços, sem que houvesse sequer no momento da sua aprovação o constrangimento constitucional da maioria qualificada. Agora, o que o PS gostaria também de deixar muito claro é que como é natural e está na razão de ser da natureza das coisas e dos homens, não podemos ignorar que na sequência do 19 de Julho de 1987, que permitiu a formação de uma maioria absoluta de um só partido, esse partido, o PSD, vai ter inevitavelmente, tem tido, está a ter e continuará a ter a tentação de sublinhar as componentes de matriz maioritária do sistema político português em detrimento das que resultam da matriz consensual originária. Não vale a pena ignorar este facto, é um dado da sociologia política. Ora a Constituição da República tem na base uma matriz consensual, tem na base um pacto compromissório entre partidos políticos que permitiu que para cada parte e título da Constituição usufruísse sempre, pelo menos, da convergência de, pelo menos, dois partidos na votação do essencial dos artigos dessa parte da Constituição. E é isso que justifica que nenhuma força política se possa reivindicar como a tutora ou a proprietária do que quer que seja na Constituição, porque esta tem essa origem compromissória. O PS quer manter a natureza contratualista da Constituição, a natureza compromissória e consensual de elementos fundamentais do nosso regime político e que são os que seleccionámos para as leis paraconstitucionais no artigo 166.°-A. E dizemos ao PSD: cuidado com as tentações de maioritarização do regime político, porque aquilo que se ganha na vã cobiça do poder perde-se na operatividade social das leis, perde-se na solidez do enraizamento do regime político democrático português! É legítimo fazer esta observação num momento em que a prática concreta do Governo actual tem demonstrado que sempre que entendeu sobrevalorizar apenas numa certa cegueira o valor do princípio maioritário viu-se confrontado não só com viva oposição política e social, mas também com declarações de inconstitucionalidade, porque não atendeu a estes apelos de consensualização referentes a algumas matérias relevantes da nossa vida colectiva. Pode ser que a nossa proposta de leis paracontitucionais não mereça aprovação, mas posso garantir que tenho a profunda convicção de que os alertas que aqui foram lançados a este propósito se justificam plenamente e lançam luz sobre o que se vai passar na nossa vida colectiva nos próximos dez anos.

O Sr. Presidente: - Tinha inscrito para uma resposta ou uma pergunta a Sra. Deputada Assunção Esteves.